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Lula ainda é favorito… como explicar?

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Nos primeiros meses de 2025, o Brasil vive uma dicotomia política quase esquizofrênica: de um lado, um presidente que acumula índices de reprovação altos e crescentes; de outro, um mesmo presidente que aparece como favorito para vencer as eleições presidenciais de 2026 em praticamente todos os cenários viáveis. As pesquisas AtlasIntel e Datafolha, ambas recentes, apontam para uma realidade difícil de decifrar com a lógica convencional. Como é possível que alguém com mais da metade do país considerando sua gestão ruim ou péssima continue sendo, isoladamente, o nome mais forte para disputar a reeleição?.

O retrato atual é de um governo que não empolga e que encontra dificuldades em temas como carga tributária, segurança pública, responsabilidade fiscal e combate à corrupção. A insatisfação é notória entre homens, evangélicos, pessoas com escolaridade média e moradores do Sul. Ao mesmo tempo, Lula ainda consegue sustentar uma base relevante entre mulheres, nordestinos, idosos e eleitores com menos instrução formal. No meio disso, paira uma verdade incômoda: o petista segue sendo o único político com densidade eleitoral nacional, carisma conhecido e recall consolidado.

A oposição, embora vocal e ativa nas redes sociais, não consegue apresentar uma alternativa unificada e viável. Bolsonaro está inelegível, outros nomes da direita tradicional estão dispersos, e as novas figuras que surgem — como Tarcísio de Freitas, Romeu Zema ou até Gusttavo Lima — ainda têm trajetórias frágeis no imaginário do eleitorado médio. Tudo isso ajuda a explicar o paradoxo: Lula está mal, mas segue favorito.

A força da máquina e o peso do nome

Lula ainda é o nome político mais reconhecido do Brasil. Isso não é só questão de popularidade, mas de estrutura. Com décadas de carreira, três mandatos presidenciais e forte enraizamento no Nordeste e nas camadas populares, o ex-metalúrgico comanda um partido que conhece como poucos os caminhos da política institucional. O PT continua tendo bancadas relevantes, presença em sindicatos, movimentos sociais e administrações locais. Esse aparato é uma vantagem enorme em um país onde a disputa política é territorial, emocional e baseada em fidelidade histórica. Mesmo com críticas, o nome “Lula” ainda é sinônimo de passado de bonança para milhões de brasileiros. A força do nome soma-se à força da máquina pública, cuja atuação — direta e indireta — ajuda a manter o petista em evidência como protagonista natural do processo eleitoral.

A fragmentação do campo adversário

Se por um lado Lula tem uma base consolidada, por outro a oposição parece desarticulada e desprovida de uma liderança clara. Jair Bolsonaro, seu único rival realmente competitivo nas últimas eleições, está inelegível e cercado por problemas judiciais que envolvem tentativa de golpe, uso indevido da estrutura pública e organização criminosa. Seus herdeiros políticos, como Tarcísio de Freitas e Eduardo Bolsonaro, não têm o mesmo magnetismo eleitoral. Outros nomes como Romeu Zema, Ronaldo Caiado e até Gusttavo Lima figuram como possíveis candidatos, mas todos ainda carecem de musculatura nacional. Sem um antagonista forte, Lula ocupa sozinho o espaço do “presidenciável competitivo”, mesmo que seja alvo de críticas contundentes. A política, como a natureza, não gosta de vácuos — e no momento, esse vácuo de liderança na oposição favorece o petista.

A blindagem simbólica das políticas sociais

A base histórica do lulismo está centrada em políticas sociais e redistributivas. Ainda que setores médios e empresariais tenham cada vez mais restrições à condução econômica do governo, há um núcleo duro do eleitorado que associa o nome de Lula à melhoria de vida, acesso a bens de consumo, moradia e programas como o Bolsa Família. Essas iniciativas, mesmo que desgastadas, mantêm alto poder simbólico. O governo atual tenta resgatar esse imaginário, turbinando programas sociais e reforçando o discurso de combate à pobreza. Isso, por si só, não garante uma aprovação majoritária, mas ajuda a sustentar o patamar mínimo de 30% a 40% de apoio — mais do que suficiente para levar alguém ao segundo turno em um cenário fragmentado. A memória emocional de um tempo em que “o pobre andava de avião” ainda tem valor eleitoral, mesmo que a realidade atual não reflita isso.

