Com traços simples e sem textos, o diretor de criação da agência AlmapBBDO André Gola criou um hobby para as horas vagas: transformar situações vividas dentro de uma agência de publicidade em cartoons. Ele diz ter sido influenciado por cartunistas como Saul Steinberg, Jean-Jacques Sempé e pelos roughs de seu amigo e diretor de arte Denis Kakazu. Seus cartoons saíram do papel e foram parar nas redes sociais chamando a atenção daqueles que se identificam com situações cotidianas no mundo da publicidade. Um de seus mais famosos trabalhos, foram cartoons, que se transformaram em vinhetas para as novas Alpargatas Havaianas, cliente da agência na qual trabalha. Nas vinhetas, Gola destacava situações que sublinham características como conforto, diversidade de cores e sola de borracha. Em outubro de 2014, a apArt Private Gallery, exibiu a “First Exhibition” com desenhos do cartunista. A exposição contava com mais de 100 cartoons originais de André, que traduzem em traços simples, os aspectos cotidianos da vida, do dia a dia, dos dilemas, dos sentimentos e do processo criativo. “A criação e a arte me chamaram atenção desde pequeno. Sempre gostei muito de desenhar. Preferia no colégio as aulas de Artes à Educação Física (aula preferida de todo moleque). Isso porque eu me destacava nelas. (…) Eu acho que a arte sempre tem um papel social, mesmo quando ela parece ser puramente estética”, afirma o cartunista.
André, como se deu o começo de sua carreira?
Inicialmente, gostaria de ter feito Desenho Industrial. Mas optei por Arquitetura por achar que era um curso com um mercado de trabalho mais amplo. Prestei, então, arquitetura no Mackenzie e na FAAP assim que saí do colégio. Não entrei. Eu não queria de jeito nenhum passar um ano inteiro fazendo cursinho e, um dia, estava passando perto do Shopping Ibirapuera quando vi uma faixa da Universidade Ibirapuera dizendo que estava inaugurando os cursos de Arquitetura e Comunicação Social. Fiz o vestibular na Unib para Arquitetura. Passei, mas o curso não teve início, pois, não havia alunos suficientes naquele ano. Foi então que me ofereceram como segunda opção o curso de Comunicação Social, podendo optar depois de dois anos entre Propaganda e Jornalismo. Aceitei. E assim, meio que empurrado pelo destino, me tornei publicitário.
Quando a criação e a arte começaram a lhe chamar atenção de fato?
A criação e a arte me chamaram atenção desde pequeno. Sempre gostei muito de desenhar. Preferia no colégio as aulas de Artes à Educação Física (aula preferida de todo moleque). Isso porque eu me destacava nelas. Meu pai tinha lojas de roupa masculina e minha mãe era design de interiores e artista plástica, ou seja, em casa também sempre tive estímulo. Só nunca imaginei que trabalharia com criação aplicada à propaganda.
A arte deve ter um papel social em algum sentido?
Eu acho que a arte sempre tem um papel social, mesmo quando ela parece ser puramente estética. Algumas despertam reflexões mais profundas nas pessoas. Outras, somente uma sensação, um sentimento, seja ele qual for.
Dentro da AlmapBBDO, existiu algum momento em que algum cliente quis “podar” a sua arte que era extremamente criativa pela sua ótica?
Na AlmapBBDO não faço arte, faço propaganda, vendo marcas, produtos e serviços. E a criatividade é o grande diferencial para embalar as mensagens e torná-las poderosas, mas sempre com uma finalidade muito clara, vender. E o que mais acontece é ter que ir moldando as ideias dentro dos interesses e visões das muitas pessoas que hoje fazem parte do processo de uma campanha publicitária.
Olhando o seu trabalho, vemos alguns pontos comuns entre o seu traço simples e sem texto, com o traço do genial Saul Steinberg. Ele foi a sua maior influência?
