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Lan faz homenagem ao lendário Samuel Wainer

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Lanfranco Aldo Ricardo Vaselli Cortellini Rossi Rossini (ou simplesmente Lan) é um caricaturista italiano radicado na cidade do Rio de Janeiro. Em 1945 e 1946, Lan inicia nos jornais Mundo Uruguaio e El País a trajetória profissional pela qual é internacionalmente consagrado. Entre 1948 e 1952, já na Argentina, o caricaturista (ele não gosta do anglicismo cartunista) é contratado pela Editora Haynes (controlada pelo grupo peronista ALEA), à época detentor da maioria das publicações de Buenos Aires e atua em 6 revistas e nos jornais Notícias Gráficas e El Mundo. Em setembro de 1952, Lan visita à cidade do Rio de Janeiro e aceita o convite do jornalista Samuel Wainer para trabalhar no jornal Última Hora, fixando-se em definitivo na cidade um ano depois. Ainda inaugura, em 1953, a revista FLAN. Tem passagem breve pelo jornal “O Globo”, quando em 1962 passa a integrar a equipe do Jornal do Brasil, onde permaneceu por 33 anos. Desde 1960 é casado com a ex-passista da GRES Portela Olívia Marinho e há 35 anos reside em um sítio em Pedro do Rio, município de Petrópolis, no Rio de Janeiro. Caricaturadas com sinuosas curvas, as mulatas de Lan exibem a leveza, a graça e a exuberância das mulheres cariocas. “O humor, em geral, não existe mais. Até o humor italiano que era famoso na época do cinema (e que eu gostava) não existe mais. Mas é uma coisa da idade, é como vejo agora”, afirma o caricaturista.

Lan, a primeira pergunta que fazemos é uma curiosidade. O senhor não gosta de ser chamado de cartunista, por quê?

Olha esse negócio de chamarem o caricaturista de cartunista é uma invenção. A palavra é oriunda do Vittoriano, ou seja, caricari, que quer dizer carregar as tintas. Na Inglaterra também é caricaturista, e em toda parte o nome dado é caricaturista. Os americanos inventaram o cartunista por causa do cartoon, entendeu? Não vou chamar o cara que chamou caricaturistas de cartunistas de palhaço, por todo o respeito que eu tenho aos cartunistas. Porque têm cartunistas geniais como é o caso do Jaguar. O Jaguar é genial. Alguns têm a ideia de colocar o cartunista abaixo do caricaturista. Não ficam abaixo, já que é uma outra coisa. O caricaturista é original e mais abrangente. Um caricaturista pode fazer um tipo de personagem onde não dá pra reconhecer, e nem precisa reconhecer ninguém. Quando eu faço um malandro, é um malandro; quando eu faço uma mulata, é uma mulata, não é uma boneca que parece bunduda, não é nada disso. Eu faço um personagem, isso é caricatura. Na charge política, por exemplo, o cartunista pode fazer uma charge com bonecos e o diálogo se desenvolve. As charges ficam por conta do diálogo. O caricaturista domina a arte da caricatura, mas o cartunista nem sempre consegue fazer uma caricatura de um personagem.

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Entre 1945 e 1946, o senhor iniciou nos jornais Mundo Uruguaio e El País. Lembra como foi o começo nesses jornais e qual desenho foi marcante nessa época?

Eu ia muito ao estádio. Sempre fui muito chegado ao futebol. Adorava futebol e meu time preferido era o Nacional de Montevidéu. Por que o Nacional de Montevidéu? Porque em 1933 eu assisti o meu primeiro jogo no Estádio Centenário, que era um jogo do Nacional. O professor da época, escolhia sempre o aluno que melhor se destacava na semana, então ele [professor] levava quem se destacava, como prêmio para o estádio. Eu dei a sorte de assistir a estreia do Nacional no domingo. Aí o primeiro jogador que eu fiz já como profissional, foi o Agustín Prado, um zagueiro do Peñarol (o maior rival do Nacional). Em consequência dessa caricatura, eu fui convidado pelo “El País” de Montevidéu a fazer um outro desenho. Reiterando, que o “El País” é até hoje, o maior jornal do Uruguai.

Mais ou menos pela década de 50 em Buenos Aires, o senhor foi contratado pela Editora Haynes, uma potência na época e que tinha em seus quadros nomes ilustres como do romancista Ernesto Sabato e do cartunista Quino. Como foi essa experiência?

