Cinema é mistério para Cláudia da Natividade
Cláudia da Natividade é formada em Filosofia, além de ser mestre em Ciências Políticas. É sócia-fundadora da Zencrane Filmes e membro da Diretoria do Sindicato da Indústria Audiovisual do Paraná. Em 2007 publicou o livro de arte “Brasil Rupestre – arte pré-histórica brasileira”, levando a Zencrane a transformar-se também em editora. Além dos projetos audiovisuais, Cláudia trabalhou também como coordenadora de atividades de suporte para lançamento de produtos e planejamento de merchandising publicitário e promocional para agências de publicidade no Paraná e em São Paulo. Na década de noventa morou na Itália e na Inglaterra, onde fez especialização em História e Ciências Políticas e trabalhou na área de projetos de Cooperação Internacional. Sua primeira produção de longa-metragem de ficção, “Estômago”, arrebatou mais de 30 prêmios em mais 15 países, e foi o filme brasileiro mais premiado do ano de 2008. “Mundo Cão” lançado em 2016, foi outro filme produzido pela Zencrane que obteve grande repercussão. “Ser produtor de cinema é árduo. Transformar ideias em projetos e depois em filmes é um processo extremamente trabalhoso e que demanda muito tempo e energia. No Brasil produzir filmes têm as mesmas dificuldades dos outros setores produtivos da economia: excesso de burocracia, excesso de Estado, muita regulamentação, muito intervencionismo, carga administrativa e burocracia exageradas”, afirma a produtora.
Cláudia, o que é ser um produtor de cinema no Brasil?
Ser produtor de cinema é árduo. Transformar ideias em projetos e depois em filmes é um processo extremamente trabalhoso e que demanda muito tempo e energia. No Brasil produzir filmes têm as mesmas dificuldades dos outros setores produtivos da economia: excesso de burocracia, excesso de Estado, muita regulamentação, muito intervencionismo, carga administrativa e burocracia exageradas, problemas estruturais. Além disso, temos ainda um agravante em relação aos demais setores – fazemos produtos, mas também arte, e isso não é um bem de consumo essencial na visão de muitos.
Quais são os erros que um produtor jamais pode cometer em sua carreira?
Subestimar a fase de preparação de um filme e não ter uma visão global do projeto. Uma visão que comece no acompanhamento do desenvolvimento do roteiro e que chegue até a correta estratégia de difusão da obra realizada. Uma preparação malfeita e uma visão incompleta dos processos acarretam erros graves que podem levar, inclusive, ao falimento econômico dos projetos e da produtora.
Você é formada em Filosofia e Ciências Políticas. O que sua formação lhe ajuda no seu ofício atual?
Para meu ofício atual acredito que não exista melhor preparação do que a humanista. Trabalho com pessoas e com suas particularidades, com estratégia, com gestão, com pesquisa, conhecimentos históricos, com propriedade linguística, projetos, raciocínio lógico, política e com representação, inclusive internacional. Uso na produção cinematográfica todas as ferramentas de formação que tive ao longo dos meus estudos.
Qual o real poder que um produtor de cinema tem em um filme produzido no Brasil?
O poder de fazer as coisas acontecerem através do uso de todas as atribuições acima relacionadas.
Captar recursos é a principal dificuldade para se produzir filmes no Brasil?
Captar recursos é extremamente difícil em qualquer lugar do mundo, não apenas no Brasil. No Brasil o que dificulta é que não somos um país meritocrático. Não existem modalidades ligadas ao financiamento automático das produtoras e, com isso, ficamos condenados a um eterno esforço de recomeço a cada projeto.
Você ainda encontra empresas que continuam reticentes, em associar a sua marca a roteiros que contêm assuntos que ainda são tabus ou polêmicos, ou isso nunca aconteceu com a sua produtora?
As marcas investem pouco em cinema no Brasil, mesmo existindo políticas de renúncia fiscal que promovam este tipo de investimento em divulgação. Muitas grandes empresas direcionam seus recursos de renúncia fiscal para as próprias fundações ou ainda para outros setores ligados ao esporte e entretenimento. Os recursos de renúncia fiscal investidos no cinema são ainda bastante escassos em relação ao potencial. Com esse cenário de investimento, o problema do tabu ou temas polêmicos acaba sendo pouco relevante.
A sua produtora Zencrane, trabalha na pesquisa e desenvolvimento de projetos de transmídia cultural. Fale um pouco mais sobre isso.
Os produtos culturais transmídia acabam acontecendo naturalmente porque costumamos desenvolver projetos in house – todos partem de pesquisa interna realizada. Isso facilita muito o aprofundamento dos temas tratados, além de abrir muitas possibilidades e diferentes olhares sobre esse mesmo tema. Com isso se torna mais fácil realizar projetos para diferentes plataformas, meios de difusão e públicos.
Quando surgiu o interesse pelas produções editorais?
Da formação humanista, do meio acadêmico, do amor pela pesquisa e pela leitura.
Como você acredita que a internet interferiu na produção cinematográfica?
Todo o futuro da produção e difusão cinematográfica está na internet. Antes era um novo e extremamente poderoso meio de difusão, agora está modificando a própria linguagem cinematográfica e as narrativas audiovisuais. Espero que a universidade brasileira, que costuma ser bastante atrasada em relação às novas pesquisas em diferentes setores, se atente ao potencial de linguagem que se abre com a produção cinematográfica direcionada para internet.
Em novembro de 2015, o filme “Estômago” dirigido pelo seu esposo Marcos Jorge e produzido por você, entrou na lista feita pela Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) como um dos 100 melhores filmes brasileiros de todos os tempos. Quando se produz uma obra cinematográfica dessa envergadura, se tem a noção ou feeling que ela se tornará influente de alguma forma?
Sempre começamos um projeto com essa vontade, mas o cinema é um mistério. Muitos fatores diferentes precisam estar alinhados para se conseguir um filme como “Estômago”, não depende só da gente. Até um dia chuvoso na estreia de um filme pode fazer muita diferença.
Última atualização da matéria foi há 2 anos
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