Arquiteto, urbanista, professor e designer, Igor de Vetyemy, é o atual diretor do maior curso de Arquitetura e Urbanismo do Brasil, na Universidade Estácio de Sá, coordenando ainda a área de economias criativas da Universidade (que engloba 15 cursos da área de Design, Arquitetura, Comunicação e Artes). Considerado um dos expoentes da arquitetura de vanguarda contemporânea brasileira, representou o país, juntamente com Paulo Mendes da Rocha e outros, no Festival de Arquitetura de Londres, em 2008. Em 2012, de Vetyemy foi premiado pelo Instituto de Arquitetos da Holanda (NAi) pelo seu projeto Downtown Amsterdam, underground canal houses. Desde 2011, o arquiteto colabora com o escritório Mecanoo architecten, primeiro presencialmente e, a partir de 2013, como parceiro local no Brasil. No livro “Exhibit Design: The Future”, o crítico norte-americano Georges Jacob descreve de Vetyemy como um “defensor da arquitetura bioclimática que trabalha com uma perspectiva que ressalta o caráter emocional da arquitetura”. Com um foco na arquitetura sustentável e outro na pesquisa formal de espaços, a obra do arquiteto busca sempre surpreender os sentidos. “A arquitetura não é feita apenas de paredes, portas, pisos, janelas e telhados. Ela agencia o espaço e tudo que o compõe. Os sons, os cheiros, a temperatura, o conforto… Ela envolve, quando bem resolvida, todos os sentidos de uma pessoa.”
Igor, existiu algum ponto crucial e especial em sua vida, que fez você decidir trilhar seu caminho profissional pelo mundo da arquitetura e do design?
Venho de uma família de arquitetos (pai e avó, sou a terceira geração), então o exemplo veio de casa, foi uma coisa natural.
Você ainda é muito jovem, mas mesmo assim, é visto por grandes nomes, como um dos expoentes da arquitetura de vanguarda contemporânea brasileira. Como tem encarado esta afirmação?
Acho que essa percepção não é nem deve ser minha, é papel de quem analisa de fora, então procuro não dar muita atenção e seguir fazendo o que gosto e sei fazer. De alguma forma, claro que incentiva a seguir no caminho que vamos traçando, dá uma certa validação ao percurso, por isso encaro de uma forma positiva, mas tentando evitar que isso afete a vontade de melhorar, inovar e evoluir sempre.
O crítico norte-americano Georges Jacob, disse que você ressalta o caráter emocional da arquitetura. Na sua visão, o que seria esse caráter emocional da arquitetura?
A arquitetura não é feita apenas de paredes, portas, pisos, janelas e telhados. Ela agencia o espaço e tudo que o compõe. Os sons, os cheiros, a temperatura, o conforto… Ela envolve, quando bem resolvida, todos os sentidos de uma pessoa, altera seu humor, suas sensações e emoções. Por isso transformar um espaço em um lugar é uma tarefa tão delicada que precisa de muito mais do que técnica. Precisa de uma compreensão poética daquele determinado contexto, com aquele programa, para aquele usuário, com aquele conceito. E é isso tudo, holisticamente trabalhado, que compõe esse tal caráter emocional, do qual fala Jacob.
Atualmente é possível pensar numa arquitetura que não seja sustentável, ou a maioria dos projetos terão que ter essa visão de sustentabilidade?
Hoje é ponto pacífico que a sustentabilidade não pode ser tratada como qualquer coisa além do requisito básico, pontapé inicial para qualquer projeto. É totalmente compreensível que o mundo modernista, num contexto de descobrimento das máquinas, entendesse o meio ambiente como algo a ser adestrado, subjugado pela força do homem; mas hoje, com as informações claras e escancaradas do quão grande é o quinhão da construção civil para a insustentabilidade do nosso modelo atual de sociedade, não faz mais o menor sentido se propôr qualquer arquitetura que contribua para perpetuar esse modelo obviamente falido.
Como enxerga o planejamento urbano das cidades brasileiras?
Apesar de grandes contribuições que urbanistas brasileiros já deram à discussão da cidade contemporânea, o poder de influência que grandes grupos econômicos exercem sobre a construção das nossas cidades nos coloca sempre um passo atrás do pensamento de vanguarda nessa área. Os experimentos já consagrados do grande urbanista Jaime Lerner em Curitiba, bem como as recentes transformações que o prefeito Fernando Haddad está colocando em prática em São Paulo, começando a reverter a lógica da cidade exclusiva e introspectiva, além da (territorialmente) tímida transformação que o Rio começa a passar na mobilidade urbana da região central, configuram bons sopros de esperança em meio aos nossos conglomerados urbanos caóticos que ainda não conseguiram se livrar da lógica do automóvel como protagonista das cidades. Elas deveriam, precisavam (precisam!) ser adaptadas para as pessoas e não mais para as máquinas.
O seu trabalho de conclusão de curso chamado “Cidade do Sexo”, foi polêmico na época. Por que você acredita, que o assunto sexo ainda é visto como um grande tabu?
