Eduardo Tessler foi repórter, editor, correspondente estrangeiro e diretor. Atualmente é consultor atuando como project manager e dirigindo o Mídia Mundo, site de análises da mídia que acabou ficando mais conhecido pelas avaliações de capas de jornais, que evoluiu e que também acabou se tornando consultoria e treinamento. Entre as empresas em que ele desenvolveu projetos estão Corriere della Sera (Itália), Expresso (Portugal) e El Mundo (Espanha), além dos brasileiros O Globo (Rio de Janeiro), Correio (Bahia) e Grupo Jaime Câmara (Goiás). “Todos que ainda falam em papel e digital, em vez de pensar em conteúdo e distribuição, estão parados no milênio passado. É verdade que a receita principal das empresas papel-digital ainda vem do papel. Mas os números mostram que o volume de leitura de papel está em queda livre, enquanto a audiência digital só aumenta. Então por que se insiste em privilegiar o papel? Se eu fosse dono de uma empresa de meios de comunicação correria em montar uma agressiva estratégia de produção de conteúdos, em que o digital tem prioridade. E, ao mesmo tempo, armar um sistema de conteúdos digitais pagos, por paywall, membership, tudo o que puder gerar novas receitas. Fico impressionado como gerentes de jornais no Brasil ainda tentam ressuscitar os classificados no papel! Estão mortos, não existem mais”, afirma o jornalista e requisitado consultor.
Eduardo, para que direção está indo o mundo das comunicações em nosso país?
A grande maioria está entrando em uma lógica de morder o próprio rabo. Como as contas não estão deixando nos cofres o mesmo volume de dinheiro que brilhava há cinco ou seis anos, as empresas brasileiras entraram em uma lógica de corte de custos sem muitos critérios – principalmente a mídia regional. Corta-se talentos, que são os diferenciais entre o que é indispensável e o que é descartável. Ou seja, quando a concorrência aumenta – afinal, os meios digitais permitem que qualquer garagem se transforme em uma mídia – as marcas tradicionais demitem em grande escala, abrem mão da qualidade e acabam se igualando aos pequenos. É o que chamo de “corte burro”. Poucos entendem que sem qualidade, sem investir em um novo modelo de negócios, baseado na receita do leitor, não há futuro. Os que só cortam custos – e não propõem soluções alternativas – apenas aceleram o caminho ao fechamento.
Acredita que ainda existirá futuro para os jornais impressos?
Sim, acredito. Os meios impressos devem ter vida longa, desde que entendam que sua função primária mudou: não servem mais para publicar notícias, mas para ir mais além. Há que se aceitar que mídias mais rápidas ocuparam o espaço de informar o básico. No impresso é preciso publicar a explicação, a análise, a inteligência. Mas não gosto dessa discussão sobre o futuro dos meios impressos. Acho que quem deve estar preocupado com o futuro dos jornais é o fabricante de papel e as indústrias de rotativa. As empresas de comunicação produzem conteúdo. O meio físico é apenas o método de distribuição, não a criação.
Os donos dos veículos do Brasil continuam com a cabeça no século XX?
A grande maioria, sim. Todos que ainda falam em papel e digital, em vez de pensar em conteúdo e distribuição, estão parados no milênio passado. É verdade que a receita principal das empresas papel-digital ainda vem do papel. Mas os números mostram que o volume de leitura de papel está em queda livre, enquanto a audiência digital só aumenta. Então por que se insiste em privilegiar o papel? Se eu fosse dono de uma empresa de meios de comunicação correria em montar uma agressiva estratégia de produção de conteúdos, em que o digital tem prioridade. E, ao mesmo tempo, armar um sistema de conteúdos digitais pagos, por paywall, membership, tudo o que puder gerar novas receitas. Fico impressionado como gerentes de jornais no Brasil ainda tentam ressuscitar os classificados no papel! Estão mortos, não existem mais. E a culpa de não ter mantido o cliente dos classificados, em um ambiente digital, é dos mesmos gerentes. Também são eles que, para fazer entrar algum dinheiro a qualquer custo, liquidam os espaços publicitários dos jornais. Pior, vendem enormes pacotes a governos e imploram para que as redações “afrouxem” a cobertura oficial.
Os jornais regionais também sofrerão com o digital?
