O empresário gaúcho Nelson Sirotsky, formou-se em Administração de Empresas e Administração Pública pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1974 e fez cursos de especialização, como o Executive Management Course na Universidade do Sul da Califórnia, realizado em 1979, e o Harvard YPO-President’s Seminar, realizado no ano de 2000. Em 1978, introduziu a RBS TV em Santa Catarina. Depois, entre 1982 e 1986, ocupou a superintendência de mídia eletrônica da RBS. É presidente do Conselho de Administração do Grupo RBS, o maior conglomerado de mídia do sul do país, desde 2008. Atualmente, a RBS é sócia estratégica, junto com as Organizações Globo/Microsoft e Bradesco, da Globocabo SA, maior plataforma latino-americana de TV por assinatura. “Vivemos uma grande transformação com a popularização da internet. Como toda mudança, há impactos em distintas áreas, para o bem e para o mal. Temos hoje informações de fontes mais variadas, as pessoas podem se fazer ouvir por meio das redes sociais, um fato antes restrito a um pequeno grupo pode se tornar conhecido por milhões de pessoas em poucas horas. (…) Na Venezuela temos um regime pseudo-democrático, e já há sinais de perigo na vizinha Argentina, com o cerco do governo a jornais tradicionais. Qualquer atentado à liberdade de expressão deve ser temido não apenas pelos meios de comunicação, mas por toda a população”, afirma o empresário.
O senhor é contra ou a favor da obrigatoriedade do diploma de jornalista para o exercício da profissão?
O Grupo RBS valoriza a formação profissional e acredita que as universidades têm um papel relevante para a qualificação da imprensa e do jornalismo. Tanto é assim que somos o segundo maior empregador de jornalistas do país. Além disso, nos nossos veículos damos preferência à contratação de jornalistas diplomados para as funções jornalísticas. Mas quero destacar que a qualidade do jornalismo não se mede pelo fato de o jornalista ter ou não o diploma. Há muitos bons profissionais do jornalismo que não tiveram a formação acadêmica. Não gosto da ideia de “reserva de mercado” e, neste contexto, acho que o exercício da atividade jornalística deve ser livre.
O que um dono de um grande grupo de comunicação precisa para sobreviver no mercado e resistir às tentações e aos achaques do poder político e econômico?
Uma empresa de comunicação séria não admite este tipo de situação. Eu nunca fui abordado desta forma, e isso me deixa tranquilo para crer que as pessoas acreditam que a nossa empresa não cederia a nenhuma pressão deste tipo. Trabalhamos de forma profissional, com alto padrão de qualidade, o que nos dá liderança em todos os segmentos em que atuamos. Como consequência, temos um modelo de negócio que nos garante independência econômica e sustentabilidade. Essa mesma independência nos dá também liberdade editorial para evitarmos qualquer tipo de pressão política ou comercial. Não admitindo este tipo de pressão, garantimos nosso maior patrimônio, a credibilidade, que deve ser o principal ativo das empresas de comunicação.
O senhor acredita que a qualidade da informação na era digital melhorou ou piorou?
Vivemos uma grande transformação com a popularização da internet. Como toda mudança, há impactos em distintas áreas, para o bem e para o mal. Temos hoje informações de fontes mais variadas, as pessoas podem se fazer ouvir por meio das redes sociais, um fato antes restrito a um pequeno grupo pode se tornar conhecido por milhões de pessoas em poucas horas. Essas coisas impressionam e são um desafio à forma como fazemos comunicação. Mas há também muitos casos de irresponsabilidade na divulgação de informações no mundo digital, publicações sem ouvir o outro lado, ou mesmo noticiam-se mentiras apenas para tentar prejudicar inimigos. Isso prejudica a credibilidade da informação e, por consequência, também o trabalho dos veículos sérios.
Muitos acusam os grupos RBS, Folha da Manhã, Organizações Globo, Editora Abril e Estado de terem formado um oligopólio. O senhor discorda dessa afirmação em que pontos?
Por conceito, oligopólio é quando um número reduzido de organizações domina um mercado e pode, por esta condição, até regular os seus preços. Obviamente, isso não ocorre no mercado de comunicação. O mercado brasileiro é altamente competitivo. O que existe é que estes grupos são líderes em seus mercados graças à qualidade dos seus produtos. Eles até competem entre si, e isso é muito bom para manter em alta a qualidade dos produtos e serviços que prestam para seus respectivos públicos.
O que o senhor considera ser de mau gosto na programação de uma rede de televisão?
Sou um grande crítico nas concessões feitas para se buscar mais audiência a qualquer preço. Quando se apela para questões que envolvem desvios de comportamento, violência, sexo, eu sou contra. Não gosto do formato “reality show”. Muitas vezes ele oportuniza o tipo de desvio que não acho que agregue qualidade à produção da televisão brasileira.
