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Vítor Oliveira analisa o pleito eleitoral no Brasil

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Vítor Oliveira é cientista político e bacharel em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo (USP) e mestre em Ciência Política pela mesma Universidade, com a dissertação intitulada “A Implantação do Presidencialismo da Coalizão e a Ineficiência Informacional”. Acumula experiência em monitoramento, análise política e avaliações de longo prazo em nível nacional, estadual e municipal para instituições financeiras de grande porte. Foi editor do portal INFOMONEY e autor do blog #ÉPolítica no mesmo portal, dedicado ao acompanhamento e análise da conjuntura política nacional. Escreve mensalmente sobre o Poder Legislativo para o portal do Estadão. É professor da disciplina Processo Legislativo no curso Advocacy e Políticas Públicas: teoria e prática, da Fundação Getulio Vargas (FGV). “Se o que aconteceu recentemente nos EUA e na Europa serve de referência, as redes sociais são um belo ponto de partida em campanhas eleitorais, mas ainda servem fundamentalmente para direcionar a mensagem dos veículos tradicionais, numa comunicação ainda muito controlada pelo emissor. Até por termos evidências de que o uso de robôs é enorme, aumentando artificialmente o impacto das redes. No fim do dia, bots não vão até a urna. (…) As instituições políticas têm uma missão principal, que é processar os conflitos e as discordâncias de modo pacífico, produzindo políticas públicas a partir disso”, afirma o analista.

Vítor, o que existe de semelhanças nesta eleição se compararmos com a eleição de 1989?

Certamente há semelhanças e é possível fazer comparações, mas elas têm alguns limites institucionais bem claros. A principal analogia que podemos fazer é com relação ao número de candidaturas absoluto, bem como de candidaturas presidenciais com algum potencial de desempenho. Há uma expectativa – por parte de algumas lideranças partidárias – de que o ciclo de predomínio de PT e PSDB na disputa nacional se encerrou, abrindo espaço para novos arranjos e novas forças, assim como no final da década de 1980.

Como vê o fenômeno Jair Bolsonaro?

Há muitas facetas; primeiro, por se alimentar da corrosão na imagem das instituições e do diagnóstico (a meu ver equivocado) de que os problemas do Brasil têm origem na corrupção e seu combate exige restaurar a autoridade e o nacionalismo, princípios muito próximos ao militarismo e aos quais ele está associado. Em segundo, ressalto a capacidade de manter-se afastado da imagem de pertencimento à elite política, a despeito de comportamentos peculiares a este grupo – como ser político-profissional, ter filhos ocupando mandatos eletivos, receber dinheiro do partido para fazer campanha e de utilizar recursos do mandato para benefício próprio, como ele mesmo reconheceu.

Mas ainda assim, reduzir a campanha do deputado à agenda conservadora de costumes – algo fundamental e que está sim no núcleo de seu eleitorado – é ignorar que a amplitude de seu apoio até aqui tem outra dimensão. A forma da disputa política, a estética do discurso, também cumprem um papel importante em disputas majoritárias – algo mais forte na eleição presidencial. O candidato expressa e representa uma parcela importante da sociedade que normaliza comportamentos os quais passaram, paulatinamente, a ser condenados nos últimos 30 anos. Goste-se ou não, ações políticas causam reações e acredito que a virulência do candidato e seus apoiadores se dá também como uma contraposição ao que se convencionou a chamar de politicamente correto, de gente que se sentiu acuada pelo avanço de políticas de Direitos Humanos e pela afirmação de minorias.

Esse fenômeno seria possível sem as redes sociais?

Certamente seria possível, mas não há dúvidas de que a internet e as redes sociais reduzem o custo para comunicação, coordenação e mobilização social, especialmente aquelas menos centralizadas e mais espontâneas. Não me parece ser o caso de eleições majoritárias. Se o que aconteceu recentemente nos EUA e na Europa serve de referência, as redes sociais são um belo ponto de partida em campanhas eleitorais, mas ainda servem fundamentalmente para direcionar a mensagem dos veículos tradicionais, numa comunicação ainda muito controlada pelo emissor. Até por termos evidências de que o uso de robôs é enorme, aumentando artificialmente o impacto das redes. No fim do dia, bots não vão até a urna.

 

A polarização PT e PSDB chegará ao fim este ano?

O mundo é feito de probabilidades. Quem crava resultado de eleição é médium. Na melhor das hipóteses, podemos fazer um palpite informado e o meu palpite é PT e PSDB continuarão importantes, em função de alguns fatores que também tiveram peso nas últimas eleições. Assim, acho que a chance maior é de 2018 se parecer com 2002. Isto significa dizer que PT e PSDB têm boas chances de manter a hegemonia do sistema partidário, mas que a vaga no 2º turno será obtida na reta final. A eleição de 2016 em São Paulo nos ensinou muito; o líder das pesquisas foi perdendo força, sofreu com a campanha negativa dos adversários e com os limitados recursos partidários para competir. O mesmo ocorreu com a 2ª colocada nas pesquisas. Os principais riscos dessa análise, contudo, estão associados à capacidade de ambos conseguirem comunicar a suas bases (especialmente o lulismo no Nordeste e o eleitor tucano em SP), que continuam competitivos e são a escolha com mais chances de vitória, apesar dos pesares.

Existe algum traço de ideologia visível no debate eleitoral?

