A farsa do #MeToo contra Charlie Rose
Oito anos depois de ter sido lançado à fogueira moral do #MeToo, Charlie Rose emerge, ainda que tardiamente, debaixo das cinzas de um cancelamento que nunca lhe deu direito a defesa. As três mulheres que levaram adiante o processo — Katherine Brooks Harris, Sydney McNeal e Yuqing Wei — agora admitem que “não havia más intenções” e que tudo “pode estar sujeito a interpretação”. Uma frase que, no auge da histeria coletiva de 2017, teria sido recebida com o fervor revolucionário que se reserva aos traidores da causa. Mas em 2025, com a poeira baixando e a adrenalina ideológica enfim decantada, ela soa como um epitáfio para um dos episódios mais emblemáticos da era do cancelamento instantâneo.
O caso Rose, assim como tantos outros daquele período, foi menos sobre justiça e mais sobre fervor. Não justiça no sentido exigente, jurídico, lento, complexo; mas justiça emocional, digital, de manchete. Oito mulheres o acusaram naquele momento, e bastou. A CBS correu para demiti-lo. Segmentos inteiros da opinião pública correram para exorcizá-lo. Ninguém queria ficar para trás no campeonato moral. E quando a paranoia coletiva sobre poder, gênero e celebridade atingia o clímax, a versão dos fatos não precisava ser examinada — precisava ser útil. A utilidade política era o novo critério de verdade.
“Charlie Rose virou símbolo não porque seu caso fosse o mais chocante, mas porque era útil: homem poderoso, branco, veterano, de uma era televisiva que muitos queriam enterrar. E, quando símbolos entram em cena, os indivíduos deixam de ser indivíduos — tornam-se personagens de uma narrativa mais ampla.”
Porque é isso que Rose simbolizou para muita gente: mais do que um jornalista respeitado, um troféu. Um aviso exemplar. A carreira de décadas, os prêmios, as entrevistas históricas — nada disso protegeu o apresentador do furacão moral. E, em retrospecto, tampouco serviu para provar qualquer coisa. As três mulheres que levaram o caso até o tribunal agora dizem que, com as trocas de provas e as análises mais minuciosas, perceberam um universo que não cabia na narrativa rígida do “predador” contra “vítimas”. Resolveram o processo, reconheceram ambiguidades e afirmaram explicitamente: não atribuem “mau motivo ou má intenção” a Charlie Rose.
A frase causa um estrondo, não pelo conteúdo em si, mas pela admissão tardia de que o caso nunca foi tão claro quanto se pregou. E que, talvez, a justiça apressada — aquela que opera no Twitter antes de operar nos tribunais — cobra um preço que ninguém gosta de ver na conta final.
Quando a narrativa atropela os fatos
O ponto mais desconfortável dessa história — e por isso mesmo o mais necessário — é justamente a análise sobre como movimentos sociais, quando transformados em panfletos digitais, podem se descolar de sua finalidade original. O #MeToo teve méritos inegáveis ao expor casos reais de abuso que se escondiam sob pactos de silêncio. Mas, ao ganhar tração midiática, converteu-se também num tribunal paralelo, onde nuances eram descartáveis e versões conflitantes eram tratadas como insultos ideológicos. Ou você “acreditava” ou você era cúmplice.
Charlie Rose virou símbolo não porque seu caso fosse o mais chocante, mas porque era útil: homem poderoso, branco, veterano, de uma era televisiva que muitos queriam enterrar. E, quando símbolos entram em cena, os indivíduos deixam de ser indivíduos — tornam-se personagens de uma narrativa mais ampla. E personagens não têm direito a contradições.
O recuo das três mulheres — após análise cuidadosa de provas, trocas de informações e confronto de versões — desmonta esse teatro. Mostra como a política das certezas é rasa e perigosa. E mostra, sobretudo, como vidas reais podem ser trituradas por impulsos coletivos que envelhecem mal.
Nenhuma dessas reflexões é confortável. Elas exigem admitir que, sim, o movimento ajudou muitas pessoas — mas também cometeu excessos. Que sim, assédio existe — mas nem todo episódio confuso é assédio. Que sim, há vítimas — mas nem sempre são aquelas apontadas na primeira manchete. A realidade, essa que não cabe em hashtags, raramente oferece narrativas perfeitas.
Hoje, com o processo arquivado e o nome de Rose parcialmente reabilitado — ainda que tardiamente e jamais de forma plena — fica evidente o custo humano do imediatismo moral. Enquanto isso, o show digital segue, sempre em busca de um novo culpado para a catarse coletiva. Charlie Rose não foi o primeiro a ser esmagado pela fome de punição pública. Mas seu caso talvez seja um dos mais emblemáticos do quão longe fomos, e do quanto ainda custa reconhecer quando erramos.

Se 2017 foi o ano da cruzada, 2025 começa a ser o ano do inventário. E nada é mais revelador do que quando as próprias acusadoras, agora mais maduras, mais informadas e menos pressionadas pelo clima político, afirmam aquilo que ninguém ousava dizer: que talvez tudo aquilo tivesse muito mais complexidade do que permitiam as manchetes. E que, no final, restou uma pergunta incômoda — e inevitável: quem, exatamente, foi injustiçado nessa história?
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Emanuelle Plath assina a seção Sob a Superfície, dedicada ao universo 18+. Com texto denso, sensorial e muitas vezes perturbador, ela mergulha em territórios onde desejo, poder e transgressão se entrelaçam. Suas crônicas não pedem licença — expõem, invadem e remexem o que preferimos esconder. Em um portal guiado pela análise e pelo pensamento crítico, Emanuelle entrega erotismo com inteligência e coragem, revelando camadas ocultas da experiência humana.




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