A rejeição mútua como estratégia eleitoral

A política brasileira dos últimos anos vem sendo marcada menos por amor do que por ódio — ou, para ser mais técnico, por rejeição. O que mobiliza o eleitor não é tanto a esperança em um projeto, mas o medo ou aversão ao outro lado. Lula e Bolsonaro simbolizam esse binarismo afetivo. E mesmo com a ausência de Bolsonaro no cenário de 2026, a direita ainda se apresenta sob o manto do bolsonarismo, com seus valores morais rígidos, discurso de confronto institucional e visão de mundo polarizadora. Esse campo é fortemente rejeitado por parte do eleitorado urbano, feminino e universitário, que vê no PT um mal menor ou mesmo um bastião contra retrocessos civilizatórios. Assim, mesmo sendo criticado por muitos, Lula pode continuar vencendo porque uma parcela do país rejeita ainda mais a alternativa oferecida. Vence, portanto, por exclusão.

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A ausência de um projeto alternativo de país

Criticar Lula é relativamente fácil. Mas apresentar uma proposta coerente, nacionalmente compreensível e viável para substituí-lo tem sido a grande falha dos opositores. Tarcísio de Freitas, por exemplo, é eficiente como gestor e ganhou projeção ao governar São Paulo com perfil técnico. No entanto, fora do Sudeste, sua imagem é frágil e genérica. Romeu Zema, em Minas Gerais, é discreto demais para despertar paixões. Eduardo Bolsonaro é rejeitado por metade do país. Gusttavo Lima, por mais popular que seja como cantor, ainda é uma incógnita política. Enquanto os adversários testam narrativas ou ajustam seus discursos para se tornarem conhecidos, Lula já está no imaginário nacional. Seu projeto pode não agradar a todos, mas é conhecido. E em política, o conhecido — mesmo que imperfeito — ainda vale mais do que o incerto.

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A vantagem de já estar no poder

Estar no governo é um trunfo formidável em qualquer democracia. Controlar o orçamento, definir prioridades de investimento, indicar cargos estratégicos e ocupar diariamente o noticiário com agendas públicas é uma vantagem monumental. Em um país com baixa escolaridade média e forte dependência de programas estatais, essa presença constante pode consolidar apoios. Além disso, Lula domina a retórica pública, sabe se comunicar com seu eleitorado e tem habilidade de articulação política rara. Mesmo enfrentando crises — como as relacionadas à economia, à segurança e à cobrança por responsabilidade fiscal — o petista ainda consegue pautar o debate. É ele quem reage, rebate, propõe. Os demais, por ora, apenas acompanham. Essa capacidade de protagonismo, somada ao uso legítimo da estrutura do Estado, reforça a sensação de que Lula continua sendo “o cara da vez”.

A naturalização do descontentamento

Talvez a explicação mais incômoda seja também a mais realista: o brasileiro está cansado. O descrédito generalizado nas instituições, a corrosão da confiança na política e a fadiga democrática fazem com que boa parte da população simplesmente normalize o descontentamento. Ou seja, é possível estar insatisfeito com o governo, reclamar dos impostos, da segurança, da corrupção — e mesmo assim votar em Lula. Porque é o que existe. Porque já se conhece. Porque a alternativa pode ser pior. Essa naturalização do desânimo cria um eleitorado cínico, mas pragmático. Ele pode reprovar, mas ainda assim apertar o 13. A crítica deixa de ser impeditivo de voto e passa a ser parte do processo. É a política como ela é, não como gostaríamos que fosse. E enquanto ninguém oferecer um projeto novo, claro e exequível, Lula continuará sendo o preferido — ainda que seja, paradoxalmente, o mais criticado.


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