Comecei fazendo caricaturas de jogadores de futebol na Argentina, numa organização jornalística chamada Grupo ALEA, pertencente a Eva Perón, mulher do presidente da Argentina Juan Domingos Perón. Conheci muita gente do futebol. Cobria corrida de carreteiros (não sei como chama aqui no Brasil) e vi o início da Fórmula 1… Agora no jornal “Notícias Gráficas”, que também pertencia ao Grupo ALEA, eu tinha uma seção de teatro. Eu tinha que assistir uma peça de teatro todos os sábados. Aí veio para a América do Sul, uma mulata maravilhosa chamada Katherine Duncan, que tinha um balé afro-americano. O diretor do jornal me mandou a Montevidéu para recebê-la. Fiz uma página inteira dedicada a ela. Logo depois dela veio Alicia Alonso, a grande bailarina cubana que eu também conheci… Quando conheci a Evita, num dia que ela foi na redação, ela me falou: “Gosto muito do seu traço, por que você não faz mais mulheres? Gosto muito do seu traço, é um traço elegante”. Então ela começou a me mandar o nome das vedetes e das atrizes que ela tinha conhecido na época. E tenho que dizer, até hoje adoro desenhar mulheres!

O senhor foi caricaturista de um dos mais prestigiosos jornais da história do nosso país, o Última Hora do não menos lendário Samuel Wainer. Como era trabalhar no Última Hora e ser liderado por um dos principais nomes do jornalismo nacional?

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Bom, na verdade, Samuel Wainer foi um acidente de percurso na minha vida, porque em 1952 eu tinha resolvido dar uma volta em toda a América, quer dizer: Rio, Nova York, Nova Orleans… De Los Angeles eu ia até São Francisco; depois iria ao México, descia pelo Pacífico e entrava na Argentina de volta. Depois iria para o Chile, e para Mendoza no Uruguai. Aí o que aconteceu, quando já estava aqui, uns colegas meus formaram a equipe de paginadores do Última Hora carioca. O chefe era o paraguaio Andrés Guevara. Me entrevistaram e pediram para eu fazer uma caricatura, do jogo que iria acontecer entre a seleção paulista contra a seleção carioca. Eu também queria ir ao Maracanã, para ver onde o Uruguai tinha ganhado a Copa do Mundo em 1950. Fiz a caricatura do Baltazar, o “Cabecinha de Ouro” do Corinthians. O Álvaro Paes Leme, que era o chefe de esportes da Última Hora paulista (que estava sendo inaugurada), falou com o Samuel pra ver se podia me contratar. Então fui ver o Samuel na antiga sede que foi comprada pelo Diário Carioca. Nesse momento entrou a Última Hora em minha vida. Samuel me fez ir para São Paulo, nem conhecia, tinha ido quando era pequenininho. Mas o jornalismo carioca que me fascinou. Eu acho que nós do jornalismo, deveríamos lembrar sempre de Samuel Wainer. Ele tendo sido repórter da revista “O Cruzeiro”, conheceu e entrevistou o presidente Getúlio Vargas, e foi onde ele pediu o financiamento para o Banco do Brasil para fazer o jornal Última Hora. Então era um jornal fielmente getulista, e foi aí que começou as brigas com o Carlos Lacerda…

No Última Hora, o senhor criou talvez o desenho mais icônico da sua vida, que foi o corvo que simbolizava o jornalista Carlos Lacerda. Por que acredita que o desenho que o senhor considera uma porcaria, se tornou tão forte, afinal quando se fala de Lan é inevitável lembrar de duas coisas, do corvo e das mulatas?

