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Os desafios do trabalho em um mundo híbrido

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Com uma parte importante da sociedade já vacinada e a retomada gradual das principais atividades econômicas, uma série de dúvidas surgem nas corporações quanto à volta do trabalho presencial e a manutenção em parte do trabalho remoto. A tendência que se nota é a adoção de uma mistura dos dois modelos em uma forma de trabalho híbrido, que cria desafios para as empresas e suas lideranças. A flexibilidade no trabalho veio para ficar, assim como os desafios para lidar com questões como produtividade, excesso de trabalho e burnout, integração de novos profissionais ao ambiente de trabalho, relacionamento entre equipes, inovação e troca de experiências, que se colocam diante da nova gestão do trabalho e devem ser resolvidas pelas companhias quanto antes. “Ainda há pouco entendimento sobre o assunto e as empresas cometem erros básicos como, por exemplo, deixar que os profissionais escolham quais dias da semana vão para o escritório”, afirma Carlos Aldan, antropólogo, sociólogo, cientista político e CEO do Grupo Kronberg, empresa especializada em desenvolvimento de líderes. Segundo ele, quando isso acontece, 80% dos profissionais escolhem ficar em casa às segundas e sextas-feiras, e apenas 18% escolhem trabalhar em home office. Isso significa que de terça a quinta-feira haverá um enorme congestionamento nas áreas comuns das empresas, como o que vivíamos antes, aumentando ainda mais a ansiedade dos profissionais na retomada das atividades presenciais.

Carlos, como o trabalho híbrido mexeu com as estruturas das empresas?

O modelo híbrido representa uma grande compensação entre os benefícios de estar no presencial – como melhor inovação, maior criatividade, fortalecimento da cultura interna e senso de pertencimento; com os benefícios de não ter que ir ao escritório como o conforto de casa, a convivência com a família e não perder tempo com deslocamentos. Estudos iniciais indicam que o trabalho híbrido, além de deixar os colaboradores mais satisfeitos, aumentaram a produtividade em cerca de 5%. Por outro lado, tem desvantagens. Pessoas em mais tempo de home office tem menores chances de serem promovidas que as presentes, porque no dia a dia não são notadas e perdem a convivência com colegas e líderes.

A Ômicron vem mudar os planos de muitas empresas de retornarem ao trabalho presencial em tempo integral ou híbrido. A Apple, por exemplo, estava determinada a ter todos seus colaboradores no escritório. Tim Cook, CEO da Apple, encontrou enorme resistência da força de trabalho que exigiu continuar trabalhando remotamente. Após várias tentativas frustradas, Tim Cook decidiu que o retorno ao trabalho presencial permanece indefinido e está oferecendo ajuda de mil dólares para cada colaborador equipar seu “escritório” em casa.

A pandemia foi a grande catalisadora desse processo?

Com certeza, a maioria das empresas no Brasil enxergava o trabalho remoto com enorme resistência antes da pandemia. A crise da Covid não nos deixa muita escolha.

Esse sistema seria implantado sem uma pandemia?

Eventual e gradualmente, penso que sim. O avanço irrefreável das tecnologias de comunicação traria e continuará trazendo e proporcionando essa mudança.

Quais os maiores desafios que o trabalho híbrido impõe para os colaboradores?

Talvez para alguns, mais horas de trabalho, dificuldade em separar tempo de trabalho e convivência de qualidade com a família. A intensidade de convivência com parceiro/parceira tem aproximado alguns casais e promovido divórcios para outros. A falta de conexão emocional presencial com os colegas gera um sentimento de perda de pertencimento, de isolamento. Os transtornos mentais aumentaram de forma extremamente preocupante como resultado dos medos impostos pela pandemia: perda de saúde, da própria vida, perda de entes queridos, perda de segurança financeira, de emprego, da rotina que já se foi e não voltará a ser o que era e até mesmo perda de identidade; e também pelo distanciamento social. Para uma espécie hipersocial como a nossa, o isolamento tem um impacto devastador para nossa saúde mental.

E para as empresas?

Com o tempo, várias desvantagens do trabalho remoto ficaram mais evidentes. Segundo pesquisas com cerca de 16 mil colaboradores da Microsoft, de dezembro de 2019 a junho de 2020, o trabalho remoto provocou a queda na cooperação entre áreas, silos aumentaram e ficaram mais densamente conectados, a transferência de conhecimento ficou prejudicada, houve redução na produtividade e na comunicação síncrona e aumento na comunicação assíncrona, maior dificuldade para transmitir e processar comunicação complexa, colaboradores passam mais tempo conectados e transferência de conhecimento ficou prejudicada. Com o distanciamento, perdemos também a transferência e vivência das culturas das corporações, corremos o risco de sermos menos inovadores e criativos.

Qual o papel dos líderes para essa implementação?

O líder tem papel fundamental em manter os valores, a cultura da organização, que já era um desafio no trabalho presencial. A Kronberg tem um programa para líderes que explora técnicas e instrumentos relevantes de liderança no trabalho remoto, com o objetivo de fortalecer a competência de líderes para atrair e reter talentos, aumentar o engajamento, a produtividade e fortalecer a cooperação de times, os valores e cultura da organização.

Quais experiências podem ser desastrosas quando se fala em trabalho híbrido?

Uma delas é dar opção aos colaboradores sobre quais dias preferem trabalhar no escritório. Imaginem se perguntamos para as pessoas, se optarmos por HO durante dois dias por semana, que dias escolheriam? Claro! Vão escolher segunda e sexta! Apenas 18% das pessoas escolhem as quartas-feiras e 64% escolhem as sextas-feiras para o trabalho em casa (HO). Ou seja, 82% virão nas quartas-feiras e apenas 36% nas sextas-feiras.

