A cultura de doação no Brasil ainda está em fase de crescimento e adaptação, apesar de atos de solidariedade e doação já fazerem parte do cotidiano de muitos brasileiros. Segundo a primeira edição do Termômetro da Doação, elaborado pelo Movimento por Uma Cultura de Doação (MCD) e lançado em setembro de 2024, essa prática no país demonstra um enorme potencial, ainda não plenamente explorado. O estudo oferece uma análise detalhada das doações no Brasil, organizando informações já existentes para traçar uma visão mais ampla e profunda do cenário atual.
O Termômetro da Doação é uma iniciativa inovadora no campo da filantropia, pois não se baseia na coleta de novos dados, mas na sistematização de informações já disponíveis sobre doações no Brasil. Erika Sanchez Saez, membro do comitê coordenador do MCD, descreveu o estudo como uma ferramenta poderosa para entender o ecossistema de doações no país. “A ideia é utilizá-lo a cada dois anos para monitorar a evolução da doação”, explicou.
A criação do Termômetro foi fundamentada em cinco diretrizes estabelecidas pelo MCD, que servem como base para a análise. Essas diretrizes englobam desde a prática da doação em si até aspectos mais amplos que ajudam a construir e sustentar uma cultura de doação. Cada diretriz foi avaliada com uma pontuação máxima de 100%, e os resultados revelam que, embora a cultura de doação esteja progredindo, ainda há muitos obstáculos a serem superados.
A prática de doação no Brasil atingiu 56% no Termômetro, um número que, embora mostre progressos, reflete que há muito a ser desenvolvido. Entre os indicadores analisados estão o volume de doações realizadas por pessoas e empresas, sua representatividade no PIB, a quantidade de doadores e a frequência das doações.
Outro dado significativo analisado foi o “ticket médio” das doações, tanto por indivíduos quanto por empresas, ou seja, o valor médio que cada pessoa ou organização doa. A pesquisa também considerou a quantidade de pessoas e empresas que fazem ou promovem o trabalho voluntário, uma prática muitas vezes associada ao ato de doar. Esses fatores mostram que, embora haja uma base para o crescimento da filantropia, há um espaço considerável para expandir a consciência sobre a importância e os benefícios das doações no Brasil.
Um dos aspectos mais importantes levantados pelo estudo é a análise do comportamento das doações feitas por indivíduos e empresas. Enquanto a doação por indivíduos tem uma presença mais consolidada no Brasil, com muitos brasileiros participando de ações de caridade e ajuda comunitária, as doações feitas por empresas ainda têm um caminho longo a percorrer.
Empresas no Brasil podem desempenhar um papel mais relevante no desenvolvimento de uma cultura de doação. Em países onde a prática é mais consolidada, como nos Estados Unidos, as corporações assumem responsabilidades sociais, integrando a filantropia como parte de sua estratégia de negócio. No Brasil, embora haja empresas que realizam ações de impacto social, o volume dessas iniciativas ainda é limitado quando comparado ao potencial que as empresas brasileiras poderiam atingir.
O Termômetro da Doação também aponta para obstáculos que têm limitado o desenvolvimento da cultura de doação no Brasil. Entre os principais desafios estão a falta de informações claras sobre como e onde doar, a desconfiança em relação à gestão das organizações que recebem doações e a ausência de incentivos fiscais robustos para estimular tanto pessoas físicas quanto jurídicas a se engajarem mais ativamente nessa prática.
Além disso, o estudo destaca que muitas pessoas não sabem como medir o impacto de suas doações, o que pode gerar um desestímulo à continuidade de sua contribuição. A falta de transparência e comunicação eficaz sobre os resultados das doações realizadas também é um fator que inibe o crescimento dessa cultura. Sem uma narrativa clara sobre como os recursos estão sendo utilizados e qual é o impacto gerado, muitos potenciais doadores hesitam em contribuir de forma mais substancial.
