O AfroReggae é uma ONG que também atua como banda musical, surgida em 1993 inicialmente como um jornal informativo (Afro Reggae Notícias) das festas que o grupo realizava, como também da valorização da cultura negra voltada sobretudo aos jovens ligados a música como Reggae, Soul e Hip Hop. Inicialmente, a festa chamava-se Rasta Dancing. Na linha de frente desse projeto estão várias pessoas, dentre elas o fundador e coordenador do grupo José Júnior de 42 anos. Brigão nos velhos tempos, o empreendedor social, mudou o seu curso de vida. Além do trabalho na ONG, ficou célebre graças ao ofício de mediador de conflitos. Há alguns anos, figura na guerra carioca como o sujeito que fala com os dois lados: cúpula dos bandidos e cúpula da polícia. “Acho que a resposta já foi dada com Obama e Lula (que não é negro, mas que vem de uma origem humilde). Cada vez mais o negro vem se inserindo não pela generosidade da sociedade, mas pelo seu talento e qualidade. O mundo está mudando e o poder começa a ter “novas mãos”, poucas, mas está começando a crescer. (…) Favela pra muitas pessoas é motivo de orgulho. Agora tudo depende da forma que é colocado e falado. É como você chamar uma pessoa de negra. Dependendo da forma pode ser racismo, brincadeira ou mesmo carinho”, afirma o empreendedor social e um dos expoentes do terceiro setor no país.
Qual foi o pulo do gato para um negócio que iniciou-se pequeno, e que se transformou num imenso grupo cultural?
Ter foco e determinação. Ouvir quem está ao redor e mais, tomar a decisão, que muitas vezes não vai de encontro com a razão, mas que comungue com a sua intuição.
Você disse que os jornalistas enxergam o AfroReggae muito ocidentalizado, mas você o enxerga mais orientalizado. O que quis dizer com isso?
É exatamente o que eu disse na pergunta anterior: emocional/intuitivo são características que nesse mundo “formal” e demasiadamente “racional” não são valorizadas.
Se você não tivesse sido formado pelo padre Lorenzo Zanetti e pelo saudoso compositor Waly Salomão, acredita que estaria como e onde?
Estaria no AfroReggae, mas não sei se seria como eu sou. Aprendi muito com eles e me influenciaram completamente em tudo o que eu faço. Lorenzo era um “conservador-progressista” e o Waly um “louco-genial”.
Você diz que na fé é eclético. Então concorda que o maior problema da humanidade são as incontáveis religiões que “obrigam” o indivíduo a seguir um só caminho?
Não concordo! As religiões não são o problema. Os problemas são as pessoas que usam as religiões e as divindades em proveito próprio. Isso acontece em todas.
Poderia nos contar qual foi a pior mediação de conflitos com o tráfico que você já participou?
Dia 8/10/2004 aconteceu uma invasão de traficantes rivais a facção que dominava Vigário Geral. Eu achei que sete pessoas do AfroReggae iriam morrer e eu fui pra morrer junto com eles. Foi traumático! Combinamos que se sobrevivêssemos, faríamos várias ações como o Antídoto do Itaú Cultural e www.venenoeantidoto.com.br – mostra internacional – seminários, shows, exibição de filmes sobre mediação de conflitos, etc. Também fizemos documentários, implantamos setores que trabalham mediando conflitos nas favelas e nos presídios.
O AfroReggae recebeu alguma ajuda financeira significativa dos Governos FHC e Lula nesses 17 anos de existência?
Recebemos apoio do Governo FHC através do Comunidade Solidária (programa criado pela Dona Ruth Cardoso) e um apoio da Petroquisa. Do Governo Lula tivemos apoio do MINC via lei Rouanet e da Petrobras.
A estética da pobreza que é cultuada pela grande mídia lhe incomoda?
Depende da forma que é abordada pelos veículos de comunicação.
Quando uma grande parte da classe média e da elite nacional afirma que as comunidades são favelas e malocas, elas dizem isso por simples desconhecimento, ignorância ou por puro preconceito?
Favela pra muitas pessoas é motivo de orgulho. Agora tudo depende da forma que é colocado e falado. É como você chamar uma pessoa de negra. Dependendo da forma pode ser racismo, brincadeira ou mesmo carinho.
Provavelmente você assistiu os filmes “Tropa de Elite” 1 e 2 do diretor José Padilha. Pelo que você conhece do Rio de Janeiro, o que é verdade e o que é mentira nos longas?
Gostei muito dos 2 filmes e acho que trazem verdades que não são absolutas, mas que tem fundamento. O segundo filme mostra uma realidade até então nunca exibida.
Como andam os trabalhos do AfroReggae no exterior?
Gerando bastante impacto e levando a tecnologia social das favelas brasileiras onde atuamos, para serem adaptadas em todo e qualquer lugar do mundo. Temos uma ação forte na Inglaterra. O filme Favela Rising abriu muitas frentes também.
Você participa do projeto “Bota Pra Fazer” ligado ao empreendedorismo. Como andam essas ações nas comunidades?
Participei nos 2 primeiros anos e agora vamos ajudar no lançamento da Semana Global de Empreendedorismo, que será em Vigário Geral. Pela primeira vez a Endeavor vai fazer um evento numa favela e levar grandes líderes para lá.
Como dar um basta definitivo no pensamento que diz: “negros só serão vencedores se estiverem no mundo do samba e do pagode, ou sendo um astro milionário do futebol?”.
Acho que a resposta já foi dada com Obama e Lula (que não é negro, mas que vem de uma origem humilde). Cada vez mais o negro vem se inserindo não pela generosidade da sociedade, mas pelo seu talento e qualidade. O mundo está mudando e o poder começa a ter “novas mãos”, poucas, mas está começando a crescer.
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