Dani Mattos nasceu e cresceu na cidade de São Paulo. Em sua casa sempre se ouvia música erudita e, principalmente, música popular brasileira; sambas de compositores paulistas (Adoniran Barbosa, Paulo Vanzolini), MPB-4, Chico Buarque, Quinteto Violado, além dos mineiros do Clube da Esquina. Começou a ter aulas de violão aos 9 anos, e ao longo do tempo teve vários professores, dentre eles Dinho Gonçalves, do grupo de chorinho Santa Helena, e Edelton Glöeden, de música erudita. Aos 13 anos frequentou vários grupos de canto coral, primeiro, com sua família e, depois, em grupos semiprofissionais, como o Coral da Aliança Francesa, sob regência da maestrina Mara Campos, de quem foi assistente, e o Coral Farrambamba, da maestrina Naomi Munakata, de quem também foi assistente além de aluna. Como instrumentista, atuou na peça “Na Carreira do Divino”, de Carlos Sofredini. Possui um espaço cultural onde recebe outros grupos vocais, instrumentistas populares, contadores de histórias, etc. Nele, abriga o projeto “Escola de Bambas”, um estudo da história do samba, fundamentado teoricamente por André Domingues, jornalista, e do qual também participa como cantora e violonista, em parceria com o percussionista Paulo Flores (Pixu), por meio de exemplos musicais significativos de cada período estudado. Inicia, assim, sua pesquisa de sambas e canções do país.
Dani, como começou sua paixão pela música?
É daquelas coisas que não sei precisar. Lembro que bem pequena não podia conter minha alegria ao ver qualquer manifestação musical: orquestras, bandas, carnaval, folias entre outras.
Gostaria que você falasse um pouco mais sobre um dos seus interessantes trabalhos que é escrever projetos musicais.
Escrever é uma atividade que sempre me acompanhou. Quando formei meus grupos musicais encontrei o modo de concretizar esses projetos sempre ligados a algum tema ou fato importante para mim, através da música.
Como se vai do samba ao jazz sem perder aquilo que você quer transmitir?
Todas são manifestações musicais e, como tal, representam o sentimento e o pensamento do homem. O que o vasto repertório tem em comum é a inegável qualidade.
Você afirmou que gosta de pesquisar músicas antigas para inseri-las num contexto histórico, para compreender como era a sociedade na época. O que encontrou de mais extraordinário nessas pesquisas, que mudou de certa forma, a sua visão em determinado campo da sua vida?
Conforme minha pesquisa avançava, pude perceber como as canções dos compositores pesquisados conversam entre si. É como se houvesse mesmo um discurso comum entre eles, cada um se atendo a um aspecto, de maneiras diferentes, formando um retrato diverso e colorido da época em questão. É incrível notar como o olhar artístico retrata a época em questão de maneira profunda, bem-humorada, cheia de matizes.
Muitos afirmam que a bossa-nova começou com Dorival Caymmi. Tendo realizado o projeto “Caymmi, As Várias Personas de Um Brasileiro”, tem esta mesma visão ou acrescentaria algo mais, além disso?
Não compartilho dessa opinião. Caymmi era muito ligado ao samba-canção, pela identificação temática harmônica e melódica de suas composições. O que quis mostrar nesse projeto foi a diversidade das composições de Caymmi, do quase folclórico ao extremamente urbano de suas composições. Um artista muito versátil.
Em sua casa ouvia-se música erudita e MPB. O que ficou enraizado em você, depois de ter absorvido esses dois gêneros musicais?
Tudo é música! As manifestações artísticas se dão em contextos diversos e isso as torna tão distintas. Isso me encanta e fascina! Encontro genialidade tanto em Cartola [cantor, compositor, poeta e violonista, considerado por diversos músicos e críticos como o maior sambista da história da música brasileira, 1908 – 1980] como em Debussy [Claude Debussy, músico e compositor francês, 1862 – 1918]. Isso sem falar de compositores como Villa-Lobos [Heitor Villa-Lobos, compositor, 1887 – 1959], que transitava entre vários gêneros brilhantemente e fazia suas pesquisas musicais pelo Brasil afora. Seu trabalho como pesquisador foi importantíssimo e transparece em suas composições. Ele ajudou a cunhar a identidade musical brasileira.
O que é essencial para que um regente se torne bem-sucedido em seu ofício?
Que compreenda as reais características e possibilidades de seu grupo! Que respeite os coralistas acima de tudo e procure sempre desenvolver a musicalidade de todos, independentemente de facilidades e talentos individuais.
E, finalmente, que procure, através das apresentações, levar música de boa qualidade e oferecer experiências significativas musicais ao grupo e aos ouvintes.
Quando a música deve exercer um papel social?
Sempre, mesmo sem querer ela exerce esse papel, seja porque é uma manifestação própria do ser humano, um ser social, seja por reunir as pessoas em torno dela. Ela é um testemunho fiel de seu tempo.
Considera a música um processo inacabável?
A música é resultado de um processo. O fazer musical não acaba nunca. É ilimitado tanto quanto é a imaginação humana.
Como enxerga o mainstream musical e os órgãos midiáticos de grande circulação e escala, que propagam músicas mais palatáveis para o grande público, muitas vezes deixando a qualidade em segundo plano?
Acho muito empobrecedor. Parece até que não temos história. Esses órgãos midiáticos faltam com sua responsabilidade quando agem dessa forma.
Gostaria que falasse um pouco dos trabalhos que vêm realizando atualmente.
Me dedico inteiramente à música. Estou à frente de três grupos musicais para os quais escrevo projetos e arranjos (Toque de Bambas, Dani Mattos Trio e o grupo vocal Poucas e Boas). Além disso, estou sempre em busca de apoiadores para que eles possam se realizar. Sei da importância da arte como transformadora do pensamento, da autoestima, da visibilidade do indivíduo dentro da sociedade.
Também realizo outros projetos como: o sarau poético-musical “Vinícius, o poeta Amador”, que trabalha com a questão da leitura compartilhada; a oficina musical/espetáculo “Villa-Lobos para Todos” apresentado para alunos e educadores buscando mostrar as possibilidades de se trabalhar a música com diversos públicos que não precisam ser especializados em música.
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