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Alexandre Chan mostra a paixão pelo seu ofício

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Na adolescência o carioca Alexandre Chan queria ser psicólogo. Passou em primeiro lugar no vestibular de arquitetura da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), vivenciando todo o fervor provocado pela construção da cidade de Brasília (1960). Veio a se formar em 1965. Em 1969 passou no concurso para o BNH (Banco Nacional da Habitação). No entanto, não assumiu o cargo porque queria apenas escrever uma monografia (exigência do concurso) defendendo a regionalização e aproveitamento dos recursos locais nos sistemas construtivos, o que ia contra maior parte das diretrizes do Banco. Apesar de ser também autor do Piscinão de Ramos, no Rio de Janeiro, seu projeto mais conhecido é, sem dúvida, a Ponte Juscelino Kubitschek, localizada na capital federal, sobre o lago Paranoá, e que faz a ligação viária entre o Setor de Clubes e o Setor Habitacional Individual Sul de Brasília. Fato é que essa ponte lhe rendeu um prêmio internacional, em 2003: a Medalha Gustav Lindenthal, outorgada pela Sociedade dos Engenheiros do Estado da Pensilvânia, Estados Unidos. Por causa deste prêmio, a estrutura ficou localmente conhecida como a ponte mais bela do mundo. Atualmente tem trabalhado com projetos de forte motivação ambiental e socioeconômica, associando-se a fundações, empresas, empreendedores ambientais, construtoras, órgãos governamentais e empresas de terceiro setor.

Alexandre, na adolescência você queria ser psicólogo. O que permaneceu desta vontade em seu trabalho como arquiteto, afinal as duas beneficiam a sociedade de um certo modo?

A ideia era a de influenciar beneficamente, no presente e no futuro, o comportamento, ações e sonhos, definidos ou latentes, das comunidades e das pessoas através de intervenções com peso sócio-psicológico no cenário das atividades humanas. Pesando minhas incipientes tendências e habilidades de então, como desenho, geometria, artes plásticas, história, psicologia, filosofia e alguma física e matemática, passei a prestar atenção em arquitetura e planejamento urbano e regional e achei que aí poderia sintetizar minha vocação inicial. O ímpeto foi tanto que tirei o primeiro lugar no antigo exame vestibular. Em meus projetos sempre será buscada a satisfação de todos os sentidos dos usuários diretos e a provocação dos indiretos. E, em todos, o momento presente e o momento futuro. Já tive ocasião de ver reforma ou ampliação de antigas obras minhas feitas na orientação intuitiva que estruturas, paredes e instalações sugeriam. Coisa de louco.

Como você enxerga o planejamento urbano das cidades brasileiras de uma forma geral?

Ocorre, infelizmente, quase sempre aos arrancos e de modo pontual, geralmente mais por força de facilitação da expansão imobiliária e sua consequente arrecadação de impostos. O uso dos carros continua prioritário em detrimento das pessoas. Os grupamentos espontâneos, praticamente incentivados por agentes do poder e coletores de votos, são engessados por leis populistas que ignoram a segurança contra incêndio, epidemias, vetores e a necessidade de acesso de veículos e agentes de serviços públicos.

Mesmo com a melhoria dos transportes públicos no país, acredita ser possível fazer aquele que dirige o seu automóvel, criar a consciência que deve usar esses transportes para gerar uma maior viabilidade no trânsito?

A pressão conjunta dos fatores de combate à poluição, inchamento populacional urbano, redução de espaços de circulação viária e estacionamento e ideação ampliada de sistema saudável de vida vem ocasionando reações positivas em todo o planeta no sentido do uso preferencial do transporte coletivo não poluente. Mas isso não ocorrerá de imediato, mas sim pela progressiva conscientização pública fertilizada pelos crescentes incentivos e campanhas nesse sentido e desincentivos como preços e taxações crescentes de veículos e combustíveis poluentes. Tudo sob um planejamento que privilegie os pedestres.

A Copa do Mundo de 2014, deixou algum legado real no urbanismo das grandes cidades brasileiras em sua visão?

Não. Mas os Jogos Olímpicos do Rio 2016 sim.

Alguns arquitetos e urbanistas críticos dos Governos Lula e Dilma, afirmam que eles foram os principais culpados pela situação caótica do trânsito das nossas cidades, por “entupir as artérias urbanas” com automóveis. Como vê este fato?

