Michel Lent é formado em Design Gráfico e mestre em Telecomunicações interativas pela New York University. Pioneiro no mercado digital, começou sua carreira em 1995 na EuroRSCG de Nova York. Participou da startup da Globo.com, liderou o processo de digitalização da DM9DDB e fundou a 10’Minutos Interactive, anos mais tarde comprada pela Ogilvy Brasil. Foi sócio da Pontomobi e mais recentemente, fundou e foi CEO da Pereira & O’Dell Brasil. Professor e palestrante, Lent é membro da Academia Internacional de Artes e Ciências Digitais (IADAS) e foi premiado nos principais festivais mundiais de publicidade, incluindo Cannes, Clio e One Show. Em 2012 foi eleito profissional de comunicação digital do ano pela Associação Brasileira de Propaganda. Em 2013, participou como jurado da categoria mobile no festival Cannes Lions e foi eleito pela revista ProXXIma um dos 50 profissionais mais inovadores do mercado digital. Desde 2009 mantém o Apps4Kids.net, um dos principais blogs do mundo focados em aplicativos para crianças. No final de setembro de 2015, fundou com Liliane Badaró a agência Lent/Ag. Segundo os sócios, a agência quer dar foco aos problemas dos clientes e não em formatos pré-definidos. “Os “nativos” amadureceram e ganharam mais espaço nas tomadas de decisão. Mas o ciclo de substituição das gerações ainda não está completo.”
Michel, de modo geral, as empresas estão sabendo tirar proveito do digital?
Depende do segmento. O varejo certamente já está bem avançado e as frentes de automação de processos e organização também. Mas ainda há espaço, principalmente no que diz respeito à comunicação.
Qual erro pode ser fatal e, qual o acerto pode ser propulsor para quem atua com comunicação digital?
Vivemos a era da transparência absoluta e a comunicação descentralizada. Falar uma coisa e fazer outra não tem mais espaço. A empresa é o que ela é e não o que ela diz ser. Todos percebem isso.
Como enxerga o papel da mídia de massa num ambiente digital?
Desde a popularização da internet no Brasil e o crescimento dos smartphones, somada à onipresença de Google e Facebook, a mídia digital se tornou mídia de massa. Hoje pode alcançar muito mais gente do que a maioria das emissoras de TV aberta. A diferença é que a mídia de massa digital é altamente segmentável e com um ROI (Retorno sobre investimento) muito mais fácil de se aferir.
Em 2011, você afirmou que o mundo era dominado pelo “migrantes” que não têm o DNA digital, portanto, não estão familiarizados com o meio. O que mudou de lá para cá?
Os “nativos” amadureceram e ganharam mais espaço nas tomadas de decisão. Mas o ciclo de substituição das gerações ainda não está completo. Os nativos analógicos hoje ainda habitam o topo das organizações enquanto os verdadeiros digitais ainda estão na infância. O mundo considera os millenials [também conhecida como geração Y. Pessoas nascidas no final da década de 1970 e logo após 1980] como os nativos digitais. Mas os verdadeiros nativos são as crianças de 10, 12 anos para menos. Estes efetivamente nunca viram o mundo de outra forma, sem internet, sem VoD (Vídeo sob Demanda), sem smartphone. O salto dos vovôs para essa geração é assombroso. Ainda vai mudar muito.
Por que a internet mesmo sendo pujante e crescente, ainda ocupa uma fatia pequena do bolo publicitário se comparado com mídias tradicionais como a televisão, por exemplo?
Isso vem mudando rapidamente, mas reflete modelos de negócio estabelecidos no formato antigo mantidos por uma geração que funciona da forma antiga. A crise financeira pela qual estamos atravessando está forçando essa mudança, não por convicção dos envolvidos, mas por falta de dinheiro mesmo. As empresas de mídias tradicionais todas amargam profundas crises sem retorno e mesmo as mais saudáveis, como o Grupo Globo, nunca viu crise semelhante. A má notícia é que não é uma crise conjuntural pelo momento econômico pelo qual o país atravessa. É uma crise estrutural acelerada pela crise conjuntural. Está mudando e nunca mais vai voltar a ser o que era antes. Nunca!
Aqui no Brasil, estamos atrasados, adiantados ou no meio do caminho, quando o assunto é interatividade?
Depende do ângulo. Do ponto de vista do brasileiro e sua curiosidade pela novidade, muito avançados. Somos o número 2 em número de usuários em praticamente todas as plataformas do mundo. Só perdemos geralmente para os EUA que tem, não só uma população maior, mas um percentual de uso muito maior também. Ainda assim ficamos à frente de países com populações muito maiores do que a nossa. O brasileiro adora novidade e usa tudo o que aparece pela frente.
