Martinho da Vila fala sobre samba e Nara Leão
Nascido em Duas Barras, filho de lavradores da Fazenda do Cedro Grande, Martinho José Ferreira mudou-se para o Rio de Janeiro com apenas quatro anos. A carreira artística surgiu para o grande público no III Festival da Record, em 1967, quando concorreu com a música “Menina Moça”. O sucesso veio no ano seguinte, na quarta edição do mesmo festival, lançando a canção “Casa de Bamba”, um dos clássicos do sambista. É, desde 2005, filiado ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Em 2009, foi lançado o documentário “O Pequeno Burguês – Filosofia de Vida”, que conta um pouco da vida artística e particular do artista. Embora internacionalmente conhecido como sambista, com várias composições gravadas no exterior, Martinho da Vila é um representante da MPB sendo um compositor eclético que criou músicas dos mais variados ritmos brasileiros. “Sempre fui livre. Escrevi num samba: “A liberdade é um sonho de quem permitiu se aprisionar”. Criei o grupo para, sendo proprietário de uma editora musical, outra literária, um selo fonográfico e uma produtora artística, poder ter o domínio das minhas criações. (…) O agradável é que o samba, antes perseguido pelo poder, hoje é assediado por ele e entre os sambistas que antes eram todos pobres e discriminados, há muitos bem-sucedidos e conceituados”, afirma o renomado cantor, compositor e escritor.
Quando o senhor iniciou a carreira, imaginou chegar onde chegou?
Não, mesmo com muitas pessoas me dizer vaticinado, como o meu compadre Ricardo Cravo Albim e o Marcus Pereira, um publicitário que apostou em mim.
Quem o inspirou fazendo pensar: “puxa um dia eu quero ser igual ou até melhor que esse cara?”.
Não me espelhei em ninguém e nunca tive tal pensamento.
A qualidade musical em nosso país melhorou ou piorou, desde que o senhor lançou seu primeiro álbum homônimo em 1969 até o último ‘Pequeno Burguês’ de 2008?
Melhorou muito. Quando comecei, no Brasil predominava a música americana e o iê-iê-iê. A Bossa Nova, rica em harmonia, era poeticamente alienada, o que mudou mais tarde, com Nara Leão.
O senhor é filiado ao PCdoB desde 2005. Sinceramente acredita na política nacional?
Na democracia tem-se que valorizar a política, apesar dos pesares.
O Governo do presidente Lula está aprovado na sua concepção?
Está. Na minha e na grande maioria dos brasileiros. Em termos internacionais, nunca tivemos um presidente com maior prestígio.
Como foi vender mais de 1 milhão de cópias com o CD “Tá Delícia, Tá Gostoso”, talvez o mais representativo de sua carreira?
O disco mais representativo da minha carreira foi o primeiro LP, pois, aplicando as devidas proporções de mercado entre uma época e outra, vendeu muito mais. O “Tá Delícia” foi importante porque me deu o título de “único sambista de mais de um milhão”, marca alcançada por poucos artistas, em geral, na história da música.
Qual foi o real motivo que fez o Shopping Iguatemi fechar o ‘Butiquim do Martinho’, já que lá era um lugar aprazível para quem gosta de boa música e diversão?
Não foi o Iguatemi que o fechou, fui eu. O motivo é que a nova direção do shopping ficou muito incômoda e não cumpria o combinado que estava nas entrelinhas do contrato. Também foi porque eu me mudei de Vila Isabel para a Tijuca, por motivos particulares e, dado à distância, não podia dar a mínima assistência necessária.
O atual cenário do samba lhe agrada?
O agradável é que o samba, antes perseguido pelo poder, hoje é assediado por ele e entre os sambistas que antes eram todos pobres e discriminados, há muitos bem-sucedidos e conceituados.
O senhor criou o grupo empresarial ZFM para ter uma maior liberdade artística ou um cantor consagrado já está “libertado?”.
Sempre fui livre. Escrevi num samba: “A liberdade é um sonho de quem permitiu se aprisionar” [trecho da música “De Pai Para Filha” do disco “Efeitos da Evolução”]. Criei o grupo para, sendo proprietário de uma editora musical, outra literária, um selo fonográfico e uma produtora artística, poder ter o domínio das minhas criações.
O fardão da Academia Brasileira de Letras é um sonho?
Sim, mas não é um sonho vaidoso e particular. É conotativo e também de muitos amigos, entre músicos, compositores e alguns seguimentos da sociedade que gostariam de ser representados por mim na Academia.
O que é mais prazeroso: compor um samba-enredo para a Vila Isabel, escrever um novo livro, ou cantar para milhares de pessoas?
Criar um samba-enredo, escrever um livro e cantar profissionalmente não é uma atividade somente prazerosa, há sacrifícios. Para tudo é necessário muita dedicação. O prazer só vem com o reconhecimento.
Última atualização da matéria foi há 2 anos
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