Se alguma vez disse porcaria, na verdade, me excedi. Pra mim, na verdade, é o pior desenho que eu fiz por causa da pressa. O Samuel me pediu o desenho na hora que eu estava indo embora. Já estava de saída do jornal quando o Samuel mandou me chamar até o lugar que ficava à direção, e ele disse: “Eu quero uma charge sua sobre esse sacana”; no caso Carlos Lacerda e claro, ele soltou outro palavrão. Samuel, tinha ido ao velório do jornalista Nestor Moreira. Lacerda falou que a polícia de Getúlio, tinha matado o Nestor Moreira, e ele [Lacerda] foi ao velório todo de preto. O Samuel também foi, mas não foi de preto. Eu vou contar toda a história que é a verdadeira, a que realmente aconteceu. Quando eu fiz o corvo, na verdade, eu tinha pressa de fazer. Aquela ideia que eu fiz foi pura, porque o urubu come carniça, mas como eu tinha pressa, tinha que ir ao arquivo, para ver como era um urubu. Resolvi fazer o corvo, já que o corvo é rápido e mais infeliz. No dia seguinte aconteceu um negócio. Quando cheguei no Última Hora, no meio da redação estava Danton Coelho que era presidente do PTB; Eloy Dutra e Baby Bocayuva que na época, também eram do PTB, e claro Samuel Wainer que era o dono do jornal e que praticamente era o porta-voz de Getúlio. Sei lá, eu nunca gostei do desenho, mas interpretei o cara. Daí o Danton Coelho me abraça e me diz: “Você fez um trabalho de uma profundida psicológica”; e eu disse comigo mesmo: “puta que pariu” [risos]. Foi assim que nasceu o corvo, sendo um pseudônimo que Lacerda carregou a vida toda, como disse uma certa vez um colunista. Eu não entendia nada da política brasileira. O que eu fazia era esculhambar. Depois eu fui me entrosando, já acompanhando a política, e assim fazendo charge sempre contra os dois lados.

Num mundo de redes sociais, blogs, microblogs e outros tantos meios digitais, seria possível termos uma publicação impressa que seria de fato um jornal vibrante, uma arma do povo?

Eu não sei, porque sem dúvida nenhum de nós temos de modo geral uma posição ideológica de centro. “Estadão”, “Folha”, “O Globo”, todos são de centro. Não é como no território italiano, onde temos um jornal ideológico como é o “L´Unità”, ou ainda o “Corriere della Sera”, que são respectivamente os jornais do Partido Comunista e da Democracia, enfim, quero dizer que por lá existe variação. É claro se eu trabalhasse no “Corriere della Sera”, eu não esculhambaria nunca a Democracia Cristã, atacaria os outros. Mas nós não temos isso aqui no Brasil, de modo que temos uma posição de centro. De fato, têm “três irmãs” se destacando por dizer a verdade, que é “O Globo”, a “Folha de S.Paulo” e o “Estadão”. Não interessa se agrada o Lula, se agrada a Dilma, não interessa. Eu adoro a posição independente, porque eu acho que a base da democracia é uma imprensa livre. Eu acho o “Estadão” forte e “O Globo” correto politicamente. Quer dizer, você me pergunta se comporta um jornal como o Última Hora, eu acho que não. Hoje em dia fica muito difícil. O que eu estou dizendo, é que se continuasse com a charge politica, infelizmente me expulsariam do país [risos]. Quando alguém me pergunta: “Qual é a sua posição política?”, eu respondo: “Sou anarquista de centro”, afinal anarquista de centro não existe [risos]. Eu lamento, eu estou perdendo um prato, que vou te contar… Todo mundo está retardando, retardando e retardando, toda a responsabilidade que o Lula tem por esses doze anos. Diretamente ele é o responsável por tudo que está aí, ele e a cupinchada dele (Genoino, José Dirceu…). Muita gente votou no Lula no princípio quando ele era um idealista. Infelizmente deixou de ser, agora ele vive de cargo em cargo. Fez 29 Ministérios para dar cargo a todos. Agora estão pedindo mais cargos, a Dilma vai ver qual Ministério que falta… Se eu fizesse uma charge hoje, diria que falta é o Ministério dos puxa-sacos, mas enfim…

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O compositor Aldir Blanc, diz que o senhor foi várias vezes injustiçado porque os politicamente patetas não entenderam seu amor por nossas tradições, festas e mulatas. Alguma vez o senhor se sentiu injustiçado?