Saul Steinberg é, sem dúvida, uma grande inspiração. Assim como os desenhos de Pablo Picasso. Com certeza, não só para mim, mas para muitos outros artistas. A gente acaba sendo sempre um pouquinho de cada uma das pessoas que admiramos. Outra pessoa que influenciou muito no meu traço foi o diretor de arte Denis Kakazu. Comecei como seu assistente de arte na Publicis e admirava muito os roughs [esboços soltos e descompromissados] simples que ele fazia para contar suas ideias. Outra influência foi o humor e oportunismo das charges dos irmãos Caruso e do Ique, que publicava suas charges no jornal O Estado de São Paulo. Delas, herdei algo que me chamava muito a atenção, as “gotinhas” que, vira e mexe, davam vida e movimento. Depois que comecei a desenvolver meu trabalho de arte e publicá-lo em minhas redes sociais, fui recebendo de amigos e seguidores mais referências de artistas atuais com alguma semelhança ao material que venho desenvolvendo. Virei fã de alguns deles, como Jean Jullien, Geoff Mcfetridge, Christoph Niemann, Tim Lahan e Dan Perjovschi.
Quando a influência de um artista que se admira, começa a atrapalhar o trabalho que deve ser autoral?
Um artista que você admira só atrapalha quando você passa a ser uma cópia dele, perdendo sua própria identidade, que, na minha opinião, é formada por todas as influências não só artísticas, mas também por todas as experiências pessoais vividas. Acho que referências são boas como base de estudo e reflexão. Elas ajudam a formar nosso critério. Não só em arte como em propaganda ou até mesmo nas coisas que consumimos no dia a dia. Isso serve tanto para coisas tangíveis e materiais como para conceitos morais e filosofia de vida (filosofando um pouco aqui).
O que é crucial para um diretor de arte ser um diretor de arte com D e A maiúsculos em seu ofício?
Acho que o principal é trabalhar com prazer. Como costumo escutar aqui do Luiz Sanches, tem que ter brilho nos olhos. O resto é uma conjunção de fatores. Acredito que a soma desses muitos fatores é o que faz com que algumas pessoas se destaquem mais do que as outras.
Quais foram as principais mudanças que observa em seu ofício, e que agora neste momento, estão fazendo uma diferença perceptível na forma de se produzir uma peça?
As principais mudanças que ocorreram e vêm ocorrendo na publicidade têm a ver com as grandes mudanças que acontecem na vida de todos. A forma como o ser humano se comunica ampliou. O acesso à informação é cada vez mais democrático e as pessoas que tinham um papel muito mais de receptor no processo da comunicação passaram a ser mais ativas e emissoras. Ou seja, tudo mudou e sempre mudará, mas o princípio da criação sempre continuará o mesmo, que é a vida das pessoas.
Você enxerga a publicidade como uma forma de arte?
Não. Como disse anteriormente, acredito que o objetivo principal da publicidade é vender. Vender produtos, serviços, pensamentos de marcas. Muitas vezes nós nos utilizamos de recursos encontrados na arte. Uma das coisas que me ajudaram muito como publicitário foi ter um pai comerciante e ter trabalhado como vendedor de loja durante a faculdade.
Quais as principais vantagens que um criativo pode tirar dos meios digitais, sobre tudo das redes sociais?
A agilidade e a potência que as coisas acontecem. Tudo pode acontecer muito rápido e fazer muito barulho. E está ao alcance de todos. A vantagem é que todo mundo hoje tem essa ferramenta nas mãos. A desvantagem é que todo mundo tem essa ferramenta nas mãos. Ou seja, ficou mais fácil para qualquer um se comunicar com um grande alcance de pessoas e de forma poderosa. E mais difícil se destacar no meio de um volume tão grande de informação. É aí que a criatividade continua forte e se mantém como um grande diferencial.
A publicidade tem o poder de inventar fenômenos sociais?
Acredito que sim. A publicidade trabalha com ideias e estas, sim, são muito poderosas.
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