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Maria Francisca Mauro fala da cirurgia bariátrica

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No último dia 11 de outubro foi o Dia Mundial da Obesidade (doença que acomete 19,8% da população nacional, segundo dados recentes do Ministério da Saúde). Caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, a obesidade pode ser causada por fatores nutricionais, fisiológicos, genéticos, psicológicos e comportamentais. Como forma de tratamento e controle da doença, a cirurgia bariátrica se tornou uma opção cada vez mais popular. De acordo com informações da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, a procura pela cirurgia aumentou 47% em apenas cinco anos. Apesar de ser uma alternativa eficiente, o método nem sempre apresenta resultados definitivos, principalmente se o paciente não recebe o apoio psiquiátrico antes, durante e depois do procedimento. “Dados apontam que cerca de 40% das pessoas que se submeteram a essa intervenção podem ter algum grau de reganho de peso, incluindo a recuperação total do que foi perdido”, explica a psiquiatra Maria Francisca Mauro, do grupo Programa de Obesidade e Cirurgia Bariátrica do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF/UFRJ). Em mesa apresentada durante o Congresso Brasileiro de Psiquiatria, realizado no dia 09 de outubro, no Riocentro, a especialista debateu sobre transtornos alimentares e saúde mental pós-bariátrica. “Hoje existe um grande preconceito contra as pessoas com obesidade”, afirma a psiquiatra.

Doutora, o que é o grande desencadeador da obesidade em todo mundo?

Atualmente, o aumento da obesidade se deve ao “ambiente obesogênico”. Isto quer dizer que cada vez mais as pessoas se movimentam menos, com as extremas facilidades determinadas pela tecnologia em suas rotinas e estão cercadas por uma alimentação extremamente palatável (rica em gordura e açúcar). Portanto, o que observamos não pode ser atribuído a alguma mudança genética da população, nem a algum marcador de “adoecimento” distinto, mas a questões de comportamento.

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Como o fator psicológico interfere para o surgimento da obesidade?

Precisamos compreender que a obesidade apresenta marcadores genéticos, ou seja, influência da transmissão de informações genéticas familiares, em 40-60% dos casos. De tal forma que a obesidade não pode ser caracterizada como exclusivamente uma expressão do comportamento. Considerando a perspectiva comportamental esta interfere de forma importante quanto aos hábitos, ou seja, manter uma rotina de sedentarismo e um alto consumo energético para além das necessidades diárias. Assim, este ciclo de consumo alimentar maior que o gasto vai determinando o aumento de peso. Alguns fatores psicológicos que contribuem para o excesso de peso são: quadros de depressão, problemas relacionados ao comportamento alimentar (descontrole alimentar, compulsão alimentar) e comportamentos que caracterizem maior impulsividade (“agir sem planejar ou que se ponderem as consequências”).

Quais são os principais tratamentos para essa doença?

Os principais tratamentos para obesidade devem levar em consideração sua característica multifatorial, ou seja, abordar o indivíduo fisicamente e quanto ao seu comportamento. Assim deve-se realizar uma avaliação clínica detalhada, em que se verifique se a pessoa tem problemas clínicos desencadeados pela obesidade como a hipertensão arterial sistêmica, diabetes, apneia do sono, algum problema de “colesterol” para que se intervenha nestas questões. Na sequência, de acordo com a intensidade da obesidade, prescrever medicamentos que possam contribuir para a perda de peso. Em associação, intervenções quanto à mudança de hábitos, alimentação e prática de exercício físico. Quanto ao comportamento, deve se verificar a ocorrência de quadros como depressão, transtorno da compulsão alimentar, diagnósticos psiquiátricos que possam estar impactando no ganho de peso. Nos casos graves (IMC≥35 Kg/m2 com doença clínica associada ou IMC≥40 kg/m2) que após a tentativa deste conjunto de medidas, por mínimo dois anos, não houve resposta ao tratamento clínico, pode ser considerada a cirurgia bariátrica. Verifique que o tratamento não é aquela máxima que as pessoas acreditam de “fechar a boca” e “fazer exercício”, mas necessita de uma abordagem mais complexa para que se obtenham melhores resultados.