Não só esses Governos populistas. É comum aos políticos em todos os escalões e partidos o desconhecimento, involuntário ou intencional, de fatores de planejamento urbano ou regional, em favorecimento de interesses aleatórios, fortalecimento eleitoral ou captação de impostos. Como no caso dos quase sempre preteridos projetos de saneamento básico, essenciais à saúde, mas invisíveis aos olhos dos eleitores comuns.

Voltando ao trânsito, o pedágio urbano resolveria parte dos problemas que temos atualmente nas grandes metrópoles do país?

Como citado na pergunta 3, o pedágio urbano pode ser um dos inevitáveis paliativos temporários tal como o banimento de carros em zonas centrais ou o revezamento de veículos por final de placa.

Quando se fala em Alexandre Chan, rapidamente o que vem em nossa mente é a Ponte JK. Como foi projetar este que se tornou um dos símbolos de Brasília?

Um desafio emocionante para um arquiteto estruturalista, um tema incomum no quotidiano dos profissionais de projeto, um entorno ambiental espetacular, a cidade-símbolo, a oportunidade de otimizar resultados e soluções plásticas com a engenharia magnifica do meu parceiro convidado engenheiro Mario Vila Verde e o sonho de reunir para sempre e de novo o belo e o engenho.

Adequar um projeto ao meio ambiente e ao mesmo tempo destacar o valor estético da obra, deve ser um papel predominante de todo arquiteto?

A perfeita adequação de uma edificação ao meio ambiente é uma meta impossível. Um único tijolo já não é um objeto natural. Contudo procuramos harmonizar a presença de uma obra ao seu ambiente o que pode ocorrer desde a mimetização da mesma até ao seu contraste absoluto, mas de maneira elegante. A estética da obra, parte inseparável do conjunto de suas funções, passa inevitavelmente por essa consideração.

Em alguns textos e entrevistas que você já concedeu, sempre vemos que a palavra coração está sempre presente em seus pensamentos como profissional. Em qual dos seus projetos, o seu coração ficou mais “apaixonado” de forma avassaladora?

A paixão cresce quando sentimos o potencial de comunicação da obra com seu público usuário direto ou não. Ocorreu isso desde os primeiros momentos do projeto da Ponte JK em 1998. A cidade em si, monumental e simbólica, a presença de tantos exemplares do talento de Niemeyer e Lúcio Costa, a provável redescoberta do Lago Paranoá pelos habitantes e a confirmação do destino inovador da capital tornaram a pesquisa e a responsabilidade maiores que em qualquer outro projeto anterior. Recebi depoimentos entusiasmados de pessoas de todas as camadas sociais. A maioria não precisava passar por ela. Era algo que se orgulhavam, era a janela para o lago perdido, era a valorização de suas casas ou era o local onde levariam seus parentes visitantes. A ponte viria a tornar-se mais tarde a imagem da renovação da cidade em campanha turística de Brasília.

O seu conselho para os jovens estudantes de arquitetura, foi que eles devem se atrever, com base no estudo e na intuição desenvolvida. Lembra-se da primeira vez que usou este seu conselho para a sua vida profissional?

A verdadeira vocação impele o atrevimento. E este não será apenas para afirmação pessoal, mas para verdadeiramente marcar o recado do momento e apontar as possibilidades do futuro. A primeira vez que usei não foi na vida profissional, foi ao desobedecer a um dos professores sob ameaça de nota baixa se prosseguisse um dos projetos da faculdade como eu queria. Assumi a nota baixa. Terminei o curso com uma medalha na matéria.

Goethe dizia que a arquitetura é a música petrificada. E para você, o que é a arquitetura?

Essa é uma bela definição. A música, mais que as demais artes, penetra as almas. Le Corbusier [arquiteto, urbanista, escultor e pintor de origem suíça e naturalizado francês em 1930. É considerado, com Frank Lloyd Wright, Alvar Aalto, Mies van der Rohe e Oscar Niemeyer, um dos mais importantes arquitetos do século XX, 1887-1965] falava do jogo correto e magnífico dos volumes sob a luz. Ambas me atraem, pois, a primeira sugere minha intenção de colaborar com a evolução do espírito usuário enquanto a segunda parece influenciar mais o usuário indireto, o observador externo. Em ambas talvez devêssemos acrescentar a participação da obra como um dos compassos da melodia da cidade e da natureza envolvente.


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