O gA é uma consultoria internacional com 1.400 funcionários espalhados por 11 países na América Latina e Estados Unidos, com faturamento ao redor de 80 milhões de dólares. Grande parte das receitas é gerada pelo Brasil, que possui três filiais (Paraná, São Paulo e São José dos Campos). “Com a rápida transformação digital dos negócios, os próximos três anos serão mais críticos para as empresas nascidas analógicas do que tem sido nos últimos 50 anos. Mudar ou não deixou de ser opcional. Quem não se adaptar corre risco de sair do mercado”, adverte Roberto Wagmaister, CEO e fundador do gA. Contrariamente às mudanças anteriores, observa o dirigente, a digitalização é baseada na evolução de vários componentes, com impacto determinante na produção de bens e serviços provocadas pela incorporação massiva de novas tecnologias. Isso implica, observa o empresário, em uma reestruturação das cadeias de valor através da introdução de comunicações, aplicações, plataformas e conteúdo tecnológico. “A transformação atual é fruto da convergência e maturidade das tecnologias, explorando exponencialmente a internet. Da mesma forma que o motor elétrico era o vetor da evolução tecnológica durante a era industrial, a internet transformou nossa sociedade, construindo-a em torno de redes corporativas e pessoais, operadas por redes digitais”, afirma o executivo.
Roberto, como se deu o começo de sua carreira?
Graduei-me em Contabilidade Pública e iniciei minha carreira como sócio do escritório Henry Martin e Associados e, posteriormente, Diretor Regional para América Latina de Serviços de TI na Ernst & Young.
No ano de 1992, decidi criar uma empresa diferente das demais e, com este firme objetivo, formei um grupo de 17 pessoas que buscavam desenvolver algo diferente em um mundo que recém começava a dar seus primeiros passos na era digital. A essência desta companhia era a paixão empreendedora de seus fundadores; sua visão era ajudar outras empresas a otimizar seus processos de negócios e guiá-las em sua expansão internacional e no caminho para a transformação digital dos negócios. Esse foi o começo do gA.
Começamos a trabalhar com grandes grupos locais e corporações multinacionais. À medida que a tecnologia avançava o gA seguiu aprendendo, somando habilidades e tecnologias: buscávamos ser líderes em transformação de negócios.
Ao longo dos anos, criamos uma equipe de mais de 1.400 especialistas em tecnologias, negócios e transformação. À medida que crescíamos, nossa metodologia DBT (Digital Business Transformation) se aperfeiçoava através de nossos estudos constantes e a expertise de nossa equipe que sempre esteve à frente na busca de soluções inovadoras para gerar valor e acompanhar nossos clientes nos desafios impostos pela transformação digital.
Vinte e cinco anos depois, queremos ainda mais: criar novos produtos e seguir transformando negócios, processos e pessoas.
Quais mudanças mais profundas e dramáticas que você viu em seu trabalho nos últimos 20 anos?
A transformação atual é fruto da convergência e maturidade das tecnologias, explorando exponencialmente a internet. Da mesma forma que o motor elétrico era o vetor da evolução tecnológica durante a era industrial, a internet transformou nossa sociedade, construindo-a em torno de redes corporativas e pessoais, operadas por redes digitais. E como as redes são globais e não conhecem limites, a sociedade em rede é uma sociedade de redes globais. Essa estrutura social deste momento histórico é o resultado da interação entre o emergente paradigma tecnológico baseado na revolução digital e certas mudanças sócio-culturais.
Outra mudança grande foi o surgimento do conceito de plataforma. A plataforma é algo que vincula partes. Uber é uma plataforma que conecta o usuário do táxi com o prestador de serviço. E o engraçado é que Uber não tem posse dos carros. Basta ligar a oferta e a procura, assim como o AirBnB também faz.
Em suma, a tecnologia mudou drasticamente a forma como administramos nossa vida profissional e social. Nossa geração experimentou grandes mudanças nas últimas décadas. As mudanças são inevitáveis e temos que estar abertos para o futuro.
Nos explique de uma forma sucinta, os motivos que os próximos três anos serão mais críticos para empresas nascidas como analógicas.
Os próximos três anos serão mais críticos para as empresas nascidas analógicas do que tem sido nos últimos 50 anos. Quem não se adaptar corre risco de sair do mercado.
A convergência e maturidade das tecnologias são os habilitadores da transformação. Tudo mudou, não se pode mais conduzir os negócios como se fazia antes. O desafio agora é principalmente integrar a cadeia de valor de forma rentável e lucrativa. Tem muita tecnologia no mercado, falta ganhar dinheiro com elas.