Isso significa que se há espaço para acomodar todo mundo nas quartas-feiras, mais da metade do escritório estará vazio nas sextas e segundas. Em contrapartida, nas quartas: elevadores, cozinhas, corredores, portas ficarão abarrotadas… Congestionamentos dessa natureza, que eram normais antes, na atual preocupação com Covid, criarão maior preocupação, ansiedade e tensão.

Imaginem um time de 8 pessoas, das quais 4 estão no escritório e 4 em Home Office. Como esse time se reunirá? Por Zoom ou conference call. Para aqueles que estão no escritório, ficará a pergunta por que estou aqui se estamos nos reunindo por Zoom? Outra experiência que pode ser desastrosa é a de líderes começarem as reuniões já cobrando tarefas, sem nenhuma conexão com os desafios que seus colaboradores estão enfrentando nessa pandemia.

O que fazer para que esses problemas não peguem as empresas “de calças curtas?”.

Desenvolver novas dimensões e competências de liderança para essa realidade incerta, desconhecida e ambígua. Há várias empresas clientes da Kronberg cientes dessa necessidade de upskilling de suas lideranças e investindo em nossos programas de liderança e reskilling da linha de frente para que possam responder às mudanças de expectativas, comportamentos, necessidades e desejos de todos os stakeholders nesse ambiente cada vez mais disruptivo e turbulento de negócios.

Como o Grupo Kronberg tem lidado com essas questões?

Temos desenvolvido programas de liderança, vendas e atendimento a clientes, que endereçam os novos marcadores de sucesso profissional na realidade da nova economia e da pandemia. As dimensões de liderança inspiradora, transformacional, adaptativa e coaching, passam a ser indispensáveis para as empresas e líderes manterem relevância organizacional e profissional nesse terreno tão desafiador que passamos a operar. Como redesenhar os processos e comportamentos para apoiar a organização à distância?

A gestão baseada em input é questionável mesmo no trabalho presencial, mas funcionava razoavelmente bem para algumas empresas. No HO é impraticável! A gestão baseada no output já era mais eficaz e agora é a única opção inteligente de escolha. Para isso a preparação da liderança que em muitos casos ainda está presa à velha escola de liderança, se torna uma necessidade imprescindível e urgente.

Em resumo, temos ajudado empresas clientes a desenvolverem a liderança-coach e feedback, liderança inspiradora, a fazerem assessments 360, desenvolverem a inteligência emocional para toda a empresa, a implementarem sistemas de gestão de performance, coleta e análise de dados alinhados à realidade de negócios atual. Ajudamos também a criarem um propósito compartilhado, estabelecerem conexões mais profundas, a conhecerem cada membro da equipe como pessoa e, em um mundo cada vez mais diversificado e híbrido, como atrair habilidades híbridas e lidar com diversidade e inclusão.

Entendemos que esse trabalho com essas dimensões, competências e práticas passam a ser indispensáveis para que o trabalho híbrido e em HO seja efetivo e produtivo. Além disso, nossos programas de saúde mental que já eram implementados desde 2002, passaram a ter uma enorme demanda nos dois últimos anos. Nossas pesquisas com 15000 líderes e profissionais de linha de frente indicam que 76% esperam apoio emocional de seus líderes e organizações.

Os transtornos emocionais que já eram um problema de saúde global se exacerbaram dramaticamente com a pandemia e, infelizmente, continuarão a representar um desafio gigantesco para as organizações nas próximas décadas. A boa notícia é que há novas ciências como a da inteligência emocional, da positividade e a neurociência, que nos emprestam instrumentos, intervenções e exercícios validados que, demonstradamente, fortalecem nossa resiliência emocional que nos ajuda a proteger a saúde mental de forma que possamos prosperar mesmo em ambientes calamitosos como os atuais. São esses instrumentos e intervenções que desenvolvemos em nosso programa de saúde mental para ajudar nossos clientes a lidar com esses desafios. E quanto às decisões sobre o trabalho híbrido, presencial ou em casa, a Kronberg sugere, ao contrário do costumeiro “agile”, avançarmos com cuidado e lentamente fazendo experimentações e observando as experiências de empresas em outros países.

É o grande assunto do mundo corporativo no momento?

Sim, além do desafio de saúde mental, da falta de talentos, dos problemas de logística e da chamada grande resignação, ficamos com o desafio adicional de codificar os modelos de trabalho ideais para os tempos atuais. Enquanto isso não for feito, além das experimentações para endereçar o que desconhecemos, devemos usar os conhecimentos que já temos sobre a questão do trabalho híbrido.

Sabemos quando o presencial é insubstituível com eficácia. Por exemplo, as tarefas com trocas relacionais que envolvem inovação, criação de conhecimento e atividades nas quais as organizações têm processos recentemente implementados. Essas atividades dependem do desencadeamento criativo, momento a momento, na medida que as pessoas se envolvem em interações espontâneas intensas.

Tarefas relacionais que são melhor executadas presencialmente: Decisões importantes de negócios; Brainstorm; Inovação; Negociações; Feedbacks sensíveis; Compartilhamento de conhecimento; Onboarding; Pertencimento; Valores e Cultura.

E o que pode ser feito no digital com eficácia? Tarefas com trocas transacionais, rotineiras e padronizadas são apropriadas para as interações digitais. Exemplos: desenvolvimento de software, call centers, vendas internas e funções de apoio – SAC, marketing, TI, finanças, etc. Estima-se que a economia de espaço de escritório com o trabalho remoto dessas funções, seja de um terço.


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