Maria Alexandra Vasconcellos é presidente do Grupo Ejesa, dona dos jornais “Brasil Econômico”, “Marca Brasil”, “Meia Hora” e o “O DIA”. Para alguns ela é considerada a nova Niomar Muniz Sodré [ex-controladora do falecido jornal Correio da Manhã]; para outros ela é a nova Condessa Pereira Carneiro [a lendária manda-chuva do Jornal do Brasil], mas a empresária diz não estar preocupada com esses rótulos. Maria Alexandra Vasconcellos, é casada com o poderoso empresário português Nuno Vasconcellos, dono do grupo Ongoing, do qual faz parte a Ejesa. Ele também controla empresas de mídia, telecomunicações, tecnologia, imobiliário e serviços financeiros. Recentemente, o grupo comprou o portal IG, um dos gigantes da internet brasileira. “Eu acredito que as publicações impressas não deixarão de existir. Pelo menos por enquanto. Há um caminho longo a ser trilhado antes da abolição dos impressos. Em alguns países, realmente, a circulação de jornais e revistas está caindo rapidamente. Mas, num país como o Brasil, que tem dezenas de milhões de novos consumidores entrando no mercado, acredito que a informação de qualidade continuará sendo um produto muito valioso. (…) Na Ejesa, procuramos sempre contratar jornalistas diplomados. Acreditamos sim que a faculdade dá a base que o jornalista precisa para depois se desenvolver na prática”, afirma a executiva.
Muitos dizem que a senhora se tornará em breve, a mulher mais poderosa da mídia brasileira, uma mistura de Niomar Muniz Sodré com Condessa Pereira Carneiro. Alimenta essa ambição?
São duas mulheres e jornalistas importantes para a história do Rio de Janeiro e do Brasil, fico honrada por ser comparada a elas. Porém, são tempos e realidades diferentes. Niomar Muniz Sodré teve um papel importantíssimo na época da ditadura com a campanha a favor dos direitos dos presos políticos. Comandar um jornal em plena ditadura e contestá-la é uma atitude corajosa e louvável. Já a Condessa Pereira Carneiro, revolucionou o Jornal do Brasil após a morte do marido, o conde Pereira Carneiro, transformando o veículo na década de 50 em um modelo de jornalismo moderno. Infelizmente, ambos acabaram fechados ou transformados em exclusivamente online. Com certeza é uma perda para a história da comunicação brasileira e da cidade do Rio de Janeiro. Não alimento essa ambição de ser a mulher mais poderosa da mídia brasileira, quero apenas fazer meu trabalho com ética e excelência. Investir na qualidade dos jornais da Ejesa – “Brasil Econômico”, “Marca Brasil”, “Meia Hora” e “O DIA” -, tornando-os cada vez mais veículos de referência e credibilidade.
Mino Carta disse que a bagagem cultural e intelectual dos jornalistas brasileiros é medíocre se compararmos com os europeus. A senhora que vive entre o eixo Portugal/Brasil tem a mesma visão?
Estudei no Brasil até meus 15 anos no Colégio Santa Marcelina, no Rio de Janeiro, que é uma das melhores escolas brasileiras. Quando me mudei para Portugal não tive nenhum problema para acompanhar as aulas. Fui muito bem preparada pela escola brasileira. Porém, sei que a realidade atual da escola pública brasileira é diferente. Ainda é preciso investir muito para dar acesso a uma educação de qualidade para todos no país. A bagagem cultural e intelectual de uma pessoa não é formada apenas por sua educação familiar e escolar, mas também por sua vivência e olhar de curiosidade para todo e qualquer acontecimento, seja no campo cultural, histórico, político-econômico. Não acredito que a bagagem cultural e intelectual dos jornalistas brasileiros seja medíocre. Mas infelizmente, sabemos que no Brasil em geral ainda há uma defasagem muito grande no acesso à informação, no incentivo à cultura e na simples leitura de um livro ou jornal. O estudo “Retratos da Leitura no Brasil” de 2010, por exemplo, mostra que apenas 55% dos brasileiros leem, ou seja, 95 milhões de pessoas. Um número muito baixo comparado aos 190 milhões de brasileiros.
A senhora é contra ou a favor da obrigatoriedade do diploma de jornalista para o exercício da profissão?
Na Ejesa, procuramos sempre contratar jornalistas diplomados. Acreditamos sim que a faculdade dá a base que o jornalista precisa para depois se desenvolver na prática. Muito do conhecimento adquirido no ensino superior, as amizades e as trocas de ideias entre seus pares, são fundamentais na formação e na direção que seguirá o profissional. O contato com as teorias da comunicação, política, economia, ética e filosofia permitem ao estudante ampliar sua visão sobre a área e entender melhor o papel do jornalismo, seus deveres e obrigações. Mas acredito que só a faculdade não forma o profissional. É preciso a união de diversos fatores: o estudo, o conhecimento, a bagagem cultural e intelectual, a vontade de crescer, a ética entre outras tantas características importantes.
