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Juliana Cardoso na luta pelos Direitos Humanos

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Juliana Cardoso é uma educadora, ativista dos movimentos sociais/sindicais e vereadora eleita pelo Partido dos Trabalhadores em São Paulo. É considerada uma referência na defesa dos Direitos Humanos e, por sua atuação nessa área, foi homenageada em 2017. Presidiu a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal de São Paulo. De origem indígena, nasceu em Sapopemba, periferia da capital paulista, onde iniciou sua militância nas Comunidades Eclesiais de Base, ligada à Igreja Católica. Já fez parte da São Paulo Turismo, com formação profissional e cultural dos jovens através da organização do carnaval paulistano. Eleita vereadora em 2008, foi reeleita em 2012. Em 2016, com 34 mil votos, foi reconduzida à Câmara Municipal de São Paulo, sendo a única mulher eleita pelo PT. Sua atuação na militância e na legislatura é em defesa dos direitos da criança e do adolescente, da mulher, da saúde, da moradia e da cultura popular. Foi relatora da lei n.º 15.945, que criou o Programa Centro de Parto Normal – Casa de Parto e a lei n.º 15.248, que criou o Conselho Municipal dos Povos Indígenas. É de sua autoria o projeto que tem objetivo de permitir o aleitamento materno em creches. Fundou o Prêmio Heleieth Saffioti, uma homenagem a quem se destacou pelos direitos das mulheres em São Paulo. “O grande desafio do PT e das esquerdas é aglutinar todas as forças democráticas e progressistas”, afirma.

Juliana, o que mudou de fato na política desde a sua primeira eleição como vereadora em 2008?

Quando fui eleita em 2008 a conjuntura política nacional e internacional era bastante diferente. Apesar da crise econômica que surgiu naquele ano, o Brasil governado pelo presidente Lula vivia uma era de pleno emprego com crescimento econômico e distribuição de renda. As políticas públicas para os menos favorecidos estavam em andamento como o Luz para Todos, valorização do salário mínimo, programa habitacional “Minha Casa, Minha Vida” e tantos outros benefícios que tiraram mais de 30 milhões de pessoas da miséria e outras tantas outras milhares de famílias subindo para o patamar da classe média.

No plano municipal, apesar de oposição ao prefeito Kassab, a radicalização política e ideológica não era tão evidente como é hoje. As arbitrariedades contra o povo de rua, por exemplo, não eram tão flagrantes. É verdade. Os coronéis nas subprefeituras não eram tão propensos a aprofundar o diálogo. No entanto, junto com os movimentos de saúde, de moradia e de direitos humanos, conseguimos conter vários retrocessos nessa época.

A imagem do político está arranhada ou em sua visão isso é um caminho natural com os acontecimentos dos últimos anos?

Sim, a imagem dos políticos está bastante desgastada com a população. Mas o pior é que essa construção da negação da política como forma de organização da sociedade representa um grande retrocesso. Muito dessa avaliação negativa se deve aos ataques sistemáticos e avassaladores da grande mídia aos políticos. É claro, que todos devem combater privilégios e falcatruas. Só que a mesma mídia não critica com tanta contundência os privilégios do poder Judiciário ou dos militares, por exemplo. Essa construção da negação da política resulta na descrença nos partidos como forma de organização republicana na vida política. Essa negação dá margem para as pessoas que se dizem não políticas se aventurarem. A meu ver, não há saída e nem avanços sem a política.

Como mudar esse paradigma?

Não é uma tarefa fácil mudar esse paradigma e construir de novo a esperança popular em dias melhores e a crença numa sociedade mais fraterna e justa. Estamos numa era em que o presidente Bolsonaro declarou que veio para desconstruir. Que veio para destruir o Estado de bem-estar social conquistado ao longo da história com muita luta, muito suor e sangue. As pessoas têm que despertar para a política e não virar as costas e se negar a votar, apesar deste ser um Direito Constitucional. As pessoas têm que ter a disposição para ver como a Câmara Municipal funciona, ver afinal para que ela serve. Esse interesse coletivo só vai acontecer se for resultado de um grande movimento coletivo.

Qual a sua principal pauta como vereadora em São Paulo?

Os principais eixos do nosso mandato são o fortalecimento da Saúde Pública e do SUS (Sistema Único de Saúde), a defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes, os Direitos Humanos e das minorias como fator de desenvolvimento por uma sociedade mais igualitária, o respeito a igualdade de gênero, as causas feministas, o fomento à cultura popular, a luta por mais verbas para projetos de moradia digna, principalmente para famílias de baixa renda. Todas essas causas são próprias dos movimentos sociais organizados. Nessas três legislaturas, nosso mandato se consolidou como instrumento de luta dos movimentos em suas bandeiras históricas. São bandeiras que remontam as reformas de outras décadas como a reforma agrária e a urbana.

Conseguiu êxito em algum ponto daquilo que estabeleceu como pauta principal?

Nas ações institucionais tivemos várias frustrações, mas também conseguimos várias vitórias. Destaco aqui a luta pelos partos humanizados, com vários projetos de lei aprovados na Câmara Municipal como a criação das casas de parto, parto domiciliar, reconhecimento dos cargos de obstetrizes na rede municipal, aleitamento materno nas creches e outras iniciativas em conjunto com o movimento pelos partos respeitosos e contra a epidemia de cesáreas. Como descendente da etnia Terena do Mato Grosso, tenho orgulho também de ter sido aprovado a criação do Conselho Indígena na cidade de São Paulo. Uma das frustrações foi ter sido aprovado (mas depois vetado) o projeto de lei que dá conhecimento aos usuários do SUS, do seu lugar na fila para consultas com médicos especialistas e para cirurgias eletivas.

