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Estima e educação na visão de Mariana Chiavini

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A Aldeias Infantis SOS é uma organização humanitária internacional, presente em 135 países, que no Brasil trabalha há 50 anos em comunidades vulneráveis pelo país, defendendo o direito de crianças e jovens. Oferecem alternativas de cuidado, fortalecem famílias e comunidades e promovem melhorias em políticas públicas para que nenhuma criança cresça sozinha. Presente em 12 estados e no Distrito Federal, trabalham com mais de 6 mil crianças e suas famílias, desenvolvendo projetos com foco em cultura, educação, esporte, lazer e empregabilidade, contribuindo para a quebra do ciclo de pobreza e violência. A organização tem como gestora de Parcerias e Sustentabilidade, Mariana Chiavini, executiva formada em Publicidade, Propaganda e Marketing pela Universidade Mackenzie, São Paulo e pós-graduada em Comunicação na Universidade da Califórnia, em Berkeley (EUA). A gestora afirma: “Os obstáculos que enfrentamos no Brasil são comuns às organizações que atuam no terceiro setor. Lidamos diariamente com cenários de desigualdade social que criam um abismo no país, um dos mais desiguais do mundo, e inserem cada vez mais indivíduos em situações de vulnerabilidade e risco, algo que impacta a sociedade como um todo. Nosso principal desafio nesse sentido é cobrir as lacunas deixadas por políticas públicas que negligenciam crianças e jovens em situação vulnerável”.

Nos fale do seu começo de carreira.

Sou formada em Publicidade, Propaganda e Marketing pela Universidade Mackenzie, São Paulo. Após a faculdade fiz pós-graduação em Comunicação na Universidade da Califórnia, em Berkeley (EUA) e em seguida fui trabalhar na Espanha, em um hotel de luxo da rede internacional The Ritz-Carlton Hotel Company. Depois de cinco anos gerenciando a área de comunicação do hotel, voltei para o Brasil, para trabalhar no Grupo Doria na produção de fóruns e seminários internacionais, para os membros do LIDE, Grupo de Líderes Empresariais. Neste período em que atuava como diretora de produção da empresa, eu era responsável por organizar grandes eventos para uma média de 500 pessoas, com palestrantes como Bill Clinton, Tony Blair, Arnold Schwarzenegger, James Cameron, Al Gore e outros. No Grupo Doria organizei as primeiras edições do Fórum Mundial de Sustentabilidade, em Manaus, onde conheci projetos sociais incríveis e assim comecei a me interessar pelo terceiro setor. Na mesma época conheci a Aldeias Infantis SOS. Me apaixonei pelo trabalho da organização e me ofereci para atuar como voluntária, o que se transformou em uma oportunidade profissional, na qual acabei assumindo a área de Parcerias Estratégicas e Sustentabilidade da organização, onde estou até hoje, já há cinco anos.

Como você enxergava o trabalho humanitário de uma forma geral antes de trabalhar na Aldeias Infantis SOS?

Até 2010 eu tinha pouco conhecimento sobre o terceiro setor. Desde criança, sempre tive necessidade de ajudar pessoas, especialmente aquelas em situação vulnerável, mas não sabia como. Acabava realizando algumas ações assistencialistas e sem grande envolvimento com causa alguma. Mas existia dentro de mim um desejo de fazer mais. Quando comecei a organizar o Fórum Mundial de Sustentabilidade, conheci projetos humanitários incríveis do Brasil e de outros países, e passei a me interessar mais sobre o assunto. Assim, em 2012 conheci o trabalho da Aldeias Infantis SOS e por meio dela, outras organizações que também realizam trabalhos de grande impacto social.

Em que momento se deu a sua entrada na Aldeias Infantil SOS?

Durante o tempo que trabalhei no Grupo Doria, organizava o Fórum Mundial de Sustentabilidade, em Manaus, onde conheci projetos sociais incríveis e assim comecei a me interessar pelo terceiro setor. Na mesma época conheci a Aldeias Infantis SOS, por meio de um amigo que atuava na organização como membro do conselho diretor. Me apaixonei pelo trabalho da organização. Naquela época já me questionava demais sobre o meu trabalho com eventos, que além de ser extremamente estressante, não gerava impacto social. Por isso sentia que precisava de uma mudança. Pulsava dentro de mim uma vontade (desde criança) de trabalhar com algo que fizesse a diferença na vida das pessoas, especialmente as que vivem em situação vulnerável, e assim, depois de muita reflexão, criei coragem de deixar um trabalho estável e muito bem remunerado para buscar algo que me inspirasse de verdade, mas na época ainda não sabia o que seria. Decidi tirar um tempo sabático para pensar sobre meu futuro profissional e quando tomei a decisão comentei com meu amigo que gostaria de atuar como voluntária na Aldeias Infantis SOS durante aquele período. Naquela época a organização estava estruturando uma área de captação de recursos no Brasil, para garantir a sua sustentabilidade no país, que deixaria de receber financiamento internacional. Eles buscavam uma pessoa com o meu perfil para assumir a área de relacionamento com empresas. Foi uma total sincronicidade!