O que um dono de um grande grupo de comunicação precisa para sobreviver no mercado e resistir às tentações e aos achaques do poder político e econômico?
Os donos dos grupos de comunicação não podem sofrer nenhum tipo de pressão política e econômica, esses são princípios fundamentais para a liberdade de expressão. Prestamos um trabalho para a sociedade, que é informar, não podemos manipular as informações, ou deixar de informar um fato por pressão externa, nem interna. O principal bem que os jornais têm é a sua credibilidade. Trabalhamos com informação, portanto credibilidade e ética são fundamentais para manter viva a liberdade de imprensa.
Muitos acusam os grupos RBS, Folha da Manhã, Organizações Globo, Editora Abril e Estado de terem formado um oligopólio na mídia nacional. A senhora concorda com essa afirmação?
Não diria oligopólios, mas sabe-se que no Brasil, a imprensa é formada de grandes grupos familiares. A chegada da Ejesa balançou um pouco as estruturas ao fazer investimentos no setor como há muito tempo não se via. A formação de oligopólio é prejudicial para a população e à liberdade de imprensa, primeiro pela concentração dos veículos nas mãos de poucos grupos de mídia, segundo pela massificação das informações, que acabam muito parecidas, por seguirem o padrão da organização que pertence.
Recentemente uma das maiores publicações do planeta, o britânico “The Guardian”, afirmou que irá priorizar o online. A senhora acredita que estamos caminhando para o fim dos jornais impressos?
Eu acredito que as publicações impressas não deixarão de existir. Pelo menos por enquanto. Há um caminho longo a ser trilhado antes da abolição dos impressos. Em alguns países, realmente, a circulação de jornais e revistas está caindo rapidamente. Mas, num país como o Brasil, que tem dezenas de milhões de novos consumidores entrando no mercado, acredito que a informação de qualidade continuará sendo um produto muito valioso. E temos total consciência de que grande parte desses novos milhões de consumidores não vão consumir informação no papel. Mas, independentemente da plataforma que utilizamos, somos uma empresa jornalística. Nosso negócio é gerar conteúdo de qualidade, com rigor jornalístico e credibilidade para ser distribuído nas melhores plataformas para os leitores, não importa qual seja. A plataforma online facilita imensamente o acesso às notícias, o que tende a aumentar o consumo dos veículos de comunicação. Por isso, investimos pesado em novas plataformas digitais para distribuir nossos conteúdos. Em São Paulo, no Brasil Econômico, as duas plataformas já produzem conteúdos no mesmo ambiente. A nova sede no Rio vai reforçar essa experiência. As pessoas sempre vão querer e precisar de informação. Estamos preparados para produzir e entregar informação onde, quando e como elas quiserem. A Ejesa é uma empresa de conteúdo jornalístico independentemente do canal que é utilizado para a leitura.
O jornal “Meia-Hora” do grupo que a senhora dirige é visto pelos críticos como popularesco e sensacionalista, enfim, um desserviço ao jornalismo, praticamente um novo “Notícias Populares”. A senhora se irrita com essa afirmação?
Preocupo-me apenas com o que o público leitor do “Meia Hora” acha da publicação. Usamos as publicações da Ejesa para levar a notícia de interesse para nossos diversos leitores e comunicamos com a linguagem que cada um mais se identifica. A tiragem é em média 187 mil exemplares diárias do jornal (IVC) e o retorno que temos de nossos leitores já é a resposta do “Meia Hora” para quem acredita que o veículo é um desserviço.
Nós temos ainda um número baixo de leitores, comparando a nossa nação com outros países de menor porte populacional, como a Argentina e o Chile por exemplo. O que a senhora considera ser o fator-chave para que isso venha a mudar?
O Brasil vive um bom momento econômico, apesar da crise mundial, e nossa expectativa é que esse crescimento seja impulsionado ainda mais com a Copa do Mundo (2014) e as Olimpíadas (2016). Uma conseqüência desse bom momento econômico é o crescimento da renda do brasileiro. Segundo a Fundação Getúlio Vargas (FGV), do início de 2003 até maio de 2011, 48,7 milhões de pessoas entraram nas classes A, B e C no Brasil, quase a população da Espanha. Além disso, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nestes últimos 10 anos, dobrou o número de brasileiros que frequentam cursos superiores. Esses são fatores que costumam contribuir para o crescimento no número de leitores de jornais. Num país como o Brasil, que tem dezenas de milhões de novos consumidores entrando no mercado, acredito que a informação de qualidade continuará sendo um produto muito valioso. E, como disse anteriormente, temos total consciência de que grande parte desses novos milhões de consumidores não vai consumir informação no papel. Por isso, investimos pesado em novas plataformas digitais para distribuir nossos conteúdos.