A educação e a conscientização desempenham um papel fundamental no fomento de uma cultura de doação mais forte no Brasil. O estudo aponta que a introdução de temas ligados à filantropia e ao impacto social desde cedo, tanto nas escolas quanto em campanhas de conscientização pública, pode ter um impacto profundo na formação de uma nova geração mais engajada com a solidariedade.
Países com culturas de doação mais desenvolvidas investem em programas educacionais que ensinam desde a infância a importância da colaboração social e da ajuda ao próximo. No Brasil, iniciativas educacionais ainda são limitadas, mas têm potencial para serem expandidas, especialmente com o avanço da tecnologia e das redes sociais, que podem servir como canais poderosos para a disseminação de informações e a promoção de campanhas solidárias.
Nos últimos anos, a tecnologia e as redes sociais têm desempenhado um papel cada vez mais central na promoção da cultura de doação no Brasil. Plataformas digitais têm facilitado tanto a doação financeira quanto a disseminação de informações sobre causas sociais, permitindo que organizações e movimentos alcancem um público mais amplo de maneira rápida e eficaz.
O surgimento de aplicativos e plataformas específicas para doações, como Vakinha e Benfeitoria, é um exemplo claro de como a tecnologia pode ser uma aliada na expansão dessa prática no país. Além disso, campanhas virais, como o #TodosPelaCovid, que mobilizou doações em massa durante a pandemia, mostram o poder das redes sociais em engajar o público em momentos de crise.
Apesar disso, o uso dessas ferramentas ainda pode ser aprimorado, principalmente em termos de garantir a transparência das transações e a comunicação eficaz sobre os resultados das doações. As redes sociais e plataformas digitais oferecem uma oportunidade de ouro para aumentar o envolvimento das pessoas e das empresas com causas sociais, mas precisam ser bem utilizadas para consolidar essa cultura de forma duradoura.
Um dos principais fatores que pode impulsionar ou limitar a cultura de doação é a confiança que os doadores depositam nas organizações que recebem seus recursos. No Brasil, um dos grandes desafios para o crescimento da filantropia é a desconfiança de parte da população em relação ao destino das doações. Casos de má gestão, corrupção e falta de transparência podem prejudicar a imagem das organizações e afastar potenciais doadores.
Por isso, a criação de mecanismos que garantam a transparência e a prestação de contas por parte das organizações beneficiadas é essencial. A comunicação clara sobre como os recursos estão sendo usados e o impacto gerado pelas doações pode contribuir significativamente para fortalecer a confiança e, assim, estimular mais pessoas e empresas a se engajarem nesse movimento.
Plataformas de verificação de ONGs e iniciativas de auditoria independente podem desempenhar um papel importante nesse processo, dando aos doadores a segurança de que seus recursos estão sendo bem administrados e revertidos em impacto social positivo.
Embora o Termômetro da Doação mostre que a cultura de doação no Brasil continua em desenvolvimento, há sinais claros de que esse movimento está crescendo e tem um enorme potencial de expansão. Com a implementação de políticas públicas que incentivem a filantropia, aliada ao uso da tecnologia para facilitar as doações e fortalecer a transparência, o Brasil pode seguir o exemplo de países onde a cultura de doação já é parte consolidada da vida cotidiana.
O caminho para isso passa por uma transformação cultural, onde a doação seja vista não apenas como um ato esporádico, mas como uma prática contínua e integrada à vida de indivíduos e empresas. O fortalecimento de campanhas de conscientização, a inclusão de temas relacionados à filantropia no currículo educacional e o engajamento de líderes do setor privado podem ser fatores determinantes para o sucesso desse movimento.
O levantamento revela que o Brasil está no caminho certo, mas ainda precisa de esforços coordenados e estruturados para alcançar todo o seu potencial filantrópico. Com a implementação de estratégias eficazes, a cultura de doação no Brasil pode se tornar uma força transformadora na construção de uma sociedade mais justa e solidária.
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