Jum Nakao é designer, diretor de criação e estilista brasileiro com ascendência japonesa. Vive na cidade de São Paulo onde se localiza seu ateliê. Inicialmente Nakao cursou artes plásticas na FAAP, mas não concluiu o curso por não ter feito as matérias de licenciatura, então fez cursos voltados para a moda no CIT (Centro Industrial Têxtil), na década de 90 atuou na Carmim e desligou-se da grife especialmente para se dedicar ao evento Phytoervas Fashion, um desfile, que serviu de vitrine para suas criações. Após isso foi contratado para atuar como gerente de criação na Zoomp. O estilista teve uma grande relevância com a coleção “A Costura do Invisível”. Em 2004, a coleção “A Costura do Invisível” foi apresentada na São Paulo Fashion Week. Todas as etapas do processo foram compiladas e foi gerado um DVD e um livro, ao qual ambos são denominados “A Costura do Invisível”. Foi reconhecido como um dos maiores do século pelo Museu de Moda da França. A apresentação do Brasil no encerramento das Olimpíadas de Londres 2012, também leva sua assinatura. Além do Brasil, Nakao já teve seus trabalhos expostos em outras partes do mundo. Em um trecho da entrevista exclusiva ao portal Panorama Mercantil, o renomado estilista fala sobre “Pílulas”, um dos seus projetos: ““Pílulas” tem o intuito de romper barreiras, rasgar impossibilidades e conferir poder às pessoas. Fazer com que a intuição seja resgatada e aflore a potência individual”.
Jum, o que é ser um estilista em sua visão pessoal?
Analogamente às fadas e magos das fábulas, através da magia da moda, o estilista transforma sonhos em realidade, cria príncipes, princesas, heróis e heroínas. Os ingredientes não são animais, insetos, ou plantas exóticas. São tecidos, linhas, agulhas, botões e o que for necessário. O principal ingrediente nesta poção de magia são os sonhos das pessoas. Sem o outro, não há encantamento. O estilista existe, simplesmente porque a magia acontece, no outro. Isto se aplica a tudo na vida. Tem gente que faz roupa, produto, marca, comida, texto, infoprodutos, eletrônico e todo tipo de bugiganga. Sem a anima, do outro, tudo é morto. A anima é o sopro de vida e está nos olhos de quem vê. Faço moda para ver o brilho da anima do outro.
Em que momento você acredita que conseguiu colocar a sua personalidade em suas criações?
A minha personalidade, a real personalidade, chamo de amor. Aprendi que existe apenas um amor verdadeiro: o amor ao próximo. O resto é vaidade, cobiça, ganância. Você pode buscar forças na vaidade, cobiça e ganância. São fortes fatores motivacionais. Assim como os temores. Um dia você não encontrará mais potência nestes fundamentos. E descobrirá um vazio e que tudo foi uma ilusão. Uma personalidade vazia. O verdadeiro alimento é o amor. Sempre estará com você.
Coloco amor em tudo o que faço, porque o agora, o que faço, é tudo o que temos. Neste meu agora não cabe o que a vaidade, a cobiça ou o que a ganância me propõe acumular. Nem os males dos temores do que poderia me suceder. Cabe apenas eu depositar todo o amor possível neste momento. O amor ao próximo. E é assim que me coloco em minhas criações.
Nesse caminho existiram dores?
A existência se resume em existir em um único instante. O intervalo é uma ilusão. Dor é a resistência à transformação, ao ganho de consciência. Decidi evoluir, e o caminho foi esse aprendizado, com paradas ao longo da jornada para ganhar consciência e poder prosseguir sempre com fluidez. Somos todos pequenos mundos individuais dentro de um universo composto de individualidades. E dentro desta galáxia, o melhor que você pode fazer é iluminar o outro. Para isto é necessário procurar sempre a luz e fugir do limbo.
Você já levou às passarelas, modelos vestidas com roupas de papel. Quando a ousadia deve ser o norte de um criador?
Ousado ou tímido são características da personalidade da pessoa. O norte de um criador é servir o próximo. Um criador existe para servir e não para ser servido. A conduta de um criador é ter a sensibilidade em perceber o vazio do outro e a coragem de se sacrificar para preencher este vazio. Criar é um ato de coragem.
Como as observações externas interferem na condução do seu ofício?
As observações afetam o criador, a criatura, o processo, o meio e o fim. Um ciclo que renasce e recomeça, graças a rega do olhar do observador, que são as águas da vida do meu ofício.
Somente através do olhar do observador é que tenho o contato com a potência transformadora da minha obra. A obra é apenas o meio, a ferramenta, o meio de transporte. Aonde a obra desagua, transporta o observador, é o que me importa. Este vislumbre através do olhar e o universo revelado pela janela da alma do observador é o que realmente me capta. E dia após dia procuro construir estas pontes, sem o observador sou como um cego sem tato, olfato, sentido algum. É o observador que literalmente confere sentido, sentimento, à obra.
Essas observações já lhe fizeram mudar de rota alguma vez?
Sempre. Todos os instantes da minha vida. Quando você se coloca à serviço do observador, você traçará a rota de acordo com as marés da íris do observador. Se sacrificará para fazer com que ele veja. Você se torna o cartógrafo mais colaborativo, maleável e infinito do universo. Naturalmente cada mapa não contemplará todos os navegadores, mas àqueles com afinidades de valores no oceano banhado por aquele olhar.
Você é um artista completo na concepção da palavra. Em que momentos a sua arte lhe salvou?
Todos os momentos. Sou salvo de mim mesmo graças a minha arte. Somos salvos de nós mesmos quando temos um propósito. O meu é mudar o mundo! Como é uma tarefa longa, é a minha salvação eterna!
Glauber Rocha afirmou que a arte deve “violentar”. Você já sentiu que fez algo nesse sentido em sua trajetória?
No sentido glauberiano, sim. O rasgo do desfile de papel expôs todas as vísceras do desejo. Uma violentação do invisível.
“Pílulas” tem esse intuito?
“Pílulas” tem o intuito de romper barreiras, rasgar impossibilidades e conferir poder às pessoas. Fazer com que a intuição seja resgatada e aflore a potência individual. “Pílulas” surgiu como resposta a inanição criativa que o mundo padece, de indivíduos formatados pelo sistema como espectadores da espetacularização da vida e procrastinadores da realização de seus sonhos. “Pílulas” é um projeto de mãos na massa, vidas em obras e de libertação. Não ensino fórmulas, ensino a lógica. O sopro da vida.
O que as pessoas ainda não sabem sobre você (e sobre o seu ofício) e que você gostaria que elas soubessem?
Sou um “Zé Ninguém”, um nada como qualquer um. Apenas compartilho tudo o que recebo, nada mais sou do que um bom devolvedor. Simples assim.
A Moda é mais que estar na moda. É muito mais íntimo do que aparência. O que se veste é muito mais do que um corpo. São verdades pessoais. Desejos e anseios que se expressam através de símbolos sobre nossa pele. Toda existência merece respeito. São os universos pessoais que formam o infinito de nossa existência compartilhada. Vaidade, celebridades, likes, curtidas, isto tudo se contabiliza, mas não se conta. A vida não é numerável. Meu ofício é mais que régua ou fórmulas. Sou um costureiro de sonhos.
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