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A análise do economista do banco ABC Brasil

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Bacharel e mestre em economia pela Pontífica Universidade Católica (PUC-Rio), Luis Otávio Souza Leal atuou como economista-chefe na Câmara de Comércio do Rio de Janeiro (Fecomércio-RJ) entre 2002 e 2004. Foi professor assistente da PUC e em 2005 ingressou no Banco ABC Brasil, também como economista-chefe. O Banco ABC Brasil, controlado pelo Arab Banking Corporation (ABC), é um banco múltiplo, especializado na concessão de crédito e serviços para empresas de médio a grande porte, habilitado a operar nas carteiras Comercial, de Investimentos, Financeira, Crédito Imobiliário e Câmbio. Para o portal Panorama Mercantil, o economista afirma com exclusividade: “Imagina o que é para uma empresa de abrangência nacional ter que lidar com vinte e sete legislações diferentes de ICMS? Quanto capital é investido em uma atividade que não tem relação alguma com o seu ramo de atividade? O que acontecerá quando esse capital for direcionado para o desenvolvimento e pesquisa, aumento da qualificação dos empregados, ou mesmo na modernização da produção? Entretanto, no curto prazo, a grande pauta nacional continua a ser a fiscal. Como disse anteriormente, este vai ser o divisor de águas para a economia brasileira. Não creio que uma Reforma Tributária seja capaz de compensar a piora dos fundamentos econômicos no caso de uma deterioração fiscal e o consequente aumento das dúvidas com relação à solvência da dívida pública”.

Luis, o cenário econômico do país é preocupante no momento?

Sim, pois, estamos novamente em uma encruzilhada. Temos que escolher entre um caminho que nos levará a um círculo virtuoso de contas fiscais sob controle, câmbio equilibrado, juros baixos e possibilidade de um crescimento mais robusto, ou outro de descontrole fiscal, câmbio desvalorizado, juros mais altos e crescimento medíocre. Já estivemos em momento semelhante, quando, após a crise de 2008, e o bem-sucedido pacote contra cíclico do Governo Lula, tivemos o embate entre o então ministro da Fazenda, Antônio Palocci, e a ministra da Casa Civil na época, Dilma Rousseff. A frase de Dilma “gasto é vida” selou a vitória da ala desenvolvimentista do Governo e culminou com a saída de Palocci do Governo. O resto da história nós conhecemos muito bem.

Como analisa o trabalho da equipe econômica liderada pelo ministro Paulo Guedes?

Considero positiva. Se, por um lado poderíamos cobrar uma maior pró-atividade, por outro, o balizamento da discussão sobre as necessidades de equilíbrio fiscal e de maior eficiência econômica foi importante. Até agora, esse arcabouço de o Congresso ser o artífice das mudanças e o Ministério da Economia o norte, tem funcionado relativamente bem. Altos e baixos, e surpresas desagradáveis sempre ocorreram, mesmo em composições onde o Executivo era mais ativo e o Legislativo mais reativo. Seguindo a máxima de Deng Xiaoping, portanto, “não importa a cor do gato, desde que ele casse ratos”. O maior exemplo foi dado na terça-feira, primeiro de setembro, com a principal medida que depende exclusivamente do Executivo, um projeto de Reforma Administrativa que foi retirado da gaveta e enviado ao Congresso.

A Reforma Tributária apresentada pelo ministro foi de encontro com aquilo que imaginava?

Ainda é cedo para falar em Reforma Tributária do Governo, uma vez que o seu maior ponto de discrepância com relação ao que está no Congresso é o tal do imposto digital. Sem isso, não dá para falar em Reforma Tributária, em virtude de a unificação dos tributos federais não entrar em conflito com o que está no Congresso, salvo a questão do período de transição.

Essa é a grande pauta nacional?

Acredito que será no ano que vem, dado que ela terá um impacto muito forte na produtividade da economia brasileira e, consequentemente, no produto potencial. Com isso, poderemos crescer mais com juros menores. Não precisamos nem fazer muitas contas para perceber como essa Reforma pode revolucionar a produtividade brasileira. Imagina o que é para uma empresa de abrangência nacional ter que lidar com vinte e sete legislações diferentes de ICMS? Quanto capital é investido em uma atividade que não tem relação alguma com o seu ramo de atividade? O que acontecerá quando esse capital for direcionado para o desenvolvimento e pesquisa, aumento da qualificação dos empregados, ou mesmo na modernização da produção? Entretanto, no curto prazo, a grande pauta nacional continua a ser a fiscal. Como disse anteriormente, este vai ser o divisor de águas para a economia brasileira. Não creio que uma Reforma Tributária seja capaz de compensar a piora dos fundamentos econômicos no caso de uma deterioração fiscal e o consequente aumento das dúvidas com relação à solvência da dívida pública.

