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A arquitetura humanizada de Ricardo Ohtake

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O arquiteto e designer gráfico Ricardo Ohtake, dirige o Instituto Tomie Ohtake desde sua criação em 2001. Foi secretário de Estado da Cultura de São Paulo, dirigiu o Centro Cultural São Paulo, o Museu da Imagem e do Som – MIS e a Cinemateca Brasileira. Formou-se em arquitetura pela FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo) e trabalhou em importantes questões urbanas, principalmente quando foi secretário do Verde e Meio Ambiente do Município de São Paulo. Atua também na área do design gráfico, desenvolvendo projetos de identidade visual e caracterização urbana, além de editar várias publicações de arte e cultura. “Além das exposições, temos todas as atividades complementares como o trabalho educativo que consiste em realizar um programa de acompanhar grupos e praticar arte que tem a ver com a mostra, permitindo a acessibilidade de grupos novos, não só os de mobilidade, como os de diversidade sexual, de bebês e idosos, de pobres que não tiveram possibilidade e nem facilidade de comparecer, enfim, de possibilitar a democratização das atividades, mas também fazer atividades de alto nível intelectual com mesas de debates, seminários, cursos e publicações, exposições históricas do pós-II Guerra e algumas anteriores”, afirma o arquiteto, designer gráfico e grande incentivador do mundo das artes no Brasil.

Ricardo, quando a arte deve cumprir um papel social?

A arte sempre cumpre um papel social. Às vezes é mais explícito como nos casos de Goya [Francisco de Goya, pintor e gravador espanhol, 1746 – 1828], Portinari [Cândido Portinari, artista plástico nascido em Brodowski no interior de São Paulo, 1903 – 1962], os expressionistas europeus, alemães principalmente, ou nas outras artes como o sempre premiado cineasta britânico Ken Loach [cineasta britânico, 1936 – ], que beira o cinema político… Mas nas últimas décadas com a maior liberdade ideológica e política que o mundo teve e com o “politicamente correto”, se fez tanta arte com fundo social, político, e agora, com o retraimento do mundo, e o recrudescimento do conservadorismo, estas artes também estão se encolhendo. Porém, há questões universais que têm que ser levadas em conta sempre, porque o social, a socialização, a igualdade e a justiça social trarão paz à sociedade e aos países do mundo.

O que o senhor destacaria de mais relevante hoje, quando se fala em arquitetura brasileira?

Fazemos várias atividades de arquitetura: o Prêmio Instituto Tomie Ohtake/AkzoNobel para arquitetos com menos de 45 anos com obra construída nos últimos cinco anos e Arquitetura Brasileira, cada ano abrangendo um tema. O geral da arquitetura brasileira está muito repetitivo e procuramos nestas atividades outros caminhos mais interessantes do que os “caixotes”, onde a variação é serem opacos, translúcidos ou transparentes. Há poucas exceções.

Quais as principais dificuldades em se dirigir um instituto de artes em um país como o Brasil?

A desigualdade social. Há no Brasil um público extremamente sofisticado e outro totalmente afastado de qualquer conhecimento. Precisamos fazer exposições e atividades que atendam o maior número de pessoas, mas, por exemplo, há muitas exposições de Picasso [Pablo Ruiz Picasso, pintor, escultor, ceramista, cenógrafo, poeta e dramaturgo espanhol que passou a maior parte da sua vida na França, 1881 – 1973] e de Dalí [Salvador Dalí, importante pintor catalão, conhecido pelo seu trabalho surrealista, 1904 – 1989] percorrendo o mundo, mas não as melhores obras destes artistas e o público mais amplo não faz a diferença entre estas mostras e aquelas em que há as obras de mais alto nível, com pinturas e esculturas em grande número, o que permite saber porque estes artistas são importantes. Hoje fazemos um trabalho intenso para democratizar a visitação e o conhecimento da arte, com cursos, atividades, visitas e brincadeiras que permitam a acessibilidade de público não só por questões físicas e etárias, mas também sociais e econômicas. Ao mesmo tempo, em que se cria e se organiza este trabalho, é uma tarefa difícil porque não há muita experiência acumulada, ou seja, o nosso Núcleo de Cultura e Participação tem que inventar e experimentar… A nossa Diretoria de Negócios precisar trazer o patrocínio que, embora seja de custo zero para as empresas (pois, existe a Lei Rouanet que é uma sensacional iniciativa governamental que existe há 30 anos) ainda hoje (e hoje mais do que sempre) é muito difícil conseguir este patrocínio. Esta combinação é de uma dificuldade imensa, que somada ao pagamento do custo fixo (folha de pagamento, impostos, necessidades…) realmente tiram o sono.