Como a mente pode enganar alguém que tenha obesidade e que não admite?

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Devemos ter cuidado com esta afirmativa. Há um grupo de pessoas com obesidade que não tem a necessidade de perder peso, pois, estão sem qualquer doença clínica e se sentem bem quanto ao seu corpo. Portanto, precisamos estar atentos quanto ao estigma de que todos precisam estar “magros” e que “obesos” se caracterizam por uma preguiça ou falta de vontade. Dentro do grupo que procura tratamento precisamos entender qual é o seu perfil para realizar um tratamento dentro da sua necessidade. Na realidade, a “mente” precisa ser compreendida dentro da história daquela pessoa, em que momento houve uma evolução para estar acima do peso, pois, se nos restringirmos a acreditar que a pessoa está se enganando estaremos reforçando a discriminação que pessoas com obesidade sofrem cotidianamente.

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Em que momento a obesidade se torna mórbida, ou melhor, quais os sinais mais patentes e que o paciente não dá bola?

Na realidade, o nível clínico que configura a obesidade como grave é o índice de massa corporal (IMC) ≥ 40 Kg/m2. Quanto à pessoa “não dar bola” precisamos entender qual foi sua evolução para este quadro grave, pois, assim poderemos realizar um tratamento mais efetivo, ao invés de culpar a pessoa com obesidade. Hoje existe um grande preconceito contra as pessoas com obesidade, as cerceando e apontando, como se fossem “fracassadas” por não terem conseguido controlar seu peso.

A operação bariátrica é a única saída quando chega a esse ponto?

A cirurgia bariátrica pode ser uma alternativa de tratamento após ter se realizado o tratamento clínico de forma correta, por no mínimo dois anos. Antes de se indicar a cirurgia bariátrica deve-se fazer a tentativa não das “dietas da moda” ou “tratamentos milagrosos”, mas de um tratamento com profissionais habilitados.

Depois da operação, alguns pacientes têm o chamado reganho de peso. Por que isso acontece?

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O reganho de peso após a cirurgia bariátrica apresenta uma etiologia complexa, que pode ter influência genética, da técnica cirúrgica que foi realizada, da pessoa não ter realizado as mudanças de hábitos alimentares e prática de exercício, assim como de alguns comportamentos. Quanto aos comportamentos, os que se evidenciam impactando neste desfecho são depressão, descontrole alimentar, beliscamento e a pessoa apresentar traços de impulsividade.

Existe uma reeducação alimentar para que o peso seja mantido e quais os maiores empecilhos para que esse plano não seja bem-sucedido?

Sim, existe um acompanhamento nutricional específico para os pacientes de pós-operatório. O maior empecilho é a pessoa não entender que mesmo operada, após perder peso, sua “obesidade” se mantém. Ou seja, será preciso seguir seu tratamento a longo prazo. A cirurgia bariátrica que proporcionou sua perda de peso precisará ser cuidada para sempre.

Quais países estão com um nível preocupante de obesos em sua população ativa?

Os países com maiores índices de obesidade são os Estados Unidos, Brasil e Índia.

Em que momento o médico psiquiatra passa a ser um diferencial nesse ecossistema?

O médico psiquiatra pode contribuir para que pacientes com obesidade grave sejam avaliados e se verifique a presença de algum comportamento que esteja impactando na dificuldade para a perda de peso. Não deve ser uma avaliação de exceção, mas uma rotina para pacientes com obesidade grave.

Qual o papel dos meios de comunicação para uma melhor informação e esclarecimento sobre esse assunto?

Os meios de comunicação assumem papel fundamental ao informar a população quanto à complexidade do tema, não realizando sensacionalismo com as pessoas que sofrem com obesidade ou reforçando o preconceito.

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Última atualização da matéria foi há 2 anos


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