Baixa qualidade do sono é reportada por 65,5% dos brasileiros. A apneia obstrutiva do sono afeta mais da metade da população do Brasil, 26% dos adultos com apneia de moderada a grave e 49,7% com apneia leve. Enquanto dormem, essas pessoas apresentam recorrentes obstruções das vias aéreas superiores. Outros distúrbios de sono, também muito frequentes, se agravaram durante a pandemia de COVID-19. Entre eles está a insônia que aparece associada a 29% dos casos de apneia, e é um dos fatores de risco para o desenvolvimento de Transtorno de Ansiedade Generalizada e depressão, além de doenças crônicas não transmissíveis.
No dia 29 de maio, o Fórum Intersetorial para Combate às Doenças Crônicas não Transmissíveis no Brasil (FórumDCNTs) promoveu encontro sobre distúrbios do sono. O evento Distúrbios do Sono – Fatores de Risco para Condições Crônicas não Transmissíveis: Políticas e Programas para Prevenir e Tratar reuniu médicos e outros profissionais de saúde que atuam em pesquisa, ensino, assistência e gestão para a discussão de ações integradas de combate ao problema. O objetivo da iniciativa foi facilitar o diálogo entre stakeholders das diferentes especialidades médicas e áreas da saúde; atuantes em instituições públicas, privadas e no terceiro setor.
A fisioterapeuta cardiorrespiratória Claudia Albertini explica que “a diminuição do aporte de oxigênio devido à apneia leva ao risco de síndrome metabólica”. Por sua vez, a síndrome metabólica, caracterizada pela presença de doenças e condições relacionadas à resistência insulínica, como obesidade, hipertensão arterial, diabetes e dislipidemia, aumenta o risco de doenças cardiovasculares. “São problemas de saúde em cadeia com custos não só para o indivíduo, mas também para toda sociedade, devido à queda na produtividade e absenteísmo no trabalho”, completa.
Doenças crônicas também podem desencadear distúrbios do sono
O cardiologista Luciano Drager, presidente da Associação Brasileira do Sono (ABS), não tem dúvidas de que sono e doenças crônicas são uma via de mão dupla. “A apneia piora as doenças cardiovasculares e estas e seus tratamentos pioram a apneia”, exemplifica. “Ter diabetes é fator de risco para apneia do sono. Doenças cardíacas, hipertensão e diabetes podem ocasionar insônia”, ressalta a pneumologista Sonia Togeiro, pesquisadora do Instituto do Sono da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Já o psiquiatra e médico do sono Almir Tavares lembra que os transtornos de ansiedade também acarretam insônia.
Professor da Universidade de Minas Gerais (UFMG), Tavares destaca que a sociedade hiperconectada desafia quem precisa dormir bem. “O sono é resultado não apenas de atividades biológicas involuntárias, mas também de decisões voluntárias. Os jovens privam-se de sono para manterem-se conectados, o que reduz o funcionamento dos lobos frontais do cérebro. Como consequência, sua capacidade de resolver problemas diminui, enquanto a impulsividade aumenta. Dessa forma, são intensificados os pensamentos negativos, a desesperança, o isolamento, elevando o risco de suicídio”. O médico salienta que a Terapia Cognitivo-comportamental para distúrbios do sono previne e alivia ideação suicida, e tem potencial para reduzir o risco de alterações metabólicas.
São necessárias políticas públicas para os distúrbios do sono no Brasil
O médico Luciano Drager lamenta a escassez de arsenal terapêutico para doenças do sono no SUS. “Falta acesso ao aparelho CPAP, à placa de avanço mandibular e à terapia miofuncional para o tratamento da apneia. Em relação à insônia, são limitados os medicamentos e os recursos não farmacológicos, como a Terapia Cognitivo-comportamental”.
O fisioterapeuta Miguel Medeiros afirma que esse grupo de doenças ainda não é amplamente discutido e priorizado pelo SUS. “Os poucos planos terapêuticos a respeito estão em políticas isoladas e sem conexão entre as esferas municipais, estaduais e federais. É essencial a exploração do tema dos pontos de vista técnico e de gestão”. Mark Barone, coordenador geral do FórumDCNTs, enfatiza que “o Brasil tem ampla tradição na pesquisa das relações entre condições crônicas não transmissíveis e distúrbios do sono”. Barone revela, inclusive, a presença de inovações que barateiam o diagnóstico e modelos municipais de cuidados reconhecidos pela Organização Mundial da Saúde, no país.
Os especialistas que participaram do evento organizado pelo FórumDCNTS concordam que é importante a implementação de uma linha de cuidado para distúrbios do sono pelo Ministério da Saúde. Esta é uma das propostas do documento redigido em conjunto ao final do evento, com os consensos sobre as relações entre distúrbios de sono e doenças crônicas não transmissíveis; bem como as ações prioritárias identificadas para a prevenção, diagnóstico, tratamento e monitoramento desses distúrbios.
Sobre o FórumDCNTs
O Fórum Intersetorial para Combate às Doenças Crônicas não Transmissíveis no Brasil tem como objetivo reunir as principais instituições dos setores público, privado e terceiro setor para o combate à principal causa de mortes precoces no país, as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs). As doenças cardiovasculares e o AVC, o diabetes, os diferentes tipos de câncer, e as doenças respiratórias crônicas são as que apresentam maior prevalência no país. Ao mesmo tempo, possuem fatores de risco modificáveis comuns entre elas.
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