Esse é um tabu que não faz o menor sentido, um assunto que deveria ser tratado da maneira mais natural possível, sem o qual nenhum de nós estaria sequer aqui, simplesmente. E no Brasil, país onde a sensualidade e a sexualidade afloram na cultura das praias e do carnaval, essa contradição se torna ainda mais explícita e contra-producente. Ao invés de aproveitarmos essa identidade para nos tornar uma sociedade com uma boa cultura sexual, educação e pesquisa de ponta, ficamos apenas lidando com o lado moralista e com as coisas negativas, como a exploração sexual e a prostituição infantil. Esse era justamente todo o sentido daquele projeto, colocar o dedo na ferida e fazer a sociedade discutir o assunto, o que aconteceu, bastante, pelo menos naquele momento. E essa discussão da identidade de uma cidade também é papel do arquiteto e urbanista, por isso aquele processo foi tão gratificante.
Em 2001, você teve o privilégio de estudar com o gênio Oscar Niemeyer. Como foi essa experiência?
Foi uma experiência incrível, que expandiu muito a minha percepção da arquitetura. Visitávamos suas obras com ele contando histórias do processo de projeto e construção que aparentemente não tinham nada a ver com a arquitetura em si, mas que, ao mesmo tempo, era o que dava sentido a tudo. O grande mestre Oscar definitivamente tinha o poder da oratória. E o processo de ensino-aprendizagem de algo tão subjetivo quanto o fazer projetual tem essa mágica escondida nos detalhes, que dependem muito do poder de persuasão, como dizia Nietzsche: “Quanto mais abstrata for a verdade que queres ensinar, mais tens que seduzir os sentimentos a seu favor”. E isso Niemeyer sabia fazer como ninguém, me plantando essa semente do que virou hoje a minha maior área de atuação: a educação, ponto tão primordial em um país como o nosso.
Existiu ou ainda existe alguma ideia que o “Grupo Garage” (fundado por você com seus colegas de faculdade) teve que não saiu do papel, mas que você poderia dizer que seria revolucionária de algum modo?
As ideias do Grupo Garage não tinham tanto o objetivo de serem construídas, elas faziam parte de um processo muito mais reflexivo e de construção daquilo que viríamos a estabelecer como visão da arquitetura na carreira de cada um de nós nos anos seguintes. Uma discussão em particular, que semeei preliminarmente ali, à época, e anos depois cheguei a desenvolver como projeto acadêmico quando estava cursando meu mestrado na Holanda, era uma ciclovia e pista de caminhada embaixo da ponte Rio-Niterói, “parasitando” a estrutura da própria ponte. Ainda sou apaixonado por essa ideia, que até já ganhou outras versões, de outros arquitetos (acredito que pelo seu caráter nevrálgico na mobilidade urbana da região). Seria uma proposta que além de extremamente poética, capaz de explorar um cenário deslumbrante, transformaria de maneira muito simples e direta o calvário atual dos motoristas e passageiros de ônibus engarrafados em um passeio lúdico e saudável tanto para as pessoas quanto para as duas cidades.
Você é coordenador de área para os cursos da Indústria Criativa da Universidade Estácio de Sá. Como enxerga o momento da Indústria Criativa em nosso país, e o que fazer para que essa indústria tenha ainda mais pujança no PIB nacional?
Com o recente desenvolvimento exponencial de tecnologias “inteligentes”, a Indústria Criativa se torna a cada vez mais o mercado mais estratégico para a economia das cidades. O papel do ser humano que a máquina não pode substituir já não é mais a capacidade de raciocinar e sim a de raciocinar criativamente, de maneira a promover a necessária inovação constante nas relações que compõem a sociedade. Por isso o investimento na área e uma maior participação dos profissionais da indústria criativa na discussão de um projeto de país é tão essencial hoje.
Por que você acredita que conseguiu reconhecer e traduzir com mais franqueza a realidade do nosso país, em uma arquitetura menos romântica como bem disse o crítico britânico Richard J. Williams?
Acho que tudo faz parte do esforço essencial de buscar mais a fundo o significado intrínseco de cada dado coletado na hora de definir qualquer decisão projetual. A arquitetura e suas consequências têm um alcance muito maior do que um olhar distraído, descompromissado pode nem sequer imaginar. Ela envolve a sociedade e sua cultura, seus costumes, as especificidades locais, o contexto econômico e político, o momento histórico, enfim, uma infinidade de variáveis que muito comumente são tratadas como periféricas, mas que precisam permear o fazer arquitetônico do início ao fim, em toda a sua essência.
Goethe dizia que a arquitetura é a música petrificada. E para você, o que é a arquitetura?
A arquitetura é – ou deveria ser – a materialização dialética de todos os anseios de uma sociedade, dentro de um contexto específico, ao mesmo tempo, em que é ferramenta primordial para a transformação e evolução desse mesmo contexto e da própria sociedade em si.
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