Quais são os diferenciais que você acredita que a organização transmite em seu trabalho?

O principal diferencial da Aldeias Infantis SOS é a promoção de ações que garantam a crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social o direito a viver em família. Acreditamos no poder dos vínculos familiares e comunitários. Por isso, desejamos que nenhuma criança cresça sozinha. Nosso trabalho, focado em políticas de fortalecimento e representação social, busca assegurar às crianças e jovens a convivência em um ambiente familiar e comunitário protetor, que contribua para o seu pleno desenvolvimento.

Também acreditamos na possibilidade de superação de cenários adversos, por meio do fortalecimento da autoestima, da educação e do cuidado. As crianças devem sentir que são capazes de conquistar o mundo e participar ativamente como cidadãos na construção da sociedade do futuro. Quem sabe uma sociedade mais justa e igualitária. Por isso, um dos pilares da organização é o fortalecimento de vínculos. Isso faz com que a organização atue não apenas no acolhimento, mas também no âmbito mais essencial do desenvolvimento de uma criança: a sua família.

Como a palavra Sustentabilidade é vista na organização, sendo que você é gestora de Parcerias e Sustentabilidade?

A Aldeias Infantis SOS, em suas parcerias, buscar ser a ponte para empresas e governos acessarem e desenvolverem a base da pirâmide, de uma forma em que todos ganham. No caso das empresas, por exemplo, através destas parcerias, a empresa ganha porque este processo de desenvolvimento econômico e social é fundamental para seu negócio, ao inserir novos consumidores na economia formal. A organização também ganha porque cumpre a sua missão de garantir os Direitos Humanos. E as pessoas que participam dos programas realizados por meio destas parcerias deixam de viver em situação de risco, passam a ter seus direitos assegurados e a desfrutar de uma vida mais digna e feliz. As crianças podem voltar a ser crianças, crescer em família e viver momentos de infância feliz. Ou seja, parcerias assim, em que todos são beneficiados, é como a organização entende a palavra Sustentabilidade.

Para Aldeias Infantis SOS, a Sustentabilidade é uma ferramenta para pensarmos de maneira inovadora e criarmos projetos e parcerias que sejam autossuficientes, para que possam gerar impacto de longo prazo e ganhar escala. Além disso, a Sustentabilidade também está dentro da organização, por meio da mobilização de equipes capacitadas para atuar em diferentes âmbitos e desenvolver ideias que contribuam para a sua evolução.

Quais são as maiores dificuldades encontradas pela organização aqui no Brasil?

Os obstáculos que enfrentamos no Brasil são comuns às organizações que atuam no terceiro setor. Lidamos diariamente com cenários de desigualdade social que criam um abismo no país, um dos mais desiguais do mundo, e inserem cada vez mais indivíduos em situações de vulnerabilidade e risco, algo que impacta a sociedade como um todo. Nosso principal desafio nesse sentido é cobrir as lacunas deixadas por políticas públicas que negligenciam crianças e jovens em situação vulnerável. Quando falamos em organizações humanitárias, muitas vezes acreditamos que o principal obstáculo está na sustentabilidade da captação de recursos. Em nossa visão, o grande desafio que superamos todos os dias é o da vigilância e cobrança para mudanças nas políticas públicas que garantam os direitos das crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social.

Em que pontos uma organização humanitária não pode falhar em sua missão?

O papel de uma organização humanitária é atuar onde os limites do poder público falham. É entender também que estas falhas não são uma responsabilidade apenas do poder público, mas também do setor privado e da sociedade civil. Assim, a missão de uma organização que luta para assegurar Direitos Humanos, é olhar para aqueles que estão à margem da sociedade e trazer novos horizontes para as suas vidas, levando esta realidade para a parte da sociedade que pode contribuir para a promoção de mudanças. Outro ponto importante é que organizações humanitárias jamais podem falhar no caráter humano. Não devemos perder o olhar de empatia com o outro, seja ele quem for, ainda que o cotidiano imponha obstáculos. Trabalhamos para que o impacto de nosso contato com as crianças e jovens seja mais profundo e duradouro, por meio da criação de autoestima e do empoderamento pessoal, para que possam ser sujeitos de suas próprias vidas.

