A crise na visão da executiva Sandra Araújo
Sandra Araújo é cofundadora do Grupo Kronberg (atualmente no cargo de VP de Operações), com participação desde a idealização à criação da empresa em 2002. Especializada na gestão da empresa desde atração e retenção de talentos, treinamento, financeiro, administrativo e operacional; Graduada em Administração de Empresas pela FAAP. É especializada em Business Administration pela University of Michigan; Certificada como Assessor em Inteligência Emocional pela Six Seconds; Especialista na Neurociência do Aprendizado, Ciência da Inteligência Emocional e Ciência da Positividade; Está envolvida na expansão da empresa para outros mercados e países, com atividades na América do Sul e Portugal; já deu treinamento pela empresa a mais de 85.000 pessoas no Brasil e 26.000 coachings. Participou ativamente da transformação do Grupo Kronberg para a Era da Economia da Criatividade. “Não há experts no novo normal. A liderança adaptativa, e não a competência técnica por si só, é que será imprescindível para as organizações repensarem seus modelos de negócio, seus produtos, serviços, para se adaptarem aos novos comportamentos da sociedade e de seus clientes, que hoje são ainda imprevisíveis. A força subjacente da liderança adaptativa e inspiradora, uma vez que o comanda e controla já não funcionava mesmo na pré-pandemia. É a Inteligência Emocional”, afirma a executiva.
Sandra, qual a sua definição pessoal sobre a Inteligência Emocional (IE)?
É a maravilhosa intersecção de sentimentos com pensamentos para otimizar resultados na vida.
Qual a importância da Inteligência Emocional num momento tão instável como o atual?
Já estávamos vivendo um contexto de mundo bastante turbulento, incerto e disruptivo, mesmo antes da pandemia. Com o advento do coronavírus, passamos a experimentar o sofrimento por perdas antecipatórias – medo de perda de um ente querido, de segurança financeira, de status, de relevância, de competência e até mesmo de identidade. Deixamos uma rotina que não será a mesma no pós-normal e não conseguimos enxergar quando será o fim desta crise.
Este conjunto de fatores, que só se intensificará no futuro, exige muita tolerância às incertezas e ambiguidades, e a Inteligência Emocional nos habilita a desenvolvermos as competências necessárias – a autoconsciência, autorregulação, propósito e empatia – que sabidamente fortalecem a resiliência emocional necessária para proteger nossa saúde mental e bem-estar para que possamos prosperar no pós-normal.
Como as organizações deveriam lidar com esse tema?
O pensamento racional é absolutamente fantástico para analisar, sequenciar e resolver problemas de variáveis conhecidas, mas insuficiente neste ambiente no qual as variáveis são cada vez mais desconhecidas. Não há experts no novo normal. A liderança adaptativa, e não a competência técnica por si só, é que será imprescindível para as organizações repensarem seus modelos de negócio, seus produtos, serviços, para se adaptarem aos novos comportamentos da sociedade e de seus clientes, que hoje são ainda imprevisíveis. A força subjacente da liderança adaptativa e inspiradora, uma vez que o comanda e controla já não funcionava mesmo na pré-pandemia. É a Inteligência Emocional.
O investimento na IE, portanto, não será uma escolha para quem quer prosperar na era do inesperado. Trata-se de uma necessidade imperativa. A boa notícia é que a IE, longe de ser o modismo passageiro de meados dos anos 90, é hoje uma ciência. A IE pode ser medida por assessments validados cientificamente e desenvolvida.
Você sempre foi apaixonada por pessoas. Como as organizações estão tratando o seu principal patrimônio?
Sim, o tagline da Kronberg é mindful living e revenue solutions. Sempre entendemos que a organização que cuida do bem-estar de seus colaboradores geram mais lucro. Nossos programas de desenvolvimento de liderança e de competência em vendas e atendimento, sempre tiveram o foco, tanto no lado de competências técnicas como comportamentais, e como consequência desse posicionamento, o retorno sobre o investimento para os clientes nas soluções da Kronberg, têm sido substantivo nestes últimos dezoito anos.
Embora essa correlação bem-estar e lucro já esteja estabelecida há várias décadas pela psicologia positiva, a maioria das organizações insistia em criar a miserabilidade no ambiente de trabalho, ainda que o discurso fosse diferente: “nosso maior patrimônio é o recurso humano”. O descolamento entre discurso e prática, no entanto, era desconcertante. Em situações de crise o primeiro corte sempre foi o investimento nos recursos humanos. Enquanto investimentos em tecnologia, processos, equipamentos mereciam a prioridade.
Queremos crer que em uma situação de inevitável demanda diminuída no novo normal, e talvez de forma mais prolongada do que se imagina, aquela organização que não fizer jus ao discurso, que continuar naquele descolamento, sofrerá perdas de competitividade irreparáveis. Não se trata de investir no recurso humano versus investimento em tecnologia, mas sim de não relegar o recurso humano, a segundo plano. Ambos devem caminhar juntos. O talento será mais importante do que sempre foi!