No recente World Economic Forum, em Davos, uma previsão alarmou os executivos: a transformação digital irá injetar US$ 100 trilhões na economia mundial em uma década.
O que estas empresas analógicas devem fazer para não morrer?
As empresas precisam entender que a transformação digital dos negócios já chegou, não existe mais a opção de ignorar o que precisa ser feito, como fazer o redesenho organizacional que permita analisar os dados para tornar seus negócios mais rentáveis. Tome-se o exemplo dos fabricantes de máquinas fotográficas, como a Kodak, fortemente abalados pela invenção da fotografia digital; quem não se adaptou praticamente desapareceu do mercado. Estamos entrando no quarto grande ciclo de transformação da humanidade e do conhecimento, impulsionado pela aquisição e gestão de dados; mas é necessário modificar os sistemas de negócios para capitalizar a tecnologia disponível.
Estamos passando por uma nova “Revolução Industrial?”.
A transformação digital também é chamada de digitalização da produção, digitalização da cadeia de valor ou internet industrial e pode ser definida como as diversas mudanças associadas à adoção generalizada de tecnologias digitais nos processos produtivos, com a consequente mudança nos modelos operacionais e na dinâmica do funcionamento do mercado.
Em quanto tempo teremos produtos conectados com a internet de uma forma ampla?
Em breve, será comum produtos conectados, como a cafeteira elétrica, ter autonomia para fazer o pedido de reposição do café. Caminhões sem motoristas para entregas com logística definida para otimizar roteiros. Lojas sem caixas, com o débito no cartão de crédito na saída. Pizzarias robotizadas desde o pedido até a fabricação e entrega. A telemetria começa a mudar o mercado de seguros, com preços mais vantajosos para o segurado que tem seus dados monitorados. Já temos redes neurais que permitem a previsão de demanda com base no uso inteligente de grandes volumes de dados de clientes em tempo real. A plataforma utiliza algoritmos matemáticos para executar grandes volumes de transações de dados do cliente e eventos externos, tais como previsões meteorológicas, concorrência de preços e campanhas promocionais, para sincronizar automaticamente a demanda em conjunto com os sistemas de planejamento, que por sua vez, ajusta e otimiza a cadeia de fornecimento das plataformas de execução. Neste contexto, o verdadeiro desafio consiste em transformar as pessoas, seus padrões de pensamento e como as organizações precisam avançar para tirar proveito de todas essas mudanças.
Sente que algumas empresas ainda ignoram a transformação digital nos negócios?
É muito comum um erro que custa caro para as organizações: ignorar a perspectiva do negócio na mesma equação. O principal problema é que falta uma estratégia digital única e ainda existe complexidade demais nos modelos atuais de negócios, e a complexidade é um obstáculo natural para a transformação digital.
Líderes, desde presidentes até diretores, ainda não se envolvem o suficiente no tema digital, a tecnologia se concentra em silos especialistas e não tem sido uma prioridade corporativa utilizar a digitalização para elevar a produtividade.
Falta especialmente ao empresário construir uma visão digital para o conjunto da organização e isso é fundamental para a competitividade nos próximos anos.
O consumidor tem sido até mais rápido na adaptação às mudanças do que muitas empresas. Existem dois blocos no processo onde as mudanças ocorrem. De um lado, o consumidor, que já usa, por exemplo, seu telefone celular para chamar um táxi, comprar ingressos, fazer check-in no avião, etc. De outro a crescente oferta de produtos e serviços ao consumidor final por meio de canais digitais. A fim de aproveitar essas oportunidades, as empresas precisam descobrir como unir a nova demanda criada pelos consumidores com o que é chamado de lado industrial, que é como as empresas compram seus insumos, como distribuí suas mercadorias, a logística. Isso é o que o mundo chama de Indústria 4.0. Então, quando se fala sobre a compra, fabricação, distribuição e logística, o que se forma é a cadeia de valor de uma empresa.
Esta cadeia de valor é o que tem que ser transformada para capitalizar os benefícios das novas tecnologias. A empresa não pode continuar a produzir e distribuir como fazia antes do surgimento das novas tecnologias. Outro ponto crítico é a necessidade de aumentar a produtividade. No ano passado, fizemos um estudo na América Latina em cinco países em cinco mercados verticais e envolvendo cerca de 180 executivos de grandes empresas, em geral. As conclusões foram que o nível de investimento, embora elevado – quase 80/100, o retorno ainda é bastante baixo na América Latina, 46/100. O fosso entre o que se investe e o retorno obtido indica justamente a necessidade de capacitar melhor às pessoas. As empresas precisam entender como colocar todas as novas tecnologias dentro da cadeia de valor em que os bens e serviços são produzidos.