E quais são as maiores alegrias?

Abrir uma exposição, que seja bem formulada, com excelente curadoria, montagem e iluminação criativa, com bom material complementar como o trabalho educativo, os impressos e catálogos, os textos de apresentação das obras, com o trabalho educativo. Ou então, quando inventamos uma atividade, ou uma publicação, etc. Mas dura 10 minutos, porque é preciso ir em frente porque atrás vem gente…

Quais exposições o senhor considera terem sido marcantes para o Instituto?

A Recente Trajetória da Arte Brasileira – Curadoria de Agnaldo Farias, 2003; Tomie Ohtake na Trama Espiritual da Arte Brasileira – Curadoria de Paulo Herkenhoff, 2003; Vilanova Artigas – Curadoria de Ruy Ohtake e Julio Katinsky, 2003; Kamekura: a Gráfica, o Japão, o Cartaz, 2005; Arena Conta Arena – Curadoria de Isabela Teixeira, 2005; Ação e Pensamento, 6 Exposições com trabalho de formação de professores e grupo de alunos: Ana Maria Tavares, Amelia Toledo, Rochelle Costi, Nuno Ramos, Arthur Lescher, Carmela Gross – Curadoria de Agnaldo Farias, 2006, 2007, 2008; Meio Século de Arte Brasileira – Curadoria de Paulo Herkenhoff, Gloria Ferreira, Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos, 2007; Laços do Olhar, Roteiro entre o Brasil e o Japão – Curadoria de Paulo Herkenhoff, 2008; Sejima e Nishizawa, Sanaa – Curadoria de Yuko Hasegawa, 2008.

Pinturas Cegas, Tomie Ohtake – Curadoria de Paulo Herkenhoff, 2011; Anônimos e Artistas, do Artesanato Tipográfico ao Design Gráfico (4 exposições) – Curadoria de Egeu Laus, Milton Cipis, Norberto Gaudêncio Junior e Fernanda Martins, 2011 e 2013; Teimosia da Imaginação (artistas de origem rural, autodidatas), juntamente com Instituto do Imaginário do Povo Brasileiro – Curadoria de Germana Monte-Mór e Rodrigo Naves, 2012; Um Olhar sobre o Brasil, a Fotografia na Construção da Imagem da Nação – Curadoria de Boris Kossoy e Lilia Schwarcz, 2012; Thom Mayne – Curadoria de Peter Cook, 2012; Gesto e Razão Geométrica, Tomie Ohtake – Curadoria de Paulo Herkenhoff, 2013

Histórias Mestiças – Curadoria de Adriano Pedrosa e Lilia Schwarcz, 2014; Salvador Dalí – Curadoria de Montse Aguer, 2014; Frida Kahlo – Conexões entre mulheres surrealistas no México – Curadoria de Teresa Arcq, 2015; Nós entre os Extremos, A Arte e a Ciência – Curadoria de Paulo Miyada, 2015; Aprendendo com Dorival Caymmi: Cultura Praieira, com José Pancetti, Sergio Rodrigues e Caymmi – Curadoria de Paulo Miyada, 2016; Picasso: Mão Erudita, Olho Selvagem – Curadoria de Emilia Philippot, 2016; Os Muitos e o Um: Arte Contemporânea Brasileira na Coleção Andrea e José Olympio Pereira – Curadoria de Rob Storr e Paulo Miyada, 2016.

