Considerado um dos compositores mais brilhantes do nosso país, além de também ser cantor e ator, o carioca Jards Anet da Silva, mais conhecido como Jards Macalé, começou a carreira profissional em 1965, como violonista no Grupo Opinião. Fez direção musical dos primeiros espetáculos de Maria Bethânia. Teve composições gravadas por Elisete Cardoso e Nara Leão. Com Gal Costa, Paulinho da Viola e o parceiro José Carlos Capinam, criou a agência Tropicarte, para administrar os próprios espetáculos. Macalé é autor de canções como “Vapor Barato”, “Anjo Exterminado”, “Mal Secreto”, “Movimento dos Barcos”, “Rua Real Grandeza”, “Alteza”, “Hotel das Estrelas” e “Poema da Rosa”. Teve como parceiros o próprio Capinam, Waly Salomão, Torquato Neto, Naná Vasconcelos, Xico Chaves, Jorge Mautner, Gláuber Rocha e ainda Abel Silva, Vinicius de Morais e Fausto Nilo. Em 1976, se tornou parceiro de Moreira da Silva no samba de breque “Tira os óculos e recolhe o homem”. Em 2013 participou do evento Canções do Exílio, onde declarou ser anarquista. “Na rádio Nacional estava a melhor programação radiofônica do Brasil e, talvez, do mundo. O melhor da música, do humor, das radionovelas, da informação jornalística, numa dinâmica fantástica. (…) Estávamos sob uma ditadura e a não concordância com este regime nos uniu. Naquele momento tratávamos da Carta dos Direitos Humanos”, afirma o compositor.
Jards, as palavras usadas para definir você são várias: gênio, maldito, incompreendido, anárquico, incontrolável, atrapalhador (no bom sentido) da música brasileira e inovador. O que acha de todas essas definições?
É uma necessidade de rotular as pessoas considerando que elas não tenham a sensibilidade de olhar pra mim como simplesmente um músico, um artista que tenta viver a aventura da criação. Vai ver sou isto tudo ao mesmo tempo!
Sua formação musical se deu na década de 50 e 60, quando a rádio Nacional estava no auge. Como foi isso?
Na rádio Nacional estava a melhor programação radiofônica do Brasil e, talvez, do mundo. O melhor da música, do humor, das radionovelas, da informação jornalística, numa dinâmica fantástica. O elenco musical da rádio era formidável e é impossível falar de todos que me influenciaram. Em especial diria que a Orquestra Tabajara de Severino Araújo [músico, compositor, maestro e clarinetista pernambucano, 1917 – 2012] me marcou para sempre com suas orquestrações formidáveis, e solistas extraordinários.
Suas primeiras lembranças musicais, oriundas da sua vó que era afinadíssima; da sua mãe com uma facilidade natural de tocar piano sem nunca ter estudado; e do seu pai que o levava para os concertos de ópera do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, lhe deixaram quais marcas?
A liberdade de transitar em todas as formas de música sem fronteiras e limites, anulando o que se colocava como diferença entre “erudito” e “popular”.
Você é o produtor de “Transa”, um dos discos mais cultuados do cantor Caetano Veloso e que também é considerado um dos 100 maiores discos da história da música brasileira. Qual a lembrança mais incrível que você tem desse momento quando estava trabalhando nesse álbum?
Não sou produtor de “Transa”, mas sim diretor musical. A grande lembrança é o de fazer música brasileira em território estrangeiro.
Uma das perguntas mais feitas para você em entrevistas, é sobre o show Banquete dos Mendingos de 1974 na cinemateca do MAM-RJ (Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro) que reuniu pesos pesados da música nacional. Hoje seria possível reunir tantos músicos talentosos de uma só vez?
Depende da motivação que teriam. Estávamos sob uma ditadura e a não concordância com este regime nos uniu. Naquele momento tratávamos da Carta dos Direitos Humanos.
Qual parte da música brasileira que está careta e qual a parte que não está neste momento?
Difícil dizer. O mundo mudou, e o que chamam de “caretice”, isto é, música palatável, tomou os meios de comunicação. Tudo o que é experimentação foi para o “underground” de novo. Qualquer mudança tornou-se difícil como sempre foi.
Como vê as novas tecnologias para a divulgação da música?
Tornam menos restritivas as experimentações. Qualquer pessoa pode colocar sua produção a vista. A internet, por exemplo, divulga e distribui em escala planetária. Resta separar o joio do trigo: o que pode ser bom para alguns pode não ser bom para outros.
Acredita que as pessoas de modo geral, têm a real noção do peso do seu trabalho artístico que engloba tantas áreas como cinema, poesia, teatro, artes plásticas, televisão, shows e gravações?
Talvez algumas pessoas atentem a isso. Tento colaborar com todas as expressões artísticas que tocam minha sensibilidade.
Você participou do festival Psicodália em janeiro último. Aquela ansiedade de estar no palco depois de 35 anos de carreira ainda persiste ou a arte de dominar o “frio na barriga” já está mais que domada?
O palco é onde me sinto como se estivesse em minha própria casa.
Qual o maior equívoco e a maior verdade que as pessoas cometem quando falam da vida e da obra de Jards Macalé?
Quando dão a mim e a alguns colegas a alcunha de “maldito” entre outros adjetivos desabonadores. Na verdade, a verdade é quando me chamam de músico. Esta é a verdade verdadeira.
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