Certamente; é inescapável. Especialmente o debate na eleição presidencial sempre teve traços visíveis de duas clivagens – economia e costumes. A forma muda de eleição para eleição – Plano Real, Bolsa Família e Privatizações, por exemplo, são temas que opõem visões de mundo. Acho que os temas identitários também ganharam espaço, especialmente com relação à mulher. Dizer que o personalismo e o clientelismo são as principais explicações para eleições no Brasil é ignorar as disputas presidenciais desde 1994. Agora, isto não significa que o conteúdo ideológico seja a única coisa relevante, especialmente nas eleições para o Legislativo. Este talvez seja nosso maior desafio. Ninguém liga para elas e o Governo não é da presidência, mas sim da Coalizão organizada pela presidência.

O Governo Temer é sempre mal avaliado. Restará algum legado real (e benéfico) deste Governo em sua visão?

Temer serviu para desmistificar a ideia de que é preciso ser popular para continuar no mandato – uma falácia empregada para justificar o impeachment. O que ele precisa é ser tolerado por uma maioria – o que também evidencia o quão ruim foi a gestão da Coalizão sob Dilma Rousseff. Algumas iniciativas em políticas públicas foram interessantes, mas o Governo nasceu de uma crise de legitimidade e de gestão política; segurou-se por um manejo competente das engrenagens do Presidencialismo de Coalizão, mas apostou as fichas e o pouco capital político em medidas discutíveis, cujo o objetivo parecia mais o de iludir o mercado que o de promover ajustes necessários. A situação das contas públicas é lamentável e o próximo Governo sofrerá muito no começo. Certamente há coisas boas, como o programa Renova Bio, por exemplo. Também estamos com a taxa de juros mais baixa da história, em que pese não haver competição entre os bancos.

Sempre votamos nas pessoas e nunca nos partidos. Por que temos essa visão do “salvador da pátria” com poderes mágicos?

Tem um dado fundamental relativo à falta de educação política, que vai desde as pessoas mais humildes até as com mais escolaridade; não entendemos o funcionamento do sistema político brasileiro, especialmente o peso dos partidos na dinâmica do processo legislativo, da formulação e da execução de políticas públicas. O Governo no Brasil não é a Presidência, mas sim a Coalizão. Temos expectativas exageradas sobre o papel da Presidência, cujo papel é formar e gerir a Coalizão, dando direção e sentido, mas considerando as preferências e a legitimidade de quem também recebeu votos – os deputados e senadores. Nós mesmos, por meio dos votos para o Poder Legislativo, criamos barreiras e incentivos para que a presidência atue. Passar por cima dos representantes seria, também, passar por cima da vontade de quem os elegeu; é papel de quem vence a eleição presidencial entender isso.

Esperar demais da política e dos políticos é um erro enquanto sociedade?

As instituições políticas têm uma missão principal, que é processar os conflitos e as discordâncias de modo pacífico, produzindo políticas públicas a partir disso. Não é uma tarefa simples e, quando olhamos para a história, é muito recente que pessoas não morram por conta de processos políticos. Damos isso como certeza e esquecemos do quão raro é podermos ter liberdade de pensar e sermos diferentes.

Obviamente, quem está desempregado ou sofrendo com a violência não tem como pensar no papel das instituições. Fazer esta consideração não implica deixar de reivindicar melhorias nas políticas públicas; mas precisamos entender que somos parte ativa deste processo. O predomínio de uma cidadania passiva, que apenas vota e espera resultado, é insuficiente e ajuda a alimentar essa frustração. Não é preciso ter mandato para fazer política. Também não é preciso ter cargo público para cuidar da coisa pública. Isso vai do cuidado com a rua, com o apoio à escola pública do bairro, até o acompanhamento dos mandatos de vereadores, deputados e senadores.

Considera o ex-presidente Lula como a principal peça desta corrida presidencial?

A dinâmica petismo/anti-petismo foi a principal clivagem nas últimas eleições e Lula personifica-a como nenhum outro personagem. Goste-se ou não, teve uma passagem pela presidência muito bem avaliada, o que se reflete nas intenções de voto que possui em pesquisas eleitorais. Não obstante, é inegável que sua imagem sofreu um baque com a operação Lava Jato e sua consequente prisão. Neste sentido, continua como um polo fundamental da disputa política nacional e a perspectiva de que transmita sua elevada intenção de votos pode definir a chance de uma candidatura apoiada por ele chegar ao segundo turno, mas também pode impedir que esta mesma candidatura seja vencedora, por conta da rejeição elevada inerente.

A TV ainda terá um grande peso nestas eleições?

A televisão é fundamental para uma campanha nacional, especialmente em função das mensagens veiculadas ao longo da programação. É importante para uma candidatura ser conhecida, mas também para descontruir a imagem de adversários, com a propaganda negativa. Outros meios de comunicação ainda tem menor penetração e as redes sociais, embora tenham relevância crescente, ainda aparecem como fonte secundária de informações para a maior parte dos brasileiros. A TV não reina sozinha, mas ainda é fundamental.

As mulheres e as classes menos favorecidas são os principais eleitores de 2018?

Tristemente, o Brasil é um país composto por muitos pobres e isso se agravou com a crise econômica recente. Neste sentido, não é possível ganhar uma eleição no Brasil sem ter na agenda respostas para desigualdade social, geração de emprego e crédito. O resgate do consumo das famílias é um tema inescapável, especialmente para o eleitorado com renda familiar inferior a 2 salários mínimos, que havia ascendido por meio do consumo e do crédito, mas que agora encontra-se marginalizado em função do desemprego, da inadimplência e do crédito ao consumidor caro.


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