O mundo dos negócios será diferente daqui em diante?
Embora alguns desdobramentos em decorrência da crise atual sejam mais óbvios – contato humano diminuído, tecnologias voltadas a essa realidade, restruturação da produção e sourcing de global para regional e local – entendemos que qualquer previsão, sobre esta questão no pós-normal é um jogo de adivinhação. A insegurança econômica que deverá durar alguns anos, certamente alterará a percepção de valor do consumidor, mas como este irá se comportar é uma grande incógnita. O trabalho e consumo serão redefinidos, mas como? Outras crises podem nos dar uma certa noção sobre o impacto econômico no comportamento do consumidor, mas nunca ficamos reclusos por tanto tempo e com medo do contato humano. Daí o fato de o talento ser realmente o maior ativo de uma organização. Como dissemos, não há experts no pós-normal, as competências técnicas que antes eram valorizadas poderão não ser as mais importantes.
Em um ambiente de negócios cada vez mais desconhecido e complexo, as questões são difíceis de serem identificadas, são incertas, ambíguas e de baixa compreensão. As organizações terão que se reinventar e, por conseguinte, a adaptabilidade, experimentação, iniciativa, criatividade, paixão, inovação, cooperação, confiança, motivação e agilidade deverão ser mais valorizadas. Nessa reinvenção, as pessoas experimentarão perdas. Algumas partes da organização deixarão de existir, algumas posições e práticas serão eliminadas. Na nova jornada de aprendizado constante, no início, se sentirão envergonhados porque passarão a atuar fora de sua zona de conforto, fora de grande parte de suas competências anteriores. Muitos terão que renegociar lealdades com mentores e colegas cujos ensinamentos não mais se aplicam.
Como o propósito está elencado nesse novo ecossistema?
O propósito, além de ser um dos principais direcionadores de crescimento das empresas, tem um valor inestimável neste ambiente de incertezas. Disrupções dramáticas na vida nos levam a perder a coerência de nossa narrativa vigente até então, tanto da vida pessoal como profissional. Passamos a oscilar entre o apego a um passado que temos medo de já ter perdido e um futuro que traz incertezas e inseguranças.
O propósito de vida bem construído evita a perda de coerência na nossa narrativa decorrente de crises que ameaçam transformar a maneira como atuávamos no mundo. Sem um propósito nos sentimos perdidos e sem direção, sem um leme, sem um farol para nos orientar nesse mar cada vez mais cambiante e revolto. O propósito transcende o ego, promove bem-estar e fortalece a autonomia e autenticidade. Estes fatores representam pré-condições indispensáveis para um chefe fazer a transição para a liderança adaptativa e inspiradora.
Qual será o maior desafio do mundo dos negócios no pós-Covid-19?
Uma vez que o status quo já foi desafiado por um vírus, o maior desafio será o de revolucionar a forma de operar, de criar a capacidade para prosperar na nova realidade e apoiar emocionalmente a organização. E, finalmente, se curvar ao fato de que a Inteligência Emocional não é um “soft skill” como era chamada antes da pandemia, mas sim, um conjunto de competências indispensáveis na era do inesperado.
O que faz a diferença para a transformação das pessoas no momento presente?
O mindset de crescimento. Se a pessoa não acredita que as habilidades e inteligência podem ser desenvolvidas, operar nesse ambiente complexo fica muito desafiador, extenuante e, eventualmente, insustentável. A autoconsciência para alinharmos nossas percepções às reais potencialidades, portanto, termos a humildade para reconhecer as áreas de oportunidade e adotar o aprendizado contínuo como prática do dia a dia, faz enorme diferença para a transformação das pessoas. É a autoconsciência que nos permite também nos conscientizarmos da necessidade de investirmos no desenvolvimento de nossa adaptabilidade às mudanças, no aumento da tolerância às incertezas e ambiguidades e, como consequência fortalecer a resiliência emocional para promovermos saúde mental, bem-estar e prosperarmos no pós-normal.
Liderança e Inteligência Emocional são faces da mesma moeda?
Com certeza! A IE nos permite liderarmos a nós mesmos com autoconsciência, autorregulação, empatia e propósito para que possamos ser líderes inspiradores e eficazes de outras pessoas.
A atuação dos mentores passa a ter um significado ainda maior durante e depois da crise?
Todos sairemos de alguma forma afetados dessa crise, o apoio emocional será necessário não somente para os mentorados, mas também para os próprios mentores na forma de autocompaixão, cuidados com a saúde mental e física, para que possam exercer seu papel. Estar presente de alguma forma agora, preservar a continuidade do relacionamento, deixar o mentor saber que está disponível fará enorme diferença para os jovens que também estão, como a maioria das pessoas, muito fragilizados por essa crise.
Última atualização da matéria foi há 2 anos
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