O presidente Jair Bolsonaro, afirmou que o auxílio emergencial deve ser encerrado em dezembro. Isso geraria problemas?

Economistas sempre gostam de começar a reposta com um “depende”, e nesse caso a utilização da palavra se faz necessária. Depende da forma que isso ocorrerá. Se simplesmente acabar, sem que seja continuado com o Renda Brasil ou outra forma de sustentação do gasto social, sim, teremos um problema. A razão é porque não parece que a economia estará funcionando em um ritmo suficiente para compensar a queda na renda que a interrupção desse programa acarretará. Da mesma maneira, se for de alguma forma continuado, depende também de como será feito. Se respeitar o teto dos gastos, estaremos no “melhor dos mundos”, mas se tivermos que utilizar expedientes heterodoxos para fazê-lo, certamente a sua continuidade traria mais problemas do que soluções para a nossa economia.

Uma crise estrutural é possível?

Crises sempre são possíveis quando estamos trabalhando em um cenário de crise e as decisões podem nos levar a resultados totalmente díspares. Portanto, para responder a essa pergunta, devemos nos lembrar da primeira resposta e dizer que, se nesse momento decisivo retornarmos ao mantra do “gasto é vida”, estamos contratando sim uma crise estrutural, que vai aparecer muito antes do que apareceu no Governo Dilma, dado que o espaço fiscal para aturar desaforo é infinitamente menor do que tínhamos há 10 anos.

A inflação preocupa?

Por enquanto não, dado o nível de ociosidade da economia aliado ao descompasso entre os níveis dos IGPs e do IPCs. A questão de se não teríamos uma inflação contratada lá para frente sempre é levantada, como alguns economistas gostam de dizer “os IPCs estariam grávidos dos IGPs”. Esta, certamente, é uma preocupação também do BCB e um dos motivos para que ele não tenha se aventurado a colocar os juros em patamares mais baixos dos atuais. Mas, essa é uma discussão mais para frente, não é um assunto que tire o sono dos mercados agora.

Existe um patamar de juros ideal para o Brasil?

Existe um patamar de juros ideal para qualquer país, mas, assim como para os demais, ninguém sabe ao certo qual seria. Ainda mais porque podemos considerar sempre que existem dois níveis para eles, um de curto prazo, que segue os ciclos econômicos, e outro que seria de longo prazo que seguiria os fundamentos da economia. Por exemplo, a taxa de juros de curto prazo, agora, é muito menor do que seria a de longo prazo dado o tamanho da ociosidade da economia. Por outro lado, a Reforma Tributária teria um impacto muito maior na taxa de longo prazo. Por isso, os BCs vão levando a taxa de juros na estratégia da tentativa e erro, olhando para a combinação entre crescimento e inflação para ver se estaríamos próximos ou não da taxa de juros ideal. Para não deixarmos a resposta sem números, atualmente a taxa de juros ideal estaria próxima dos atuais 2%, talvez um pouco abaixo desse nível, mas passada essa crise seria algo próximo de 6,0% (juros nominais em ambos os casos).

A estabilização da dívida é o nosso maior desafio?

Como resultado, sim. Mas, como esse não vai vir por inércia, o nosso maior desafio é criar as condições para que isso aconteça, através da manutenção do teto dos gastos e da Reforma Administrativa. Lembrar da frase “aconteceu em Vegas deve ficar em Vegas”, ou seja, o crescimento dos gastos propiciados pelo Orçamento de Guerra deve ficar circunscrito ao ano calendário de 2020, não extrapolando para 2021 em diante.

O que pode causar uma desconfiança no mercado em um médio prazo?

A falta de compromisso com uma política fiscal responsável e, consequentemente, com a sustentabilidade da dívida pública. O maior medo de qualquer pessoa que empresta dinheiro para alguém é levar um calote. Por que com o mercado deveria ser diferente? Até porque, quem empresta dinheiro para o Governo, em última instância, somos todos nós.

A saída do ministro Paulo Guedes, poderia causar essa desconfiança?

Sim, principalmente porque o Paulo Guedes, após a exposição das divergências entre os desenvolvimentistas e os fiscalistas dentro do Governo Bolsonaro a lá Dilma versos Palocci no segundo Governo Lula, deixou de ser um nome e passou a ser um símbolo. A sua saída não seria trocar um nome por outro, mas seria visto como a derrota da disciplina fiscal, assim como foi na saída de Palocci lá atrás, sendo que agora, como já dito, o espaço para erros é menor, portanto, a paciência do mercado também.


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