Filho de argentinos e criado na Argentina, o economista Fabio Giambiagi é um dos principais especialistas em finanças públicas do país. Giambiagi é graduado pela Faculdade de Economia e Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e mestre em Ciências Econômicas pela UFRJ. Ele integra o Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade e o Departamento Econômico do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Giambiagi foi o coordenador do Grupo de Análise Conjuntural do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), mas saiu da instituição quando esta era presidida por Márcio Pochmann, no Governo Lula. Ele já escreveu livros em colaboração com Armando Castelar (Rompendo o Marasmo – a Retomada do Desenvolvimento no Brasil), Roberto Zentgraf (O Futuro É Hoje – Educação Financeira para Não-Economistas), Márcio Garcia (Risco e Regulação) e Ana Cláudia Além (Finanças Públicas – Teoria e Prática no Brasil). “Sou defensor das teses liberais e a maioria dos meus amigos liberais são contra o financiamento público, mas eu sou a favor, mesmo ciente dos problemas, no sentido de que é a base não para acabar com a corrupção e sim para mitigar minimamente a dependência dos partidos em relação ao poder econômico. (…) Eu digo que a política de aumento do salário mínimo é de alguma forma vítima do seu próprio sucesso”, afirma o economista.
O senhor afirmou que o próximo presidente vai lidar com um cenário político e econômico mais complexo. Essa situação é irreversível?
O que quis dizer é que nos anos de 2015 a 2018 assistiremos provavelmente a uma elevação continuada das taxas de juros internacionais, o que certamente reduzirá a margem de manobra do Brasil. É nesse sentido que me referi a um quadro mais complexo e sim, não vejo como isso possa ser revertido.
Por que é tão difícil executar soluções que poderiam alavancar um crescimento maior da nossa economia?
Tenho dito que para encarar a solução dos problemas precisamos de um conjunto de cinco atributos: i) Diagnóstico (não se fazem reformas sem saber aonde se vai e por quê); ii) Convicção (é preciso convencer os outros e a base para isso é estar convencido de que algo é necessário); iii) Energia (há reformas necessárias, mas que demandam uma enorme capacidade de quem assumir essas bandeiras se jogar na defesa delas); iv) Persuasão (o que eu chamo de “explicar, explicar e explicar”) e v) Articulação (essencial num Brasil politicamente muito fragmentado no Parlamento).
O senhor disse que podemos atingir um padrão de país de primeiro mundo em 2022, mas é preciso fazer reformas. Qual a principal reforma que o país deveria fazer neste momento, se é que existe a principal?
Aquele livro foi escrito há 2 ou 3 anos (Finanças Públicas-Teoria e Prática no Brasil) e de lá para cá o quadro se tornou mais restritivo, porque o fenômeno do baixo crescimento se tornou mais evidente. O ponto principal que é preciso martelar é que o Brasil é um país com baixa produtividade e que finda a “fase fácil” do aumento do PIB com base no emprego da população inicialmente desempregada, agora começa a fase mais difícil do aumento da produtividade. Não consigo dissociar disso da adoção de incentivos adequados, que passam pela criação de um quadro de maior competição e luta tenaz pela eficiência.
Muitos economistas que já entrevistamos são quase unânimes em dizer que o Estado funcional mal. Para o senhor o Estado é deficiente?
O maior frasista brasileiro é o ex-deputado Delfim Netto. Eu não tenho um milésimo da criatividade dele, mas uma frase eu gostaria de emplacar. Eu digo sempre que no Brasil o problema do Estado é que o Executivo não executa, o Legislativo não legisla e a Justiça não julga.
A economia em 2013 cresceu apenas 1,3%. Existe alguma “armadilha” se é que podemos dizer assim, que é responsável por esse baixo crescimento?
Na verdade deve ter crescido um pouco mais, ligeiramente acima de 2 %, mas de qualquer forma é um crescimento baixo. O ponto principal é que o crescimento da produtividade é baixo. E produtividade baixa se resolve com mais competição. O empregado, a empresa, os indivíduos em geral têm que perceber que mais eficiência, melhorias da competitividade, mais estudo, mais inovação, etc., são essenciais para ir pra frente, que temos que deixar para trás a etapa do Estado propulsor para a época de um crescimento baseado na superação dos limites, dos indivíduos e das empresas.
Em 2050, teremos três vez mais idosos do que temos hoje no país. Isso será um problema para a economia?
Não pode ser qualificado propriamente como um problema o fato das pessoas viverem mais. É sim um imenso desafio, para o qual o país não está se preparando adequadamente.
O senhor afirmou que não há garantias de que o país estará em condições de crescer 5% ao ano nos próximos 30 anos. A sua análise continua a mesma, ou mudou em algum ponto?
Hoje eu diria o seguinte: tenho certeza absoluta de que não há hipótese de crescermos 5% ao ano durante 30 anos.
Você é sem dúvida nenhuma um dos maiores especialistas em finanças públicas do país. Com essa bagagem, acredita que o financiamento público de campanhas é uma boa saída para se combater a corrupção?
Nesse particular tenho uma opinião muito particular. Sou defensor das teses liberais e a maioria dos meus amigos liberais são contra o financiamento público, mas eu sou a favor, mesmo ciente dos problemas, no sentido de que é a base não para acabar com a corrupção e sim para mitigar minimamente a dependência dos partidos em relação ao poder econômico. Esclareço, porém, que também sou a favor do financiamento das empresas, como estabelecido na legislação atual que o Supremo está discutindo estes dias.
Nos cite uma medida impopular que o senhor considera primordial neste momento para a economia nacional.
A revisão da regra do salário mínimo, revisão essa com a qual temos um encontro marcado em 2015, mas que dificilmente será tratada na campanha eleitoral.
Por que a política do salário mínimo deve ser revista?
Eu digo que a política de aumento do salário mínimo é de alguma forma vítima do seu próprio sucesso. Ela fazia sentido quando o salário mínimo valia US$ 65, como em 1994. Hoje, quando vale US$ 300, creio que deveríamos identificar outras prioridades, como por exemplo o financiamento da saúde.
Um sindicalista da CUT (Central Única dos Trabalhadores), disse que o senhor é cruel, mas é convincente. Essa percepção da crueldade, não seria porque o senhor diz o que muitos não gostariam que fosse dito?
Isso foi uma brincadeira da minha parte, baseada num fato real. Há anos, eu estava num evento e após eu falar o sindicalista em questão começou seu discurso com as seguintes palavras: “Estou impressionado com a crueldade do professor Giambiagi. O que me deixou preocupado, porém, é que ele foi convincente”. Digo que considero isso o maior elogio profissional que recebi em 30 anos de carreira. Não pela crueldade, é claro, e sim pelo convencimento. Na verdade, o que a frase demonstra é apenas a escassez de ideias de uma parte do sindicalismo, que se aferra a bandeiras ideológicas completamente vazias e é incapaz de discutir as questões com um mínimo de realismo. Por que ele considerou que eu era cruel? Porque defendi “absurdos” como uma mudança das regras de aposentadoria com 20 ou 30 anos de transição, uma redução da diferença entre requisitos de idade para homens e mulheres na base de 1 ano a cada 5 anos, uma extensão do tempo requerido para quem se aposenta por idade para 25 anos depois de 2030, etc., ou seja, todas questões inteiramente defensáveis, palatáveis e sensatas, ele simplesmente não sabia o que contrapor. O discurso dele era como uma confissão: “Não gostei, mas não sei por quê”. Precisamos avançar e deixar atrás a cegueira ideológica e a retórica vazia.
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