Vamos voltar para a arquitetura novamente. O senhor considera que ela [arquitetura] tem iluminado e enriquecido a experiência humana em quais aspectos?

Afinal é a arquitetura que constrói o habitat humano. E aí, ela pode iluminar como apagar a experiência humana, enriquecer ou empobrecer esta experiência. Mas a experiência humana é uma diversidade de assuntos e de níveis que a compõe. E nisso a arquitetura colabora decisivamente com o espaço que a sociedade humana ocupa: a questão da relação com o planeta, a questão da engenharia, a questão cultural, a questão social, a questão psicológica, tudo isso dependendo como é formulado, sempre muda o habitat.

Em 2014, a retrospectiva da artista Yayoi Kusama atraiu 522 mil pessoas para o Instituto Tomie Ohtake. Por que o senhor acredita que a retrospectiva tornou-se esse sucesso de público?

A invenção da obra de Kusama foi um verdadeiro achado que os visitantes tiveram. Foi a oportunidade de ter aquela revelação e poder ser fotografada e, quando o selfie estava no auge do uso pela população, todo mundo quis aproveitar esta invenção e a captação de imagens nunca vistas em fotos sendo enviadas para milhares de pessoas. Todos tinham que ver a mostra e repetiam os gestos. 522 mil pessoas aqui e quando levamos a mostra ao Rio, Brasília, Buenos Aires, Santiago e Cidade do México, 2,5 milhões de pessoas! Arte de excepcional nível artístico e que coincidiu de haver uma mania mundial.

Como o Instituto Tomie Ohtake tem lidado com os novos nomes da arte contemporânea brasileira?

Fazemos projetos anuais “Arte Atual” (mais do que uma vez por ano), a premiação “Energia nas Artes” e “Festival Arte Atual”. Ainda é pouco, mas é extremamente difícil de realizá-las. Estamos fazendo força para em dois realizar um programa satisfatório.

O que o senhor considera fundamental e que deve estar inserido no DNA de uma organização que respira arte como é o caso do Instituto Tomie Ohtake?

Além das exposições, temos todas as atividades complementares como o trabalho educativo que consiste em realizar um programa de acompanhar grupos e praticar arte que tem a ver com a mostra, permitindo a acessibilidade de grupos novos, não só os de mobilidade, como os de diversidade sexual, de bebês e idosos, de pobres que não tiveram possibilidade e nem facilidade de comparecer, enfim, de possibilitar a democratização das atividades, mas também fazer atividades de alto nível intelectual com mesas de debates, seminários, cursos e publicações, exposições históricas do pós-II Guerra e algumas anteriores, com artistas que contribuem para o desenvolvimento da arte, artes que não são comuns no meio da arte, etc. No DNA é importante que haja invenção e originalidade.

As instâncias públicas e privadas devem melhorar em que pontos, para que mais pessoas tenham acesso ao mundo das artes?

A cultura e as artes se movimentam com recursos públicos, no mundo todo com exceção dos Estados Unidos e de países que têm grandes companhias. É o dinheiro público que alimenta a cultura. No Brasil existe uma extraordinária lei de incentivo que é a Lei Rouanet. Esta possibilitou nas últimas três décadas a arte e a cultura se desenvolverem extraordinariamente. É claro que precisa ser aperfeiçoada, principalmente no que se refere ao Fundo Nacional de Cultura que não tem funcionado e que poderia estar regando o interior do país, a região Norte, o Nordeste e o Centro Oeste, as periferias das grandes cidades, já que o mecenato da Lei Rouanet tem funcionado muito bem e é o que faz hoje a arte e a cultura brasileira se movimentar.

Dos vários ensinamentos que sua mãe lhe deixou, quais seriam os principais e que você de certa forma absorveu como profissional e ser humano?

É necessário trabalhar muito, ter invenção, realizar experiências, produzir originalidades, saber que os artistas são fundamentais para a alma do país, pensar deveria ser uma coisa normal.


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