Oliver Stone é amplamente conhecido por suas narrativas críticas sobre a política e a sociedade, e os filmes “Wall Street: Poder e Cobiça” (1987) e sua sequência “Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme” (2010) são exemplares em sua abordagem ao mundo corporativo e à ganância financeira. Ambos os filmes tratam de questões como poder, ambição e moralidade, ao mesmo tempo, em que exploram as consequências da cultura capitalista de Wall Street. A seguir, veremos como esses filmes examinam a ganância corporativa e o impacto de suas mensagens ao longo de décadas.
Lançado em 1987, “Wall Street: Poder e Cobiça” tornou-se um clássico ao criticar de maneira incisiva o mundo financeiro, capturando o espírito da época no auge do capitalismo desregulado nos Estados Unidos. A trama segue Bud Fox (Charlie Sheen), um jovem corretor ambicioso, fascinado pelo poder e riqueza de Gordon Gekko (Michael Douglas), um investidor implacável que se torna mentor de Bud.
O filme é mais conhecido pela icônica fala de Gekko: “A ganância é boa” (“Greed is good”), que resume o ethos da década de 1980. Stone utiliza Gekko para personificar a ganância corporativa e as consequências devastadoras da busca incessante pelo lucro, exemplificando como essa mentalidade leva à corrupção e à destruição de empresas e vidas. O filme não só destaca o poder sedutor do sucesso financeiro, mas também revela as repercussões éticas e pessoais de se colocar o dinheiro acima de tudo.
Stone, com “Wall Street: Poder e Cobiça”, não apenas retrata a ascensão do anti-herói corporativo, mas também estabelece uma crítica feroz à cultura da ganância, que permeava Wall Street na época.
A frase “Greed is good”, que se tornou a marca registrada do personagem Gordon Gekko, encapsula a visão distorcida que muitos tinham do capitalismo durante os anos 1980. A intenção de Stone era usar Gekko como uma crítica à ganância desenfreada e ao colapso moral no mundo dos negócios, mas ironicamente, muitos espectadores adotaram a frase como uma espécie de mantra para o sucesso.
A dualidade de interpretações do personagem reflete como o carisma e a persuasão de Gekko ofuscam sua verdadeira natureza destrutiva. Ele é admirado por seu sucesso e astúcia, mesmo que esses traços sejam construídos à custa de práticas antiéticas e fraudulentas. Oliver Stone queria que Gekko fosse visto como um vilão, mas o impacto cultural de sua persona, e a aceitação dela como símbolo de sucesso, questiona até que ponto o público realmente absorveu a crítica subjacente.
Essa ambiguidade sobre o que “Greed is good” realmente representa levanta uma questão interessante: será que Stone captou tão bem a ganância corporativa que o próprio vilão acabou sendo celebrado, mesmo que suas ações sejam, moralmente, condenáveis?
A década de 1980 nos Estados Unidos foi marcada por um crescimento econômico deslumbrante, impulsionado por políticas neoliberais de desregulamentação e liberalização dos mercados. Wall Street, como símbolo desse boom financeiro, tornou-se um palco para a ascensão de figuras poderosas que manipulavam o sistema em busca de lucros a qualquer custo. “Wall Street: Poder e Cobiça” captura perfeitamente essa realidade, destacando como a busca incessante por lucro exacerbou a desigualdade social e destruiu valores éticos.
Bud Fox, que inicia o filme com uma visão idealista, é rapidamente seduzido pela promessa de poder e dinheiro oferecida por Gekko, o que o leva a comprometer sua integridade e a prejudicar aqueles que ama. A moralidade fluida da época é representada pela disposição de se “fazer o que for necessário” para subir na hierarquia financeira, não importando os danos colaterais.
Oliver Stone utiliza a trajetória de Bud como um alerta sobre como o sistema financeiro, baseado na ganância, pode corromper até mesmo os mais inocentes e idealistas. O filme denuncia as práticas predatórias de Wall Street, e a ascensão de Gekko é uma representação clara do que o capitalismo sem limites pode gerar: indivíduos dispostos a tudo pelo sucesso.
