O paulistano Ricky Mastro é produtor, diretor e roteirista, formado em Drama pela Universidade de Washington (Seattle – EUA) e em Cinema (Fundação Armando Álvares Penteado – Brasil). Possui também um mestrado em “Identidade LGBTTT no Cinema – A análise de cinco curtas-metragens (Universidade Anhembi Morumbi – Brasil)”. Ele produziu, dirigiu e escreveu mais de 11 curtas-metragens vistos em mais de 200 festivais de cinema. Produziu, dirigiu e escreveu a trilogia “Cinco Minutos”, “A Mais Forte” e “Felizes para sempre”, que foi distribuída em mais de 200 festivais internacionais e nacionais. O último curta faz parte do longa-metragem “Fucking Different São Paulo”, que reuniu cineastas gays falando sobre assuntos lésbicos e cineastas lésbicas falando sobre assuntos gays. Ricky foi criador e responsável pelo evento “Diversidade FAAP” durante a Semana de Comunicação da FAAP (2006-2012) e palestrante sobre o tema “Visibilidade LGBTT” nos eventos QueeringParagmas (UFRJ – 2012) e SanGenSex (Unifesp – 2012). “Sabemos que a distribuição é a chave de todo o sucesso do filme, afinal ele foi feito para ser visto e quanto mais ele é visto, melhor é para o realizador. Mas sofremos tanto na preparação do filme e depois na entrega do produto que quando o filme está pronto, já não temos nem forças físicas e nem financeiras”, afirma o cineasta.
Ricky, se apresente para aqueles que ainda não o conhecem.
Desde pequeno eu me considero um contador de histórias, é isso que eu sei fazer, é isso que eu gosto de fazer. Além de contar histórias, eu amo ouvi-las. Na realidade, amo mais ouvi-las do que contar. Escolhi o teatro e depois o cinema, pois, era aquilo que eu fazia desde criança quando brincava com os meus primos e irmãos. É claro que o cinema naquela época era apenas um sonho, mas aos poucos com o passar do tempo foi se tornando realidade. Enfim, eu só posso contar histórias que são verdadeiras para mim e nada melhor do que contar as histórias de sua realidade, não é? Logo, resolvi focar as minhas histórias na comunidade LGBTTT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) da qual eu faço parte e através delas dar visibilidade para a comunidade tentando fazer um mundo para os meus sobrinhos que aceitam mais as diferenças.
Quais foram os motivos que o fizeram escolher o cinema para passar a sua mensagem ao invés do teatro que é uma das suas grandes paixões?
Eu primeiramente fiz teatro. Me formei em teatro pela Universidade de Washington (Seattle – EUA). Mas, depois eu cheguei no Brasil e simplesmente tudo foi me levando para fazer cinema. Posso dizer que sempre vi mais cinema do que teatro (acho que pela praticidade mesmo), logo o cinema se tornou o meu esposo e o teatro o meu amante.
Muitos dizem que seus filmes têm uma estética LGBT. O que seria essa estética LGBT na sua visão?
Eu acho que isso é uma discussão que pode ir longe, seria a estética LGBT um gênero e se fosse o que constitui? Por exemplo, essa semana eu vi mais de 16 filmes de diversos países e línguas para o festival ImageOut em Rochester – Nova York e posso falar que todos eles apresentavam de uma certa maneira uma identidade no conteúdo, de contar a história, do percurso dos personagens, na trilha e até na estética do elenco.
Como você sente por parte da sociedade ou mesmo do meio cultural como um todo, a aceitação dos seus filmes com temática gay?