Como os líderes devem se focar no voraz mundo digital?
Os líderes devem elevar suas apostas digitais para competir com empresas que já executam sua estratégia completamente no campo digital e que vem transformando modelos de negócios existentes e ganhando cada vez mais espaço entre os consumidores. E esta questão é ainda mais urgente para os que comandam as companhias brasileiras. Entre os países da Europa e América Latina, o Brasil apresenta um dos menores índices de produtividade, em uma escala de zero a dez, segundo nosso recente estudo “Latin America 4.0: The Digital Transformation in the Value Chain” produzido pelo Centro de Transformação Digital do gA (Grupo ASSA).
Outra conclusão também preocupante: a imensa maioria das empresas latino-americanas ainda não sabe como ganhar dinheiro, gerar negócios e serem mais produtivas apesar dos maciços investimentos feitos em novas tecnologias. As empresas investiram cerca de US$ 130 bilhões em tecnologias em anos anteriores, mas não conseguiram nem avançar, nem inovar o quanto esperavam. Neste contexto, crescem pouco e são menos produtivas, aponta o estudo.
Tanto no Brasil como na América Latina a transformação digital é crucial para as empresas. Nos próximos anos a região crescerá em um ritmo mais lento em comparação à década passada, como consequência da baixa mundial dos preços das commodities, o que torna necessário enfrentar o desafio da produtividade e competitividade industrial mediante uma assimilação intensa das tecnologias digitais.
Ainda que a sua adoção seja alta entre as indústrias, o impacto na cadeia de valor continua baixo. Isso ocorre porque para digitalizar a produção não é suficiente o investimento em equipamentos, é preciso demonstrar melhoras na produtividade, combinando a adoção das tecnologias digitais com um trabalho meticuloso de reorganização de processos, reestruturação da organização e capacitação dos recursos humanos. Por si só, a adoção de tecnologias digitais não gera uma melhora nem automática, nem simultânea na produtividade. Por outro lado, o estudo aponta que na visão dos líderes uma estratégia digital combinada com IoT terá um impacto significativo sobre a eficiência organizacional.
No horizonte próximo, a maioria dos líderes e empresários deve se envolver cada vez mais neste tipo de projeto transformacional e, neste contexto, remover barreiras é fundamental para colocar uma estratégia digital em curso. Uma estratégia digital de sucesso tem como mantra a simplicidade e visa a eficiência operacional.
E os funcionários, como devem se comportar e adaptar nestes novos tempos?
Existe a necessidade de transformar e mudar já os hábitos para ser uma pessoa ativa nesta nova economia colaborativa. Duas premissas: entender o que é trabalhar em colaboração, ou seja, não é trabalhar sozinho, mas sim integrar equipes multidisciplinares de forma a cobrir as diferentes dimensões da mudança (sociólogos, tecnólogos, especialistas do setor, dados científicos…).
Quais os erros que uma consultoria não pode cometer?
Para uma consultoria é fundamental estar próximo do cliente e estabelecer laços de confiança e respeito no longo prazo. Estabelecer relacionamentos é fundamental como meio de efetivamente acompanhar o cliente em seus desafios, estando lado a lado na busca de novas soluções que possam agregar valor. A consultoria não deve apenas enfocar-se nos avanços tecnológicos, mas trazer a visão de competitividade em novas economias. Para tanto, lançamos o gA Center for Digital Transformation, um centro de pesquisa para estudar o status e o progresso de digitalização das empresas latinas. Outra questão que não é opcional é ter uma estratégia clara, realizar entregas com excelência e treinar permanentemente aos recursos.
O que o gA tem feito para se diferenciar no mercado atual?
A nova tecnologia também obriga as consultorias de gestão a se adaptarem aos negócios. Precisamos colocar a mão na massa. Trabalhamos para alinhar todos os processos às novas tecnologias disruptivas, habilitar novas plataformas de negócios, assim como capacitar as pessoas. Em outras palavras, não é mais simplesmente desenvolver um projeto e implementar na empresa, o cliente de um lado, a consultoria de outro. Fazemos juntos, criamos a plataforma de negócios em conjunto. Com esta metodologia de trabalho conseguimos desenvolver relacionamentos duradouros, temos mais de 30 clientes estratégicos, multinacionais, e mais de 70 líderes em áreas como varejo, ciências da saúde, manufatura e empresas de consumo.
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