As mulheres adoram o Sexy Hot
Há algo de deliciosamente irônico no fato de o canal mais explícito da televisão brasileira ter se tornado um reduto feminino. O Sexy Hot, aquele que por anos foi símbolo de uma masculinidade embaraçada, meio escondida atrás de um controle remoto nervoso, hoje é consumido majoritariamente por mulheres. É quase um roteiro de vingança cultural: o que nasceu como um produto do olhar masculino, virou laboratório do desejo feminino. Fundado em 1996, quando a internet ainda engatinhava e os videocassetes reinavam, o canal criado pela pela Playboy do Brasil e atualmente comandado pelo Grupo Globo, tornou-se uma instituição do prazer audiovisual — e, quem diria, uma instituição progressista.
No começo, o Sexy Hot parecia mais uma importação de costumes da era do VHS, com filmes dublados em português e enredos que cabiam num guardanapo. Tudo rodava em torno do homem — o protagonista, o desejo, o prazer. As mulheres, coadjuvantes passivas, serviam de cenário e desculpa. Mas o tempo, e as revoluções discretas que ele traz, mudaram o foco da câmera. O canal entendeu que o prazer não tem gênero fixo, nem deve ter roteiro previsível. O público feminino cresceu, o conteúdo se sofisticou (pelo menos dentro do que se pode chamar de sofisticação erótica televisiva), e o Sexy Hot virou uma curiosa mistura de confessionário, vitrine e espelho.
“O Sexy Hot já produziu documentários sobre sexualidade, debates sobre tabus e até séries em que o erotismo se mistura à comédia e à crítica de costumes. Há algo de libertador — e de tragicômico — nisso tudo: o país que ainda se escandaliza com beijos gays em novelas é o mesmo onde um canal adulto se tornou o refúgio sensível das mulheres.”
De lá para cá, a revolução foi silenciosa, mas firme. Hoje, 54% dos assinantes são mulheres — e boa parte da equipe de produção também. Um pequeno terremoto simbólico para um canal que nasceu sob o signo do voyeurismo masculino. Aquelas que antes se viam apenas como objeto de desejo passaram a dirigir, filmar, escrever roteiros e — sobretudo — assistir. O resultado é um erotismo com sotaque feminino, menos mecânico, mais narrativo, mais curioso sobre as nuances do prazer. O Sexy Hot, que no passado era uma espécie de extensão da Playboy impressa, tornou-se um laboratório de perspectivas sobre o sexo e, pasmem, sobre o afeto.
O prazer visto de outro ângulo
O curioso é que, em tempos de pornografia gratuita e abundante na internet, o Sexy Hot ainda resiste. E resiste porque oferece algo que o abismo digital raramente entrega: contexto. Enquanto os sites amadores e as plataformas de streaming erótico se alimentam de pressa e dispersão, o canal da Globo — sim, aquele da novela das nove — continua apostando em um erotismo produzido, roteirizado, pensado. Pode soar antiquado, mas talvez seja justamente o que o público feminino procura: menos brutalidade, mais intenção. Não é só o corpo que excita, mas a história que o envolve.
A presença feminina também modificou o olhar técnico. A luz, a edição, o ritmo — tudo passou a flertar com a estética e não apenas com a carne. A pornografia, quando bem filmada, é uma arte como qualquer outra, ainda que de bastidores complexos e censura social permanente. O Sexy Hot, nesse sentido, é quase um documentário involuntário sobre o comportamento brasileiro: mostra o que o país finge não ver, o que reprime e o que consome. E o que o Brasil consome, ao que parece, é desejo com sotaque feminino.
Há algo de paradoxal no fato de que um produto da Globo — uma empresa que durante décadas controlou com pulso de ferro a moral televisiva nacional — seja também o maior difusor do erotismo explícito no país. É como se o império das novelas decidisse abrir um canal paralelo onde as fantasias dos bastidores ganhassem voz e imagem. E há também uma dimensão de resistência: o Sexy Hot sobrevive num mercado onde o moralismo cresce, a censura tenta voltar e o streaming ameaça tudo o que é linear.
No fundo, a força do canal está em sua honestidade. Ele não promete redenção, nem lições de vida. Promete prazer, apenas. E o faz com uma regularidade que nenhuma plataforma conseguiu superar. É um canal de televisão que se tornou, curiosamente, um espelho social: o lugar onde se percebe que as mulheres não apenas desejam — mas desejam ver o desejo, narrar o desejo, dirigir o desejo.
É claro que há contradições. O conteúdo ainda é majoritariamente heterossexual e o foco, mesmo quando feminino, ainda se equilibra entre o clichê e a ousadia domesticada. Mas há avanços visíveis. O Sexy Hot já produziu documentários sobre sexualidade, debates sobre tabus e até séries em que o erotismo se mistura à comédia e à crítica de costumes. Há algo de libertador — e de tragicômico — nisso tudo: o país que ainda se escandaliza com beijos gays em novelas é o mesmo onde um canal adulto se tornou o refúgio sensível das mulheres.

No fim das contas, o Sexy Hot é uma espécie de espelho do Brasil profundo — contraditório, sensual, conservador e moderno na mesma medida. Ele mostra que o erotismo não morreu, apenas mudou de público e de linguagem. O prazer, agora, fala com voz feminina, roteiriza sua própria fantasia e, se precisar, pega o controle remoto. Porque o desejo, como se vê, também evolui — e, às vezes, veste salto alto.
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Emanuelle Plath assina a seção Sob a Superfície, dedicada ao universo 18+. Com texto denso, sensorial e muitas vezes perturbador, ela mergulha em territórios onde desejo, poder e transgressão se entrelaçam. Suas crônicas não pedem licença — expõem, invadem e remexem o que preferimos esconder. Em um portal guiado pela análise e pelo pensamento crítico, Emanuelle entrega erotismo com inteligência e coragem, revelando camadas ocultas da experiência humana.




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