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Dalmo Dallari questiona a delação premiada atual

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Formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Dalmo de Abreu Dallari, escreveu seu primeiro artigo em 1961 intitulado: “O município brasileiro”. Em 2001, publicou uma obra pioneira acerca de perspectivas do Estado para o futuro – intitulando-a de “O Futuro do Estado” – tratando do conceito de Estado mundial, do mundo sem Estados, dos chamados Super-Estados e dos múltiplos Estados do Bem-Estar. Em 1996 tornou-se professor catedrático da UNESCO na cadeira de Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância, criada na Universidade de São Paulo, tendo participado de seu primeiro Congresso em 1998. Suas obras são estudadas em cursos de Direito de todo país. A mais conhecida é “Elementos da Teoria Geral do Estado”, disciplina do Direito que estuda origem, formação, estrutura, organização, funcionamento e finalidades do Estado. Outros livros considerados importantes em sua vasta obra são “O Estado Federal” e “O Poder dos Juízes”. É professor Emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. “Tenho sustentado e demonstrado a inviabilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff pela razão fundamental de que ninguém apresentou até agora um fundamento jurídico válido. (…) Quanto ao desempenho do juiz Sérgio Moro, penso que ele foi corajoso e deu o passo inicial para o começo da punição dos economicamente poderosos”, afirma o jurista.

Professor, por quais razões o senhor considera que o impeachment da presidente Dilma Rousseff inviável?

Tenho sustentado e demonstrado a inviabilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff pela razão fundamental de que ninguém apresentou até agora um fundamento jurídico válido para a imposição dessa drástica medida, que seria desastrosa para a normalidade da ordem democrática brasileira. O que existe é uma mobilização política, que às vezes tenta simular algumas bases jurídicas, mas o simples exame dos argumentos deixa logo claro que essa base jurídica não existe.

Há mais ou menos 12 anos, o senhor publicou um texto que gerou polêmica na época chamado “Degradação do Judiciário”. Como enxerga o Judiciário brasileiro atualmente?

Em minha opinião e tomando por base as mudanças ocorridas ultimamente no desempenho do Poder Judiciário, julgo que ele melhorou muito no sentido de efetiva participação na garantia dos direitos fundamentais estabelecidos na Constituição. A postura do Judiciário também foi modernizada e melhorada, pois, como observou com muita precisão o eminente ministro Enrique Ricardo Lewandowski em seu discurso de posse na Presidência do Supremo Tribunal Federal, o Judiciário brasileiro superou a tradicional postura de “boca da Lei”, ou seja, de mero aplicador formal da lei escrita, herdada da influência francesa e passou a “potencializar ao máximo sua atividade hermenêutica, de maneira a dar concreção aos direitos fundamentais”, consagrados na Constituição.

Por que enxerga a delação premiada como foi constituída como algo negativo?

Considero a delação premiada altamente questionável dos pontos de vista ético e jurídico. Inspirada numa criação italiana, que foi a exploração dos mafiosos dispostos a denunciar os companheiros em troca de benefícios pessoais, como o perdão de seus crimes ou penas levíssimas. Eles foram chamados de “arrependidos”, simulando uma tomada de consciência ética. É o mesmo que ocorre com a delação premiada, que é a concessão de vantagens pessoais a quem resolve trair os companheiros em troca de benefícios pessoais. Além disso, nunca se sabe se o delator foi coagido ou está intimidado e também quanta verdade, ou invencionice está em sua delação. Assim, pois, por motivos éticos e jurídicos considero altamente questionável a delação premiada.

Como vê a proposta que quer reformar o Código Penal brasileiro?

Não existe uma proposta completa e fundamentada de modificação do Código Penal. Já foram feitas inúmeras propostas e seria bom criar um grupo especial, ligado à Ordem dos Advogados (OAB) e com a participação do Ministério Público e de Magistrados, para a elaboração de uma proposta completa e coerente de modificação do Código Penal.

90% da população apoia a redução da maioridade penal. O senhor faz parte dos 90% ou dos 10%?

Sou contrário à proposta de redução da idade de responsabilidade penal, pois, com tal medida iríamos colocar um grande número de adolescentes em presídios superlotados, ficando obrigados a conviver com bandidos experimentados, membros de quadrilhas, que certamente iriam coagi-los a participar dessas quadrilhas.

Então, qual o melhor caminho em sua visão?

O que se deve fazer é melhorar a organização e o funcionamento das instituições responsáveis pelo recolhimento dos jovens infratores e por sua inserção ou reinserção na sociedade como cidadãos conscientes e responsáveis.

Vê mais erros ou acertos na chamada Operação Lava Jato?

Penso que a chamada Operação Lava Jato foi muito importante para que se passasse a responsabilizar os grandes empresários praticantes de crimes contra a ordem pública através de corrupção de membros do Governo e da Administração Pública. Mas existem ainda aspectos jurídicos que precisam ser melhor definidos, como a responsabilidade da empresa e do empresário conjunta ou separadamente.

Qual a análise que o senhor faz da figura do juiz Sérgio Moro, apontados por muitos como um dos homens mais importantes da República na atualidade?

Quanto ao desempenho do Juiz Sérgio Moro, julgo que ele foi corajoso e deu o passo inicial para o começo da punição dos economicamente poderosos. Em alguns casos penso que ele exagerou, indo muito além de suas competências legais, possivelmente estimulado pela cobertura da grande imprensa, mas, sem dúvida, sua contribuição foi positiva.

Dos três poderes constituídos, acredita que a Justiça é a que apresenta menos defeitos?

Não há como avaliar os defeitos dos três poderes da República para concluir qual deles apresenta mais defeitos. A Constituição de 1988 foi muito positiva no sentido da democratização dos poderes, mas os três poderes necessitam de aperfeiçoamentos, sugeridos pela experiência.

Qual deles merece uma melhor atenção no momento?

Agora penso que o mais necessitado de atenção é o Legislativo, pois, muitos de seus membros são ostensivamente representantes de outros interesses que não os do povo. Mas é preciso assinalar que todos os membros do Legislativo foram eleitos pelo povo, apesar de muitos deles serem notoriamente corruptos. Por isso é absolutamente necessário um trabalho de conscientização da cidadania, para que o eleitor perceba que os direitos da cidadania implicam enormes responsabilidades e para que deem prioridade ao interesse público e não às vantagens pessoais ou à intolerância política, ou social no momento de externar o seu voto a favor de um candidato.


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