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Bem, na verdade, na verdade, tem uma coisa que sempre fiz questão. Eu respeitava a pessoa na minha coluna. Mesmo quando eu falei com o Andreazza [Mário Andreazza, ministro dos Transportes no Regime Militar, 1918 – 1988], e ele me chamou na redação, para me pedir uma caricatura dele, porque eu tinha feito outra que o Chagas Freitas (jornalista carioca 1914 – 1991) deu de presente ao filho, então ele queria outra, enfim… Ele me falou: “Você está criticando a Arena e eu não consigo ter bronca de você e nem ficar chateado”. Eu disse a ele: “Eu não faço uma charge criticando você como pessoa humana. Eu faço te criticando como administrador, e faço contra qualquer administrador que mereça. Não preciso agredir na charge, é uma crítica dentro de um limite, o resto que passar disso é agressão”. Ele ficou tão eufórico que chamou todo mundo, secretário, secretária, para eu repetir o que havia dito. A charge deve ser uma metralhadora giratória inclusive contra os seus. Inclusive contra àqueles que você tem simpatia, como no meu caso eu tenho simpatia pelo ex-presidente FHC, mesmo ele sendo o criador do Fator Previdenciário que eu não consigo engolir até hoje. Pra falar a verdade, o aposentado continua sendo maltratado como foi pelo Lula, e como continua sendo por essa senhora [Dilma]. Para eles o aposentado não interessa. Agora se ainda tivesse as minhas vistas para desenhar… Tenho 90 anos, trabalho ainda, porque tenho um arquivo enorme, então faço um desenho aqui, outro desenho acolá… Desenho um homem aqui, uma mulher de lá… A mulher que não pode faltar. Eu raramente faço um desenho sem a mulher, o homem sem a mulher. Até a minha mulher protesta, me mandando recado pela internet se eu não fizer: “Cadê a mulher”. [Risos.]

O senhor tem uma ligação muito forte com o carnaval, dizendo em uma certa ocasião que: “Todo instrumento tem sua alma, expressada no rosto de quem toca”. Poderia nos descrever o que sentiu, quando viu uma escola de samba entrar na avenida pela primeira vez?

Bom, uma coisa que é relacionada aos instrumentos, sem dúvida nenhuma, é a expressão de quem está tocando. É uma coisa especial, bonita de se ver. Muda, por exemplo, quando a pessoa está tocando tamborim. O desenho da pessoa muda, é aí que eu gosto de dizer que isso é caricatura. É claro, são as características da personalidade de quem estou desenhando. Era o meu sonho ver o carnaval carioca. Eu cheguei atrasado. Eu cheguei na quarta-feira de cinzas no carnaval carioca. Eu estava trabalhado em São Paulo, e o que aconteceu? Um desfile em Niterói, da Império Serrano, e eu fiz questão de ir lá em Niterói para ver. Me lembro que na travessia do barco que transporta passageiros lá em Niterói, eu ouvi pela primeira vez e enturmei com Dona Ivone Lara, com o Mestre Fuleiro, mas só depois que fiquei sabendo quem eram… Mas assim como eu torcia pelo Flamengo, já havia prometido em São Paulo ser Portela… Eles foram cantando na travessia e tudo de improviso… Foi uma emoção muito grande. Falava para meus colegas de São Paulo, que na Última Hora carioca só tinha portelenses, afinal a Portela foi sete vezes campeã! Edson Carneiro, que era meu companheiro na Última Hora carioca, que cobria o Carnaval, iria para o Morro do Salgueiro. Falei pra ele que gostaria de acompanhar. Naquela época não tinha nada como agora. Hoje em dia, por exemplo, o gravador é pequenininho, mas naquela época pesava 20 kg! Carreguei as coisas até lá em cima, já que eu era o garotão da turma. O Edson disse: “Com certeza quando nós chegarmos lá em cima, deve ter alguma coisa para beber. Sempre oferecem alguma coisa, e quando oferecerem pra você, aceita!”. Quando subimos pra lá, o Casemiro Calça Larga, famoso sambista, estava nos esperando. Lá estava o Edson, duas professoras que acompanhavam ele e eu. Aí o camarada abre uma garrafa de São João da Barra, um conhaque de alcatrão, que era uma porrada que eu vou te contar… Ele me deu um copo, mandei um “tim tim”, e bebi tudo, um copo de conhaque. Aí tomei também o copo do Edson, e às duas professoras me deram também o copo delas. Bebi uma garrafa de conhaque brava, 40 graus de calor na sombra, quase morri com um porre daqueles.

Poderia fazer um paralelo de como era o humor da população em épocas passadas se compararmos com o humor da população dos dias atuais?