Recentemente uma das maiores publicações do planeta, o britânico “The Guardian”, afirmou que irá priorizar o online. O senhor acredita que estamos caminhando para o fim dos jornais impressos?
Não, absolutamente. A cada dia, fica mais claro que os novos meios de comunicação não vão acabar com os meios tradicionais, mas sim exigir deles um papel específico. E cabe aos jornais impressos a incumbência de aprofundar as discussões, antecipar tendências e manter vivos a grande reportagem e o grande e bom texto.
Acredita que existe alguma conotação política por trás das acusações que o senhor teria realizado crimes contra o sistema financeiro?
Não. O que há é a irresponsabilidade de alguns jornalistas sensacionalistas que, no intuito de chamar a atenção do público, rompem com os princípios básicos do jornalismo e simplesmente faltam com a verdade. Não há nenhuma investigação ou acusação por crimes contra o sistema financeiro envolvendo o Grupo RBS, nem nenhum dos nossos acionistas ou dirigentes.
Hoje o grande diretor de programação da TV é a audiência?
Audiência é fundamental, sim, mas não é a única coisa que importa. A TV brasileira sempre se preocupou muito com a qualidade de sua produção e sabe fazer bom conteúdo. Nosso país tem a Globo, uma rede de televisão que é uma das melhores do mundo em termos de qualidade de conteúdo e produção. Então, a boa audiência acaba sendo uma consequência do produto adequado ao público.
Muitos acusam a RBS de ser anti-PT. Como é a sua relação com o partido, tendo em vista que a presidente da República e o atual governador do RS são da mesma legenda?
A RBS não é anti-PT, nem contra partido algum. Somos uma empresa crítica e que exerce seu posicionamento crítico quando é necessário, não importando o partido. Nossa convivência com o PT, e com todos os outros partidos, foi, e segue sendo, absolutamente civilizada. Cada vez mais, os partidos e os políticos estão assimilando a ideia de que o papel da imprensa é acompanhar os movimentos políticos e, quando for do interesse do público, criticar.
Nos próximos anos a RBS vai investir em outros estados do país?
O nosso crescimento e os nossos investimentos fora dos estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina acontecem na área digital e na área de participações. Estamos apostando em empresas e produtos que nos tragam inovação e novas capacitações. É o caso das marcas digitais que temos com atuação em vários Estados, como o Guia da Semana e o ObaOba, ou da nossa parceria com a Rede Globo na empresa de eventos Geo. Estamos também desenvolvendo com parceiros um importante projeto na área da educação.
Por que os veículos de comunicação no Brasil não dizem para os seus leitores, quais são as suas preferências no campo político, como fez o jornal “O Estado de S.Paulo”, apoiando na eleição passada o candidato do PSDB José Serra?
Acredito que isso ainda não seja possível no Brasil porque a nossa democracia não está suficientemente madura para entender que o posicionamento de um veículo em seus editoriais significa a posição que o veículo entende ser melhor para o seu público e que isso não deve influenciar a independência da cobertura política do próprio veículo. Com o tempo, creio que isso será possível aqui como o é em outras partes do mundo.
Nós temos ainda um número baixo de leitores de jornais e revistas no país, comparando a nossa nação com outros países de menor porte populacional. O que o senhor considera ser o fator-chave para que isso venha a mudar?
O aumento de renda da população é muito importante para que isso ocorra. Sempre que cresce a renda, cresce o interesse pela leitura. No Rio Grande do Sul temos um dos maiores índices de penetração de leitura, o que é muito bom. E também é importantíssimo o papel da educação neste processo, já que um ensino de melhor qualidade formará cidadãos mais interessados no que acontece ao seu redor. Então, cabe aos veículos enfrentar o desafio de fazer um jornal para estas novas gerações e que também atenda a estes novos mercados em formação.
Como o senhor enxerga a liberdade de expressão em países da América Latina como a Venezuela de Hugo Chávez, só para ficar no mais notório dos exemplos?
Na Venezuela temos um regime pseudo-democrático, e já há sinais de perigo na vizinha Argentina, com o cerco do governo a jornais tradicionais. Qualquer atentado à liberdade de expressão deve ser temido não apenas pelos meios de comunicação, mas por toda a população. Garantir a liberdade da imprensa é garantir o direito das pessoas de acessar a informação que desejarem e em que confiarem. Por isso, é preciso deixar claro que quando as empresas de comunicação defendem a liberdade de expressão não estão fazendo isso em interesse próprio, mas sim defendendo um bem maior, a liberdade de informação para o público e o direito de criticar aqueles que estão no poder.
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