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Paulo Feldmann fala das desigualdades nacionais

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Paulo Roberto Feldmann é professor associado da FEA/USP. Homenageado diversas vezes pelos alunos com o prêmio de “Melhor Professor do Semestre”. Sua formação básica é em Engenharia de Produção pela Poli/USP tendo feito tanto seu mestrado como o doutorado na Fundação Getulio Vargas. Em junho de 2015 concluiu sua Livre Docência na FEA. Suas duas linhas de pesquisa, ambas contempladas em grupos de pesquisa no âmbito do CNPq são as seguintes: Relação da inovação e tecnologia com as organizações e com o desenvolvimento das nações. As razões que levam empresas multinacionais a optarem por regiões e países ao escolherem onde localizar suas filiais, suas operações, partes de suas cadeias de valor e seus investimentos estrangeiros – F.D.I. Desde abril de 2016 tem atuado como professor visitante de 4 universidades húngaras: Pécs, Corvinus, Miskolc e Széchenyi. Em geral, na Hungria, tem ministrado cursos sobre a Economia da América Latina. Paulo Feldmann conseguiu por 28 anos (1981 a 2009) conciliar sua atividade de Professor da FEA/USP com a carreira de alto executivo de empresas como Citibank, Itautec, Banco Safra, Philips, Ernst & Young e Microsoft, tendo sido presidente da Eletropaulo (1995/7), da Iron Mountain (2007/9) e da Compucenter (1990/1). “2021 poderá ser um ano positivo com uma taxa de crescimento maior do que aconteceu de 2015 para cá”, afirma.

Professor, como acredita que estará a economia do nosso país no pós-Covid-19?

Certamente numa situação difícil com desemprego alto. É muito difícil estimar se esses números sobre de quanto será a queda ou o desemprego, mas certamente os números não serão bons. No entanto, finda a crise do Covid, prevista para meados do 2° semestre, a retomada devera ser rápida e forte. Ou seja, 2021 poderá ser um ano positivo com uma taxa de crescimento maior do que aconteceu de 2015 para cá.

Quais os maiores erros da equipe econômica do Governo Bolsonaro nessa crise?

A economia já vinha muito mal desde 2015 e caberia perfeitamente em 2019 um programa forte de retomada dos investimentos e um programa de geração de empregos. Os dois precisavam de ação intensa do Governo Federal. Isso não foi feito por que até esta crise do Corona vírus o ministro Paulo Guedes acreditava que as soluções deveriam vir apenas do mercado. Ele só mudou de ideia por que todos os países (sem exceção) aumentaram demais o gasto público para contornar a crise. Ficou evidenciado que a ação do Estado é fundamental para tirar países de crises econômicas. Keynes tinha razão.

Outro erro grave foi permitir que os bancos continuassem praticando taxas de juros muito altas nos empréstimos. Não adiantou baixar a SELIC por que ela só repercutiu nas aplicações. O Governo perdeu o momento de pressionar os bancos nesta questão. Se os juros para empréstimos e financiamentos tivessem caído teríamos tido mais investimentos e consequentemente crescimento. Esse Governo não fez absolutamente nada para ajudar a pequena empresa até o último mês de março. A pequena empresa definha e poderia ter sido a grande geradora de novos empregos. Faltou também uma política de fortalecimento da pequena empresa. Agora em março finalmente o Gfoverno agiu, mas trata-se de uma política emergencial.

E os principais acertos?

Os erros foram muito graves e permearam tudo que aconteceu de tal forma que não consigo ver pontos de acerto. Se existiram foram tão pequenos que não apareceram. Talvez o único acerto foi que essas medidas de emergência adotadas agora em março/abril foram corretas e decididas com rapidez.

Em 2018, o senhor afirmou que no futuro não haveria emprego para todo mundo. Esse futuro pode ser acelerado com essa crise?

