Coroa-Brastel: um caso nos anais financeiros
O Escândalo Coroa-Brastel, deflagrado em 1985, permanece como um marco nos anais financeiros do Brasil, revelando uma trama complexa que envolveu o empresário Assis Paim Cunha e os ministros Delfim Neto (Planejamento) e Ernane Galvêas (Fazenda). Este episódio, que resultou na intervenção do Banco Central e na liquidação do império Coroa-Brastel em 1983, ainda ecoa nas páginas da história econômica brasileira.
Assis Paim Cunha, nascido em Vassouras em 1928, iniciou sua trajetória como vendedor na rede Ponto Frio. Compreendendo as nuances dos mercados das classes B e C, fundou, na década de 70, a Brastel. A fusão das lojas Cobrás e Telegeo deu origem a um conglomerado que, em uma década, se tornou um dos maiores do país, faturando US$1 bilhão por ano. No entanto, a ascensão meteórica de Paim encontrou seu declínio com a intervenção do Banco Central em 1983.
O grupo Coroa-Brastel, que englobava diversas empresas, destacava-se pelo braço comercial, liderado pelas Lojas Brastel, Brascasa e Brastel Feijão com Arroz. A publicidade agressiva das Lojas Brastel, marcada pelo slogan “Na Brastel, tudo a preço de banana!”, conquistou visibilidade por meio de anúncios em jornais, rádio e televisão.
Entretanto, o braço financeiro do grupo revelou-se o epicentro do escândalo. A Coroa Administração e Participações S/A, Coroa S.A. Crédito, Financiamento e Investimento, Coroa Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S.A., entre outras entidades, compunham uma teia financeira que se desfez em 1983. O uso inadequado de empréstimos da Caixa Econômica Federal para quitar dívidas da Laureano Corretora desencadeou a crise. A emissão de letras de câmbio sem lastro financeiro, combinada com juros elevados, gerou desconfiança no mercado.
A intervenção do Banco Central em 1983 expôs o maior escândalo financeiro da época, prejudicando cerca de 34.000 credores, que perderam aproximadamente R$250 milhões. O colapso do braço financeiro levou ao não pagamento de fornecedores e bancos, resultando em múltiplos pedidos de falência.
Durante o escândalo, grupos como o Pão de Açúcar e o extinto Grupo Fenícia manifestaram interesse nas Lojas Brastel, mas a situação delicada do grupo impediu avanços nas negociações. A liquidação do grupo se estendeu por mais de duas décadas, enquanto Assis Paim Cunha buscava provar que a intervenção fora motivada por pressões políticas.
A trajetória pós-falência revelou um Assis Paim Cunha levando uma vida modesta. Em 2008, o ex-empresário faleceu de ataque cardíaco, tornando-se um caso singular: um empresário brasileiro que perdeu tudo e, ao contrário de sua riqueza passada, ficou genuinamente pobre. Embora tenha quitado as dívidas da rede de eletrodomésticos, os 34 mil investidores prejudicados na quebra do Coroa jamais recuperaram seus investimentos.
Em 2014, o Supremo Tribunal Federal (STF) manteve a decisão que condenou o Banco Central ao pagamento de R$ 400 milhões de indenização a uma corretora de valores que investira na Coroa Brastel. A decisão, sujeita a recurso, colocou em foco a responsabilidade do BC pela falta de fiscalização que contribuiu para o desfecho catastrófico do grupo.
Três décadas após o escândalo Coroa-Brastel, a sua sombra persiste nos debates jurídicos e econômicos, destacando-se como um episódio emblemático que expôs as fragilidades do sistema financeiro e as consequências nefastas de práticas empresariais questionáveis. O caso permanece como um alerta sobre a importância da transparência, ética e vigilância regulatória no mundo dos negócios.
Última atualização da matéria foi há 1 ano
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