O humor, em geral, não existe mais. Até o humor italiano que era famoso na época do cinema (e que eu gostava) não existe mais. Mas é uma coisa da idade, é como eu vejo agora. O mundo vai se transformando, os gostos vão se transformando. A juventude atual não tem nada a ver com a minha juventude. A juventude de hoje gosta de barulho. Moto barulhenta, carro barulhento, música barulhenta… Há uma grande diferença com a minha adolescência. A música da minha época era o jazz, que era mais romântico. Tudo era mais romântico. Melhor pra mim, no meu modo de ver as coisas, mas pra eles não, eles gostam de barulho. O barulho influi muito no temperamento da juventude atual. Nunca vi tantos casos de violência. Fico horrorizado vendo os noticiários! Estupros, violência, assalto que tem que matar… São coisas assim que nessa altura da vida não aceito! Eu te confesso uma coisa, não aceito! Isso influi no humor. O humor não é mais aquele humor de antigamente, pelo menos para o meu gosto, talvez eu possa ser antiquado demais.

Vamos falar de mulheres. O senhor disse uma frase sensacional: “O camarada que diz: ‘manjo de mulher’ sabe de nada. Cada uma delas têm um mundo diferente, um mistério”. O que mais lhe fascina nesses seres incríveis e maravilhosos?

Acho que a transparência das mulheres, de todas elas, é como vidro fosco, por quê? Porque têm algumas coisas que elas não dizem, não falam. Então todas elas carregam um mistério. É o maior encanto que uma mulher tem é o mistério. É o que mais você quer, ou gostaria de conhecer é ela a fundo. Digo sempre que amo a minha mulher, estou casado com ela há 54 anos, agora me pergunta se eu conheço ela? Digo que não. Ontem ela me deu uma surpresa enorme. Olívia não se preocupa com resultados de futebol, não se preocupa com nada disso… E ontem acompanhou o “Tour de France”, torcendo por um ou dois ciclistas. Ela nunca nem andou de bicicleta! Então essas coisas estranhas que aparecem de repente são coisas muito profundas. Nenhuma mulher se dedicou tanto a mim quanto ela. Confesso que se estou vivo, foi graças a ela. Ela dá o meu remédio na hora certa, insiste, vem atrás de mim quando esqueço de tomá-lo. Ela sabe a comida que gosto, sabe de tudo. Ela tem uma forma de mostrar o amor através de me agradar com as coisas que me agrada, mas nunca me disse eu te amo. Aí você vê como é estranho, ou melhor, como são estranhas as mulheres. Ela precisa demonstrar o amor dela com gestos, que no final é uma coisa bem simples. Agora, na verdade, têm uns camaradas que dizem: “Mulher é comigo mesmo…”; isso é ser muito idiota, muito idiota.

Com 90 anos, o senhor pode dizer que viveu tudo que gostaria de ter vivido tanto profissionalmente como pessoalmente, ou ainda lhe faltou algo que ainda gostaria de viver em um desses dois aspectos da sua vida?

Poderia te dizer uma coisa. Gostaria de viver outros noventa anos, do mesmo jeito que passaram os primeiros. Porque, na verdade, eu que já fui considerado um agnóstico, há uns 30, 40 anos descobri que Deus existe. Que Deus é uma coisa prática! Começa pelo infinito. Não adianta os americanos mandarem máquinas e pessoas cada vez mais pra longe. Sabe o que eles estão procurando? Excremento de seres humanos, pra ver se existem ou se existiram seres humanos por lá. Gastam bilhões e bilhões de dólares… Infinito é infinito, é uma coisa que não acaba nunca, porque mesmo admitindo que se chegue até lá, o outro lado de lá também é infinito. É algo que faz parte do mistério das coisas. Então é assim que penso. Analisando as coisas pergunto a você e pergunto a mim mesmo: onde nasce os sentimentos como o amor, como o ódio, mas principalmente os sentimentos positivos, que eu vejo aqui no meu cachorro? Será que de uma massa de carne e de ossos nasce tudo isso? Nasce o espírito, o amor? Isso é uma coisa muito estranha, agora querer se aprofundar… É melhor navegarmos com o espírito, amar todas as mulheres possíveis, pois, elas merecem mais respeito, enfim, é isso que te digo meu amigo. Espero ter me saído razoavelmente bem nas perguntas.

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Última atualização da matéria foi há 3 anos


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