Infelizmente há uma tendência mundial de emprego de máquinas, robôs, Inteligência Artificial no sentido de aumentar a produtividade das empresas. A consequência negativa é que essas tecnologias eliminam empregos. Os países mais desenvolvidos discutem isso há muitos anos e alguns caminham para programas de renda mínima para criar uma proteção social para os que vão perder seus empregos. Essa crise pode acelerar estes aspectos no momento da retomada. As empresas na hora da retomada vão preferir usar os equipamentos acima mencionados.

Algum setor sairá com danos menores (se podemos dizer assim) dessa turbulência?

A situação será diferente para cada país. Nos países mais avançados os setores de alta tecnologia vão se dar muito bem e até gerar novos empregos. No Brasil precisamos urgentemente focar em setores básicos sem os quais não há desenvolvimento como Infraestrutura, Educação e Saúde. São todos setores que podem contribuir na geração de novos empregos. Mas para isso o país precisa de um plano e uma política industrial. A carência de infraestrutura no Brasil (e aí incluímos o setor de saneamento) é brutal. Não será resolvido acreditando que o mercado vai resolver tudo. Há que haver planos governamentais, recursos também, mas principalmente ação e execução.

O uso da Inteligência Artificial poderá ser ainda mais acelerado com esse cenário?

Já vem acontecendo e vai se acentuar. Ela está perto de explodir, ou seja, todos os setores serão seus usuários. O problema é que ela é o grande vilão da eliminação de empregos e até mesmo em setores cujos empregados são profissionais liberais como médicos, advogados, engenheiros, etc. Todos terão seus empregos afetados.

Quais os maiores temores na chamada Era dos Robôs?

Os robôs já estão no Brasil há quase 30 anos e até aqui só impactavam trabalhos braçais e que envolviam movimentos e deslocamentos de peças ou de materiais. Agora os robôs são dotados de Inteligência Artificial e isso vão impactar atividades onde passam a executar atividades do ser humano, mas substituindo não mais o movimento, e sim a ação intelectual ou de inteligência. Daí a ameaça que agora existe para praticamente todas as profissões ditas liberais, como médicos, advogados, engenheiros, etc.

A sobrevivência no pós-crise dependerá também da educação. Então seriam dois problemas, certo?

Essa é uma das poucas unanimidades que existe entre os especialistas que estudam como será o trabalho e o emprego no futuro: As pessoas com formação excelente e diversificada são as que estarão ocupadas. Para as outras restarão pouquíssimas atividades a desempenhar.

O senhor é esperançoso em relação às mudanças no sistema tributário?

A desigualdade no Brasil é chocante. Os dados do Banco Mundial nos colocam na nona posição em termos dos países que possuem a maior concentração de renda. O um por cento mais rico dos brasileiros (cerca de 2 milhões de pessoas) detêm 26% da renda total e 49% do patrimônio do país. Nessa lista do Banco Mundial, os nossos colegas nessa colocação horrível são países muito pobres, a maioria da África. A razão para isso é o nosso sistema tributário, onde o Imposto de Renda além de não ser progressivo isenta para a Pessoa Física os ganhos com dividendos, lucros de empresas e aplicações financeiras. Impossível que nossos parlamentares não percebam isso. Por isso acredito na mudança.

A taxação das grandes fortunas seria uma das saídas?

São raros os países onde o imposto sobre herança não seja importante. Na maioria dos países europeus e no Japão quando alguém falece deixa entre 40 e 50% para o Estado. No Brasil esse imposto está entre 4 e 5% (10 vezes menos) e é estadual. Com relação a taxar a riqueza é a mesma coisa. Os super ricos no Brasil pagam a mesma alíquota (27,5%) que a classe média. Fora o fato apontado no item anterior de que são isentos da quase totalidade de seus ganhos. Evidentemente eles não vivem de salários que é onde o IR taxa e cobra.

Quais os principais obstáculos para que isso ocorra?

Claro que é politico. Os muito ricos têm grande ascendência e influência sobre nossos parlamentares, mas sou otimista, pois, a sociedade brasileira já percebeu a necessidade dessa mudança.

Última atualização da matéria foi há 2 anos


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