Mais de duas décadas após o lançamento do primeiro filme, Stone retornou ao mundo financeiro com “Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme”. Lançado em 2010, o filme é ambientado logo após a crise financeira de 2008, e aborda a queda de grandes instituições financeiras e o impacto devastador da especulação descontrolada. Gekko, que no início do filme é um ex-presidiário tentando reconstruir sua vida, retorna com uma perspectiva mais crítica sobre o sistema que o destruiu.
Diferente do Gekko do primeiro filme, aqui ele assume um papel mais reflexivo, tornando-se uma figura que ora critica o capitalismo selvagem que ele outrora encarnava, ora tenta se reintegrar ao mesmo jogo. O filme aborda temas como bolhas financeiras, a desvalorização de ativos e a ganância que levou à crise de 2008, revelando que as práticas corruptas de Wall Street continuam, apesar das consequências catastróficas.
Com “Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme”, Stone adapta sua crítica à ganância corporativa para um novo cenário global, onde a especulação e a falta de responsabilidade financeira atingiram proporções globais, e figuras como Gekko ainda encontram espaço para prosperar.
O arco narrativo de Gordon Gekko em ambos os filmes refletem uma evolução que acompanha as mudanças no cenário econômico mundial. No primeiro filme, Gekko é o símbolo do “tubarão corporativo”, um homem impiedoso e moralmente corrupto que utiliza todos os meios possíveis para maximizar seus ganhos. Sua queda no final de “Wall Street: Poder e Cobiça” é uma espécie de justiça moral.
No entanto, em “Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme”, Gekko retorna com uma nova perspectiva. Ele parece, inicialmente, um homem arrependido, disposto a criticar as falhas do sistema financeiro e a refletir sobre os danos que suas ações causaram. Porém, à medida que o filme avança, fica claro que sua sede por poder e dinheiro continua viva, embora agora mascarada por uma fachada de arrependimento.
Stone constrói Gekko como um personagem complexo, que representa tanto a crítica quanto a perpetuação do ciclo de ganância. Sua capacidade de se adaptar e continuar jogando no mundo das finanças revela o quão profundamente enraizado o comportamento predatório está no capitalismo contemporâneo.
Embora Stone tenha concebido “Wall Street: Poder e Cobiça” como uma crítica à ganância corporativa, o impacto cultural do filme foi irônico. Em vez de servir como um alerta sobre os perigos do capitalismo sem controle, muitos viram Gordon Gekko como um modelo a ser seguido. Em vez de aprender com as advertências de Stone, Wall Street, na realidade, pareceu abraçar a filosofia de Gekko.
A crise financeira de 2008, abordada no segundo filme, é um exemplo claro de como as práticas criticadas por Stone continuaram a prosperar. O comportamento de especulação desenfreada, a falta de regulação e a ganância desmedida levaram à queda de grandes instituições financeiras, confirmando os temores retratados no filme original.
O legado de Wall Street na cultura corporativa é, portanto, ambíguo. Embora a crítica à ganância esteja presente, o carisma de Gekko e sua abordagem implacável ao mundo dos negócios inspiraram muitos a seguir seus passos, ignorando as lições morais que o filme tentou transmitir.
Tanto “Wall Street: Poder e Cobiça” quanto “Wall Street: O Dinheiro Nunca Dorme” são críticas contundentes ao sistema financeiro global e à ganância que o alimenta. Oliver Stone capturou, em ambas as obras, a essência do capitalismo descontrolado, mostrando como a busca incessante por lucro não apenas corrompe indivíduos, mas também causa estragos em sociedades inteiras.
Gordon Gekko, com toda sua ambiguidade, tornou-se um ícone cultural, servindo como símbolo tanto da decadência moral do capitalismo quanto do fascínio que o poder e o dinheiro exercem sobre as pessoas. A capacidade de Stone de retratar esses dilemas morais com profundidade e nuance garante que seus filmes permaneçam relevantes, mesmo décadas após seus lançamentos.
No final, Oliver Stone conseguiu captar a ganância corporativa em toda a sua complexidade, oferecendo uma visão brutal e honesta de um sistema que não apenas permite, mas celebra a ganância. E, embora seu trabalho tenha servido como uma advertência, as crises subsequentes mostraram que sua crítica permanece tão pertinente quanto nunca.
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