Por que a bunda feminina nos fascina?
Não é de hoje que a bunda feminina exerce um estranho fascínio sobre a humanidade. Seios, lábios, olhos… todos têm seu momento de glória, mas é a bunda que volta, rebola, sacode e nunca sai de moda. Do busto de Vênus ao quadril de Kim Kardashian, o traseiro atravessou séculos carregando mais do que tecidos adiposos: ali mora a libido, o marketing, a moral e até a geopolítica dos corpos. A bunda permanece como um dos centros de gravidade do desejo ocidental — e, por que não dizer, global.
A psicanálise daria seus pitacos. Freud talvez diria que tudo começa no desmame e termina na fase anal. Mas sejamos menos clínicos e mais culturais. A bunda é, antes de tudo, uma ideia. E como toda ideia, ela é moldada, inflada, domesticada, censurada e vendida. E que vendida! O pornô, com sua vocação para a hipérbole, há décadas elevou a bunda ao status de protagonista. É ela quem toma a frente (ou melhor, o fundo) em categorias e subgêneros, fetichizada ao ponto de virar quase um personagem com vontades próprias. De “anal” a “big booty”, o mercado pornográfico encontrou ali uma mina inesgotável de cliques, lucros e obsessões.
“Celebridades como Beyoncé, Nicki Minaj e Anitta fizeram da bunda não só um instrumento de visibilidade, mas de valor monetário.”
Mas nem só de pornografia vive o culto ao derrière. A cultura pop — esse grande liquidificador de símbolos — reciclou e amplificou o fetiche. Nos anos 1990, Sir Mix-A-Lot cantava “I like big butts and I cannot lie”, enquanto no Brasil Carla Perez rebolava no “Domingão” como se a Constituição garantisse o direito ao popozão. E garantiu. A ascensão do funk carioca, com sua estética bundocêntrica, instaurou um novo regime imagético em que a bunda deixou de ser escondida para virar holofote. Passinho, quadradinho, rabetão. O corpo feminino, mais uma vez, foi capturado pelo olhar masculino — só que agora travestido de “empoderamento”.
Entre o erotismo, o controle e o mercado
A bunda não é apenas desejo, é também vigilância. Historicamente, sociedades patriarcais se ocuparam de controlar o corpo da mulher e, em especial, suas formas. Na Grécia antiga, por exemplo, o erotismo era permitido, desde que domesticado pela razão. Já os romanos, com menos pudor, celebravam a sensualidade mais abertamente, ainda que dentro de seus limites de classe e gênero. No Renascimento, artistas como Rubens pintaram nádegas fartas como símbolo de fertilidade e beleza. Mas foi no século XIX que a obsessão ganhou contornos científicos (ou pseudocientíficos), com a infame história de Sarah Baartman, a “Vênus Hotentote”, exposta em feiras europeias por ter glúteos proeminentes — num espetáculo abjeto de colonialismo, racismo e fetichismo.
E se ontem se expunha a bunda negra como curiosidade exótica, hoje o mercado reverte a lógica e a transforma em padrão. Celebridades como Beyoncé, Nicki Minaj e Anitta fizeram da bunda não só um instrumento de visibilidade, mas de valor monetário. Impulsiona cliques, vende streaming, alimenta coreografias virais. A bunda virou indústria. E com ela, veio também a pressão estética. Clínicas de estética, academias, procedimentos como o lifting glúteo brasileiro (o famoso BBL) ganharam protagonismo. A bunda virou projeto. E quem não a tem, compra — com juros, boletos e dor.
Mas o fascínio não é apenas masculino. A bunda tornou-se também espaço de disputa e autoafirmação. Mulheres rebolam por prazer, por protesto, por ironia. Se a objetificação é real, também é real o desejo de se apropriar da própria imagem. A polêmica mora na ambiguidade: o que é fetiche para uns, é liberdade para outros. A bunda flutua nesse dilema, ora símbolo de submissão, ora de poder. Basta ver o TikTok, onde adolescentes do mundo todo replicam coreografias em que a bunda é o centro da ação — e, por tabela, da audiência.
Claro, há também o moralismo. Em toda sociedade obcecada pela bunda há uma ala igualmente obcecada em escondê-la. A censura, disfarçada de “decência”, sempre mira o corpo da mulher. Políticos conservadores, algoritmos puritanos e vozes religiosas insistem em controlar o que pode ou não ser mostrado. Mas quanto mais tentam esconder, mais ela aparece. A bunda, afinal, é insubordinada. Vai à praia, ao Instagram, ao Congresso, ao tapete vermelho. Ela não pede licença, ela balança.
Num tempo em que tudo vira commodity — até o afeto — não é de estranhar que o corpo feminino siga no centro da disputa simbólica. O culto à bunda é um sintoma de nossa época: sensual, exaustivo, saturado e, paradoxalmente, vazio. Ao mesmo tempo, em que a bunda é celebrada, ela é editada, enquadrada, deletada. A bunda natural virou exceção. Vive-se sob o regime da bunda-ideal, um glúteo curado por filtros, médicos e algoritmos.
No fim das contas, talvez o fascínio pela bunda feminina nos diga menos sobre elas e mais sobre nós. Nossa carência, nossa necessidade de controle, nossa busca constante por prazer, estética, identidade. A bunda é espelho — e talvez seja por isso que ela nos incomode tanto quanto nos seduz. Porque quando ela balança, não é só pele e músculo que se movem. Balança a moral, a economia, o algoritmo e até o patriarcado.

E tudo isso, caro leitor, com uma sacudida só.
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Emanuelle Plath assina a seção Sob a Superfície, dedicada ao universo 18+. Com texto denso, sensorial e muitas vezes perturbador, ela mergulha em territórios onde desejo, poder e transgressão se entrelaçam. Suas crônicas não pedem licença — expõem, invadem e remexem o que preferimos esconder. Em um portal guiado pela análise e pelo pensamento crítico, Emanuelle entrega erotismo com inteligência e coragem, revelando camadas ocultas da experiência humana.
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