Estamos caminhando. Acho incrível os grandes festivais abrirem as suas portas para as mostras gays e criarem um prêmio, como acontece em Berlim com o Teddy Bear, a Queer Palm de Cannes e agora o novíssimo Prêmio Felix do Festival do Rio de Janeiro. Mas, também acho que a comunidade pede que tenham festivais com essa temática, pois, ele proporciona um lugar de encontro das pessoas, uma hora que elas podem se ver na tela e podem ver aqueles que convivem com elas lá. Eu só tive a noção de como é bom se ver na tela depois que eu vi (e vou citar os filmes dessa semana) dois filmes que mexeram comigo – um foi o pré-indicado ao Oscar “Hoje eu quero voltar sozinho” e o mexicano “Quatro Lunas”. Os dois falam da descoberta da sexualidade de uma maneira que eu desejei que isso pudesse ter sido feito na época que eu tinha 16 anos.
O cinema deve obrigatoriamente ter um papel social?
Claro que deve, não é esse o papel da arte? Não é isso que nós artistas almejamos de alcançar o mundo através dos nossos olhares particulares?
Achamos interessante quando você diz que os realizadores culpam sempre os distribuidores em nosso país na parte do problema em que existe na produção-distribuição-exibição dos filmes, mas não isenta da culpa também os realizadores. Acredita que ainda falta essa visão de negócios para parte dos cineastas brasileiros?
Não só por parte dos cineastas brasileiros, mas por todo o cineasta. Sabemos que a distribuição é a chave de todo o sucesso do filme, afinal ele foi feito para ser visto e quanto mais ele é visto, melhor é para o realizador. Mas sofremos tanto na preparação do filme e depois na entrega do produto que quando o filme está pronto, já não temos nem forças físicas e nem financeiras. Então, esse planejamento tem que vir desde o começo, ele tem que estar desde quando as primeiras linhas do projeto são rascunhas.
Por que você acredita que cenas como temos no filme “Praia do Futuro” do cineasta Karim Aïnouz, ainda choca tanto alguns espectadores em pleno século XXI?
Se você pensar faz menos de 100 anos que tivemos os campos de concentração e milhões de gays mortos. A sociedade ainda é homofóbica, e estou pensando somente no mundo ocidental no qual eu cresci e vivo, mas mesmo nele temos taxas altíssimas de violência contra homossexuais, e a violência é gerada pelo simples fato do agressor “achar” que a vítima não é heterossexual. Isso me assusta muito. Então as cenas do filme do Karim que mostra dois homens fazendo sexo se torna um grande tabu. Mas avançamos, pelo menos agora elas são mostradas.
Existe muita dificuldade em se angariar recursos para filmes com a temática gay?
Existe a dificuldade inicial de conseguir fundos, depois dessa primeira etapa veem a mais difícil quando muitas pessoas te perguntam se realmente você tem que contar uma história com essa temática.
Depois do seu curta-metragem ‘A Mais Forte’, você recebeu algum “feedback” de alguém que assistindo o seu filme se viu na mesma situação?
Claro que recebi e aconteceu dois casos. Um deles foi nos Estados Unidos e outro aconteceu em Porto Alegre. A mãe percebe que ela perdeu a chance de conhecer o filho pelo simples fato dele ser gay. Isso é muito triste.
Como foi a sua experiência em ser jurado na mostra Queer Palm no Festival de Cannes?
Foi uma ótima experiência. O prêmio está crescendo a cada ano e tive a chance de acompanhá-lo no festival desde a sua primeira edição. Essa edição foi o ano que o festival teve mais nomeados. Foi muito bom ter a chance de ver cinema com essa temática de altíssima qualidade e depois discutir com pessoas que lidam com esse lado da indústria.
Quais são suas próximas realizações e se você consegue definir em uma palavra, o que lhe motiva em seguir fazendo os seus filmes?
Eu estou batalhando nos primeiros passos da pré-produção do meu longa ‘Jogos de Mente’. Também escrevi junto com Eduardo Mattos o curta-metragem ‘Xavier’ e estarei no começo de dezembro como presidente do juri no Festival For Rainbow em Fortaleza.
Uma palavra que motiva eu continuar fazendo filmes: Visibilidade.
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