Como se coloca na mente das crianças o desejo de serem protagonistas da transformação de suas vidas?

O desejo de desenvolvimento pessoal e transformação por parte das crianças pode ser estimulado de diferentes maneiras. Uma delas é a conscientização de que somos todos os humanos e podemos, por meio do esforço e da determinação, conquistar aquilo que desejamos. A autoestima e a educação são as palavras-chave nesse caso. Educação para que as crianças se sintam capazes de transcender as barreiras sociais que as cercam e se sentirem parte da sociedade, quebrando o ciclo de vulnerabilidade enfrentado por seus pais. Autoestima para acreditar que tudo na vida pode ser transitório e que o futuro é uma tela em branco. Obviamente, não se trata de estimular a crença de que o esforço trará necessariamente a solução para todos os problemas que serão enfrentados. Mas de mostrar às crianças e jovens que a situação em que se encontram no momento não deve ser uma gaiola para aprisioná-las.

Em sua visão, qual o papel da família para a introdução das crianças no mundo que as cercam e que muitas vezes não é nada “cor de rosa?”.

A família, na verdade, é o primeiro contato da criança com o mundo. É ela que acolhe, nutre e ensina. Vejo a família como o núcleo principal do desenvolvimento infantil, porque é por meio dela que se transmite valores primordiais às crianças. A forma como os pais criam seus filhos, principalmente nos primeiros anos de vida, quando tudo é novo e o aprendizado é constante, tem impacto na formação do caráter e no comportamento, que perduram até a vida adulta. Acredito que a família deva estimular o desenvolvimento das crianças preparando-as para o mundo como ele é. Isso significa estimular a autoconfiança e as conquistas, respeitando a sua personalidade e os seus desejos pessoais, porém, sem perder de vista que os obstáculos sempre virão. É importante também preparar as crianças para lidar com a frustração e desenvolver resiliência, para que não caiam em um ciclo negativo diante das dificuldades.

Como vê o tratamento dado pela mídia e pelo Governo, quando toca nos principais pilares em que a organização Aldeias Infantis SOS têm desenvolvido o seu trabalho?

A mídia parece estar consciente dos desafios enfrentados pelas organizações humanitárias no Brasil. Porém, acredito que os bons exemplos também devam virar notícia. Temos muitas histórias de superação que provam o impacto positivo de nosso trabalho na vida das crianças e jovens. Às vezes, diante do cenário desafiador em que o país se encontra, podemos cair em um ciclo de resignação e pessimismo. Devemos apontar as causas do problema e pensar em como melhorá-lo. Mais do que isso, devemos mostrar o que tem dado certo e colocar a discussão na agenda pública. Nas ruas e na esfera governamental, vemos pessoas se mobilizando para criar novas políticas e projetos. Porém, ainda há muito a melhorar e é essencial encontrarmos formas de superar a inércia do Governo, tanto em ações efetivas para minimizar a negligência de crianças e jovens vulneráveis, quanto na garantia de direitos já estabelecidos.

Gostaria que comentasse sobre o Impacta ODS.

O Impacta ODS é um programa pioneiro de educação e disseminação dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (Organização das Nações Unidas), agenda de metas para a humanidade até 2030. Entre esses objetivos estão a promoção de uma educação de qualidade, erradicação da pobreza e maior colaboração entre as instituições. Para aproximarmos esses objetivos sustentáveis da sociedade civil, por meio das empresas e instituições de ensino, nos aliamos ao Instituto Mauricio de Sousa, ao Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável – CEBDS, à Rede Brasil do Pacto Global ONU e Global Reporting Initiative – GRI. São 18 gibis da Turma da Mônica e um conteúdo interativo digital educativo (EaD) sobre como realizar ações efetivas para alcançar essas metas.

Este projeto é ferramenta para as empresas e instituições de ensino cumprirem seu papel na conscientização das pessoas, sobre questões importantes para o futuro. As empresas e escolas que aderirem à iniciativa irão formar os seus funcionários e professores sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, e por meio deles, formar os seus filhos e alunos. Além disso, ao participar do programa, a empresa contribui para os programas da Aldeias Infantis SOS Brasil, que impactam oito dos 17 ODS.

Em suma, esperamos com este projeto que as crianças e adolescentes, que são os protagonistas das transformações que desejamos até 2030, se sintam parte de um futuro mais igualitário, e que desenvolvam a consciência sobre a nossa responsabilidade neste processo de desenvolvimento sustentável do planeta.


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