Que caminho a esquerda deve trilhar neste momento caso queira novamente alcançar o poder máximo da nação?

O grande desafio do PT e das esquerdas é aglutinar todas as forças democráticas e progressistas para defender um projeto de soberania nacional. O caminho é continuar a defender os interesses populares, os direitos trabalhistas e sociais que não estão mais sendo ameaçados, mas sumariamente retirados. A prioridade é a defesa de um projeto de interesse nacional nesta época de entreguismo das nossas riquezas como o petróleo do pré-sal ou a entrega da base estratégica de Alcântara no Maranhão para controle dos EUA.

Como o PT está situado nesta conjuntura?

O PT nasceu da junção do movimento sindical, dos militantes da Igreja Católica, dos artistas e intelectuais e das forças que fizeram a resistência ao golpe de 1964. O partido nasceu na luta pela redemocratização do país, na volta das eleições diretas e como instrumento próprio de luta dos trabalhadores. Ao alcançar a presidência com Lula em 2003, o modo petista de governar não decepcionou. Houve avanços nunca antes visto na história do Brasil. Tanto que embora esteja preso injustamente, Lula é reconhecido em pesquisas como o melhor presidente da história do Brasil. Na atual conjuntura, o PT deve estar ainda mais próximo dos movimentos sociais para organizar a resistência a esse Governo autoritário e de medidas malucas. O partido deve voltar as suas origens promovendo sistematicamente atividades de formação política. Nesses anos todos, a crítica interna do PT que se faz com razão, é que no Governo formamos consumidores, mas não conseguimos formar cidadãos para o exercício político.

A democracia está correndo riscos como é dito por alguns políticos de renome nacional?

A democracia está sendo ferida a cada dia pelos atuais governantes e, principalmente, pelo poder judiciário. Lula foi condenado sem provas, por uma sentença de que é culpado por “atos indeterminados”. Ora. Essa tese não tem respaldo jurídico e nenhum país democrático como prova. A democracia só voltará a ser plena no Brasil quando Lula for absolvido. Há muitas outras arbitrariedades cometidas contra os interesses populares. Estamos numa barbárie. Ao vermos o governador Witzel do Rio de Janeiro sobrevoar de helicóptero comunidades pobres de Angra dos Reis com policiais armados e matarem oito pessoas como podemos chamar isso. É ou não extermínio nas redes sociais? É ou não é a pena de morte em vigência?

Você afirmou que em São Paulo não faltavam recursos e sim gestão pública. Isso ainda persiste?

Não faltam recursos orçamentários para justificar os cortes da gestão Bruno Covas nas áreas de assistência social e da saúde como ele fez por decreto em fevereiro. Nos últimos dois anos a arrecadação de tributos registrou crescimento de 12,5%. No ano passado, apesar da gestão a toda hora se desculpar por crise financeira, o aumento de arrecadação foi de 5%. Então, essa obsessão por cortes está alinhada com a política econômica do Governo Federal que promove medidas para ajuste fiscal.

Como enxerga a Reforma da Previdência proposta pelo Governo Bolsonaro?

Primeiro um esclarecimento importante. O termo reforma não é adequado ao que se pretende fazer com a Previdência, que é a destruição do sistema de seguridade social que vem desde a época de Getúlio Vargas. A propaganda do Governo é que a reforma é necessária para fazer o Brasil voltar a crescer. É o remédio para todos os problemas econômicos e sociais. No entanto, essa “reforma” não combate os privilégios do Judiciário e dos militares que se aposentam antes e recebendo benefícios bem maiores que os trabalhadores, hoje na faixa de R$ 1.300,00. O Governo também não cobra a dívida das grandes empresas e bancos que é de R$ 470 bilhões. O Governo não taxa as grandes fortunas. E não tributa os lucros e juros do grande capital. Quem vai pagar a conta são os trabalhadores. O Brasil precisa de uma política econômica para criar empregos registrados em carteira e com contribuição ao INSS. O déficit não é da Previdência, mas da dívida pública com os grandes bancos. Essa reforma é de uma maldade sem tamanho. Querem implantar a capitalização, que são contas individuais para cada trabalhador sacar mensalmente quando se aposentar. Querem acabar com o sistema de repartição. Isso não deu certo em vários países. O Chile hoje registra recordes de suicídio de idosos tal a miséria que recebem como aposentados.

Que papel caberá aos movimentos sociais em um país que está altamente polarizado?

Os movimentos sociais organizados têm papel fundamental na luta pelo retorno do Brasil a sua era de prosperidade para todos e não só para poucos privilegiados. O país pagou no ano passado somente de juros da dívida pública aos credores, principalmente os grandes bancos R$ 380 bilhões. São recursos que fazem falta na saúde, na educação, em serviços básicos. Os recursos para pagar os juros não vão nem para setores produtivos que geram milhares de empregos. Vivemos a era da usura. E isso tem que ter um ponto final. Agora, o Governo Bolsonaro está retirando verbas das universidades federais e de hospitais. Está levando o país à beira do caos social. O país hoje está polarizado. Desde as manifestações de 2013 cresceu o contingente de pessoas que acreditam e consideram a meritocracia o supra sumo da existência. Que nega a política e atacam os direitos sociais! No pensamento são conservadores e na política econômica são liberais, com o Estado abrindo mão de políticas públicas de proteção social. É o Deus mercado acima de tudo. Neste contexto, cabem aos movimentos sociais ocupar seu lugar na história como instrumento de luta e de transformação social para devolver ao povo a esperança de dias melhores e de uma sociedade menos desigual e fraterna.


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