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O trabalho atemporal da artista Maria Bonomi

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Maria Bonomi é neta de Giuseppe Martinelli, construtor do primeiro arranha-céu da América Latina, o Edifício Martinelli, datado de 1929. Emigrou para o Brasil em 1946, fixando-se em São Paulo. No início da década de 1950, estudou pintura e desenho com Yolanda Mohalyi e Karl Plattner (1919-1989). Em 1954, inicia-se na gravura, com Lívio Abramo. Realizou sua primeira exposição individual em 1956, na cidade de São Paulo. No mesmo ano, recebe uma bolsa de estudos da Ingram-Merrill Foundation e estuda no Pratt Institute Graphics Center, em Nova York. Paralelamente, na Columbia University, estuda gravura e teoria da arte. De volta ao Brasil, frequenta a oficina de gravura em metal de Johnny Friedlaender (1912-1992), no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM/RJ), em 1959. Em 1960, em São Paulo, funda o Estúdio Gravura, com Lívio Abramo, de quem foi assistente até 1964. A partir dos anos 1970, passa a dedicar-se também à escultura. Produz também grandes painéis para espaços públicos. Em 1999, defende sua tese de doutorado Arte Pública. Sistema Expressivo/Anterioridade, na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Em 2001, foi agraciada com a comenda da Ordem do Rio Branco e, em 25 de outubro de 2010, recebeu a Ordem do Ipiranga, no grau Grande Oficial, pelo Governo do Estado de São Paulo. No Brasil tem participado frequentemente de exposições em São Paulo e no Rio de Janeiro.

Maria, ser considerada uma das maiores artistas do país é um privilégio ou uma responsabilidade?

Certamente não me considero tal coisa nem pretendo… Apenas trabalho com afinco há muitos anos e por ser “sobrevivente” de tanta coisa penso que deve existir algum motivo e o dever de lhe corresponder plenamente. O mistério deve continuar a ser desvendado…

A arte deve ter um papel social?

A Arte é essencialmente social por destino. A Arte é um sistema vivo de conhecimento e transformação livres, que definem o “Homem” em sua essência desde os primórdios.

Em que momento você acredita que a sua arte moveu para um lado mais social?

Caso seja a busca de uma temática militante, quase figurativa, sobretudo alegórica eu diria a partir dos anos 60. Correspondendo ao entorno profundamente envolvida com questões políticas e comportamentais. E depois nunca mais me afastei das metáforas possíveis.

“Favela” e “Paris Rilton” tiveram esse olhar?

Sim, tanto “Favela” por retratar a violência e as carências das comunidades inóspitas, como “Paris Rilton” registrando a frivolidade, indiferença e estupidez alienada de classes privilegiadas. Tudo acontecendo ao mesmo tempo, ao nosso lado… A Arte aqui atuando como denúncia social.

A arte também salva. Em que momento a arte lhe salvou?

A Arte pelo impacto que causa está sempre “salvando” indivíduos, comunidades e claramente buscando a paz. Traz à tona a sensibilidade de cada um (sem discriminação) e revela focos elevados para o espírito e para a materialidade. Pessoalmente sou salva por ela continuamente, simplesmente correspondendo ao “sagrado” de nosso conteúdo humano.

Como as observações externas e as reflexões internas influem em seus trabalhos?

Acolho tudo o que vivo e vejo como tema do meu fazer! Claro que seleciono, até inconscientemente, o que desenvolver ou fixar em imagens. O exterior fabrica um momento interior e assim por diante. Digamos que nesse processo a poética e a práxis se desenvolvem juntamente para o artista.

Outra sensação que temos é que você pensa em seu trabalho como uma escritora. Isso tem algum sentido?

Sim e porque não? O impulso é de fixar uma narrativa urgente de revelar experiências e “descobertas”.

Fale mais sobre isso.

Praticamente a anotação e a escrita fazem parte do meu percurso lado a lado. Tanto assim que realizei nos anos 70 uma série chamada “Como se fossem palavras”, mas eram xilografias…

Por que a senhora acredita que o seu trabalho xilográfico é uma experiência que oferece ilimitadas possibilidades na criação artística?

A xilografia como linguagem expressiva, e não como técnica apenas, oferece sim ilimitadas possibilidades por lidar com infinitos valores (cheios, vazios, escalas diversas, sulcagem direta, sulcagem mecânica, estampas, estruturas vazadas, matrizes verso e reverso etc, etc.) como nenhuma outra linguagem artística. Até hoje aos 85 anos sinto que há um espaço enorme de inovações a realizar e preencher. Considero a gravura um “Eterno Mutante” e me baseio em sua possibilidade de transmissão infinita. (Texto Perene Mutante http://www.mariabonomi.com.br/escritos_decenio_1990.asp). Através do raio laser e meios eletrônicos a xilo é elevada como prática de um idioma artístico que dilata cada vez mais o seu limite em “Campo Expandido”.

Uma palavra muita dita sobre suas obras é paixão. Qual o papel da paixão em sua vida e em sua arte?

Creio que sem paixão nada possa ser realizado “valendo a pena”. Arte e vida são algo único movidos à Paixão. Senão para quê? Principalmente porque a proposta da Arte é exatamente se realizar e lidar com uma verdade pessoal e também a vulnerabilidade no sistema vigente. Agora bem discutido pela pandemia… Sem paixão seria impossível!


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