A senhora acredita que o grupo Ejesa sofre perseguição do Ministério Público Federal por ter a ousadia de enfrentar o ‘Status quo’ da comunicação?
A Ejesa cumpre a legislação brasileira no que diz respeito ao limite da participação de grupos estrangeiros em empresas de comunicação. A empresa já demonstrou isso ao Ministério Publico, que, após um cuidadoso procedimento de mais um ano, recomendou o arquivamento do caso. Muito me admira que num país como o Brasil, que acaba de eleger a primeira presidente mulher, ainda se questione a competência e o poder de gestão das mulheres. Eu sou dona da Ejesa e presidente do conselho de administração e tenho muito claro para onde quero levar os jornais que publicamos. E se tem algo que um bom gestor sabe bem é que uma empresa, qualquer que seja, não é feita de uma só pessoa. É feita de várias pessoas. No nosso caso, além de mim, a Ejesa é composta por uma equipe de administradores e de jornalistas altamente competentes e qualificados, que procuram constantemente por inovações, que levem aos nossos leitores as formas mais modernas de leitura além do melhor conteúdo de negócios, de informações gerais e de esporte.
Como está vendo os primeiros meses do Governo da presidenta Dilma Rousseff?
Tenho muito esperança de que a primeira mulher do Governo Brasileiro, mostrará ao país e ao mundo o poder e a competência que temos para gerir uma empresa ou um país. A presidente Dilma Rousseff herdou um ótimo cenário econômico, com bons indicadores de emprego e renda da população. Recebeu ainda um país que virou o foco do mundo com a realização dos dois maiores espetáculos esportivos do planeta (Copa e Olimpíadas). Ou seja, Dilma recebeu um Brasil dentro de um contexto inicial bastante diferenciado em comparação a seus antecessores. Em geral, podemos dizer que o balanço desses primeiros meses de Governo é bastante positivo. A presidente imprimiu um jeito próprio de governar. Conseguiu mostrar personalidade na hora de governar o país e descolar de seu padrinho político Luiz Inácio Lula da Silva. Dilma adotou também uma mudança da postura do Brasil em relações internacionais, como no caso do Irã e vem encarando com pulso firme os escândalos de tráfico de influência e de corrupção em parte de seus Ministérios. Sabe-se, claro, que o cenário mundial não é dos mais promissores. As crises em todas as grandes economias mundiais estão trazendo insegurança para a população em geral e podem refletir no Brasil. Por isso, a presidente tem a frente enormes desafios relacionados a política econômica, taxas de juros e de câmbio entre outros. Mas acredito sim que o Brasil está preparando para enfrentar a situação e principalmente que a presidente Dilma tem em suas mãos as ferramentas necessárias para fazer um grande Governo. Basta continuar firme em suas convicções.
A senhora se cobra muito para levar os jornais “Brasil Econômico” e “O DIA” à liderança em seus respectivos mercados?
Cobro-me para levar um produto de qualidade ao meu leitor. É claro que quero que meus jornais cheguem à liderança e trabalho muito para isso. A liderança será a conseqüência de trabalho permanente de qualificação dos nossos jornais e investimento na nossa equipe de profissionais, em tecnologia e crescimento da economia.
Por que os veículos de comunicação no Brasil não dizem para os seus leitores quais são as suas preferências no campo político, como fez o jornal “O Estado de S.Paulo”, apoiando na eleição passada o candidato do PSDB José Serra?
O papel da mídia é informar. A mídia precisa ser um lugar de debate, de fomento de opiniões diversas. O jornalismo não deve ser partidário.
O grupo Ejesa pretende ter um canal de televisão em rede aberta para disputar com Record, Globo, SBT e Band a preferência dos telespectadores?
Neste momento a Ejesa está focada em seus produtos. Em 2011, O DIA mudou-se para uma nova sede, que possibilitou a integração entre a redação impressa e online; o jornal Marca.BR passou a se chamar Marca Brasil, pois mantêm uma maior integração com o Marca da Espanha. Estamos focando nos produtos existentes. Investimos em dispositivos móveis para o Brasil Econômico, com o lançamento da versão para iPad e iPhone. A empresa estuda frequentemente novas oportunidades, mas no momento não há novos projetos definidos.
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