Sim, já sofrem. E muitos – a maioria – tenta reagir pelo lado errado, copiando modelo de gigantes nacionais e internacionais. Um paywall poroso (metered) nunca vai funcionar no interior, pelo simples motivo que é preciso um enorme volume de hard-users para que se pague a conta. Já um modelo “freemium” permite que se compita com os sites abertos nas notícias, enquanto se oferece apenas aos assinantes o conteúdo trabalhado, diferencial. Mas tecnologia custa caro. E é preciso fazer bem – ou melhor, não fazer. Isso exige a contratação de profissionais que não existiam, como analista de audiências, desenvolvedor e outros tantos. Sem investir fica difícil entrar no jogo para competir. E entre os regionais muito mais.
Você disse em uma certa ocasião, que agora o importante é vender conteúdo. O que faz um conteúdo ser vendável em sua visão?
Bom conteúdo é vendável. Aquilo que só você tem. A melhor análise. Qualidade. Inteligência. Apresentação. Ousadia. Se você só tiver o que todos têm, seu conteúdo não é necessário. É preciso ter algo único, diferente, exclusivo.
Em meados de 2010, o Brasil patinava em termos de convergência. Como enxerga essa questão em 2018?
Há que se entender uma diferença entre convergência e integração. Convergência é quando você tem duas ou mais operações simultâneas em que algumas áreas “convergem”, colaboram. Mas há independência entre cada meio. Nesse ponto há alguns exemplos no Brasil, mais por economia, “otimização”, do que por convicção. Integração é diferente. As equipes se integram e produzem em conjunto, independentemente dos meios de distribuição. Ou seja, há uma estratégia de produção única, integrada. Na convergência há várias estratégias simultâneas. Hoje há alguma convergência nos meios brasileiros – a maioria por objetivos de economia – quase sempre privilegiando um meio principal. Mas você precisa procurar com uma lupa muito poderosa onde há integração. O melhor exemplo fica no Rio de Janeiro, na redação integrada da Infoglobo (O Globo, Extra, Expresso e Época).
Como avalia as redes sociais neste cenário?
Redes sociais servem para aumentar a audiência pura, as visitas de qualquer um. Ou seja, nunca se consegue trazer hard-users, os “fieis”, que podem pagar para usufruir do conteúdo do site. As redes trazem esse leitor que visita uma vez na vida o site. Só ajudam a aumentar o número de visitantes, o que pode servir para agradar um anunciante. Mas hoje não se deve apostar nesse público. A Folha de S. Paulo abriu mão do Facebook. Foi um ato de coragem, mas corretíssimo. Cai a audiência, é verdade, mas ficam os fieis, aqueles em quem se deve apostar. Se não houver uma exigência do Comercial, ótima decisão.
É necessário oferecer um diferencial para ser um dos líderes no setor de comunicação. Quais diferenciais você acredita serem indispensáveis para que isso venha ocorrer?
Diferencial é aquilo que você consegue oferecer – e seus concorrentes não. Para as grandes empresas do Brasil, o diferencial é a reportagem exclusiva e o grupo de colunistas, opinionistas. Já em uma empresa regional é ter o melhor conteúdo confiável da própria região. E os analistas locais.
Você foi responsável pela reformulação de jornais na Colômbia, Venezuela, Ucrânia, Portugal, Argentina, México, Equador e Itália. O que liga esses países citados e o Brasil onde você também foi responsável por reformulações?
Os desafios das empresas de comunicação no mundo inteiro são parecidos, é momento de mudança do modelo de negócios, tempo de novas estratégias editoriais dos meios. O que liga todas as empresas do mundo é a dificuldade que os líderes têm em assumir que podem não ser os líderes das novas empresas. Há muito conservadorismo, medo, revolta por “não pertencer ao novo mundo”. Bobagem. Bons jornalistas são necessários em qualquer plataforma e em todos os momentos.
Quais os melhores exemplos do que você acredita ser um jornalismo de qualidade no impresso?
Há ótimos jornais no mundo: The New York Times e The Washington Post nos Estados Unidos, La Repubblica na Itália, Expresso em Portugal, por exemplo. No Brasil não assino nenhum, até porque moro no Sul onde os jornalões chegam tarde. Por isso tenho dificuldade em opinar. Mas o Valor Econômico, por exemplo, é um excelente jornal de papel, consegue transmitir o que pretende. Verdade que o modelo de um jornal “fechado”, com a hierarquização de conteúdos determinada, em que o leitor não consegue determinar o ritmo de leitura e a profundidade, está em desuso.
E no digital?
É difícil apontar os melhores. Operações puramente digitais como Vox.com e Vice.com são ótimas. Mas a democracia digital permite que cada um escolha a sua preferência.
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