Em uma certa ocasião em meados dos anos 2000, você afirmou que um dos atrativos para quem quer anunciar na internet, é a possibilidade de medir resultados. O que mais você acrescentaria, passados 16 anos desta sua visão?
Continuo firme com essa convicção. E de lá pra cá, só melhorou. Agora além de podermos medir resultados, temos plataformas com alcance massivo e um poder de segmentação extraordinário, somado à inteligência de retargeting (impactar mais de uma vez a mesma pessoa) e geolocalização. E com a viabilização do vídeo e a força das redes sociais, ganhamos poder também para a construção de marcas. É um paraíso. Só não vê quem não quer. [Risos.]
Além de bons conteúdos, o que mais atrai uma marca para ser parceira de um negócio no mundo digital?
Eu ainda separo as marcas e empresas em dois grandes universos: aqueles que fecham negócios online e as que não fecham. Digo ‘ainda’, porque em breve, trazendo o mobile para o jogo, mesmo aquelas que só funcionam no meio físico vão poder se beneficiar do digital através dos telefones. É o que tem se chamado de ‘phygital’. As marcas que fecham seu ciclo de vendas no online se beneficiam de toda a cadeia de inteligência. Mas mesmo aquelas que ainda não fecham o ciclo, têm a possibilidade de acompanhar todo o processo do funil de conversão, desde o awareness [palavra usada para designar o estudo de percepção do consumidor relativa a produtos e, principalmente marcas] até a conversa no mundo digital.
Em entrevistas e matérias realizadas com você, a palavra reinvenção sempre vem à baila. Como ter a clara noção, que está na hora de se reinventar um negócio ou um produto?
Quando você está próximo da gestão e com bons indicadores do negócio, os ponteiros vão te dizer se você está enfrentando um problema sazonal ou estrutural. Independente do tipo de problema, todo problema pequeno ou grande, demanda uma reinvenção, pequena ou grande. ‘Nunca mais as coisas mudarão de forma tão lenta’ é o que temos ouvido por aí e acredito nisso. A reinvenção não deve ser temida. Ela precisa ser desejada. Precisamos encarar a reinvenção como algo tão normal quando respirar.
Qual o principal diferencial que uma agência terá que ter daqui para frente para sobreviver?
São muitas as questões. Começamos por questionar o próprio nome ‘agência’. O que estamos agenciando? Será que a empresa que ocupa este papel hoje em dia, pode ser comparada ao que era uma agência 10 anos atrás? Acredito que não. Por onde o digital passa, as coisas mudam e agora chegou a vez do marketing e da publicidade. As empresas que atuam neste segmento (sejam chamadas do jeito que for) vão precisar olhar 3 frentes: O negócio; A experiência e o conteúdo. O que entendemos até aqui como publicidade ou propaganda, está contido nesta última frente do conteúdo. Acontece que de nada adianta fazer bom conteúdo se o negócio não estiver bem resolvido e se a experiência (atendimento, plataformas digitais, embalagem, etc) não estiverem bem resolvidos. Como disse no começo da entrevista, não adianta falarmos algo diferente do que fazemos. A questão é: quem vai ajudar o cliente e as empresas nas frentes de negócio e experiência. A nova ‘agência’ (vamos chamar assim na falta de um nome melhor) vai precisar encarar estas 3 frentes muito bem. Não é à-toa que temos visto as consultorias de negócio (PWC, Accenture, etc) resolvendo experiência e comprando agências. Eles já solucionam o problema de negócio do cliente. Por que não oferecer a solução completa?
Como a agência Lent/Ag, do qual você é o diretor, pretende continuar sendo diferenciada, valorizada e, ao mesmo tempo, inovadora no mercado?
Por uma coincidência destas da vida, eu me formei em Design. E o Design tem como princípio a solução de problemas. Nunca vivemos uma época onde o Design tem sido tão invocado (principalmente pelas metodologias do Design Thinking). A inovação não é algo que me encanta, porque inovar é só fazer diferente no fim do dia. E diferente é diferente. Só. O que me interessa é resolver os problemas. Acho que as novas agências, consultorias, todos os serviços, em geral, seja a telefonia ou um restaurante, mais do que nunca, estão entrando na era da solução de problemas. E resolver bem um problema é o que vai te manter no jogo, seja ele qual for.
Por ser muito nova (vamos fazer um ano no final do mês de setembro), a Lent/AG ainda vive a liberdade de se reinventar de forma leve. E temos feito isso diariamente. E isso é algo que não queremos perder nunca. A capacidade de nos reinventarmos para entender e atender bem as demandas das pessoas e empresas do mercado é a nossa crença e no que eu acredito para manter a gente sempre no jogo bem jogado. Espero que isso nos mantenha valorizados.
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