Gustavo Cerbasi falando sobre o enriquecimento
Nascido em Caxias do Sul, o escritor, consultor, professor, palestrante e administrador Gustavo Petrasunas Cerbasi, foi considerado pela Revista Época um dos 100 brasileiros mais influentes do ano de 2009. Leciona em cursos de pós-graduação e MBAs pela Fundação Instituto de Administração, além de diversos cursos ministrados in company. É sócio-diretor da Cerbasi & Associados Planejamento Financeiro. Com experiência prática e acadêmica em finanças, negócios, planejamento familiar e economia doméstica, desenvolve treinamentos, palestras e consultorias para diversos públicos por todo o Brasil. Seus livros já venderam mais de 1,4 milhão de exemplares, entre eles se destaca o famoso ‘Casais Inteligentes Enriquecem Juntos’, que foi o nono livro mais vendido no Brasil em 2009 na categoria “Autoajuda”. Em 2012 foi lançado o filme inspirado no livro com o nome de ‘Até que a Sorte nos Separe’, superando a marca de 2 milhões de espectadores. “Não era exatamente o trabalho que me deixava insatisfeito. Eu lecionava na melhor escola de negócios do país, era reconhecido e muito bem remunerado. Mas, estava incomodado com as consequências do trabalho. Trabalhava seis dias por semana, mais de quinze horas por dia, e aos domingos ainda preparava aulas ou corrigia provas. O ritmo intenso estava afetando tanto minha saúde quanto meus relacionamentos”, afirma o escritor.
Gustavo, como se sente ao ser chamado de guru das finanças por várias publicações?
Sinceramente, não curto o rótulo de guru. Ele confere uma autoridade que não pode existir nas Finanças Pessoais, pois, nessa área os produtos, as regras e as leis transformam-se muito rapidamente. Nós especialistas somos todos eternos aprendizes. Sinto que, ao ser tratado como guru, minha palavra é muito mais respeitada do que ideias de outros especialistas, e isso é ruim. Novas ideias devem contestar as mais antigas, ideias minhas devem ser colocadas à prova e debatidas. Ao ser tratado como guru, vejo muita gente acatar minhas recomendações sem contestação alguma, o que enfraquece a possibilidade de um bom debate. Por outro lado, há o lado do respeito conquistado por tudo o que fiz e estudei nos últimos vinte anos, o que é gratificante. Vejo muitos candidatos a especialista em finanças acreditando que basta usar o bom senso para orientar o público. Não vão adiante simplesmente por falta de conhecimento técnico. Quanto mais se multiplicam falsos especialistas, infelizmente mais se valoriza o rótulo de guru entre os poucos realmente estudados.
Você começou a correr atrás do seu primeiro milhão, porque estava insatisfeito com o seu trabalho. Fale um pouco de como era essa época.
Não era exatamente o trabalho que me deixava insatisfeito. Eu lecionava na melhor escola de negócios do país, era reconhecido e muito bem remunerado. Mas, estava incomodado com as consequências do trabalho. Trabalhava seis dias por semana, mais de quinze horas por dia, e aos domingos ainda preparava aulas ou corrigia provas. O ritmo intenso estava afetando tanto minha saúde quanto meus relacionamentos. Comecei a fazer as contas e me organizar para um dia poder viver dos rendimentos de meus investimentos e diminuir o ritmo de trabalho. Meu projeto teve sucesso em um prazo reduzido em função de uma feliz conjuntura para meus investimentos, e desde 2005 vivo de minha independência financeira, com liberdade para trabalhar quando e como eu quero. Trabalho bastante, às vezes mais de quinze horas em um dia, mas não abro mão de tirar férias junto com meus filhos, o que dá um período de quase três meses de descanso por ano. Para alguns, isso pode parecer luxo, mas para mim, é equilíbrio. Tanto que não passa pela minha cabeça a ideia de um dia parar de trabalhar.
Qual a diferença entre enriquecer e crescer patrimonialmente?
O crescimento patrimonial é uma das consequências do enriquecimento, e não o contrário. Enriquecer é ter liberdade de escolha, e isso pode ser feito mesmo no início da formação do patrimônio. Por exemplo, quem tem um custo de vida baixo e uma pequena reserva financeira provavelmente se sente muito mais rico do que aqueles que têm um patrimônio luxuoso, mas precisam matar um leão por dia para manter as contas no azul.
Te incomoda quando as pessoas dizem que os seus livros são te autoajuda?
Não, porque meus livros foram escritos no formato e na linguagem de autoajuda para atingirem um público maior. Quem lê finanças pessoais está em busca de solução para suas dúvidas e problemas, por isso se trata de autoajuda. O que me incomoda mesmo é ver meu livro mal acompanhado nas prateleiras das livrarias. A seção de autoajuda é povoada predominantemente por livros sem conteúdo, mal escritos e sem um cuidado editorial mínimo, o que cria uma imagem muito ruim para a autoajuda. Meus livros estão lá para contribuir para a elevação do nível da autoajuda.
Como você enxerga o tratamento da mídia quando o assunto é educação financeira?
É um tratamento insuficiente e pouco aprofundado. A educação financeira envolve múltiplas disciplinas, incluindo psicologia, sociologia, economia e administração, e o jornalismo carece de profissionais que dominem minimamente esses assuntos para que boas pautas sejam desenvolvidas. Já participei de diversos programas de televisão em que a preocupação dos produtores se limitava a replicar clichês, sem o devido cuidado para a boa orientação. Matérias de educação financeira devem ser produzidas por especialistas na área, mas mesmo esse tipo de especialista ainda é raro. Educar para o bom uso do dinheiro é um desafio complexo para o qual a mídia brasileira ainda não mostra estar preparada.
Em um trecho do seu Best-seller de 2004 ‘Casais Inteligentes Enriquecem Juntos’, você fala que muitas vezes, alugar um imóvel é melhor que comprar um. Isso ainda é válido para 2014, ou mudou alguma coisa de lá para cá?
Essa reflexão é mais válida do que nunca, principalmente para quem está iniciando a vida a dois. O aluguel de um imóvel ainda sai mais barato do que o aluguel do dinheiro para quitá-lo. Enquanto se aluga um imóvel facilmente por 0,5% de seu valor, dificilmente se financia a compra de um imóvel por menos de 0,8% ao mês. Sabemos que, no financiamento, as prestações incluem uma redução da dívida até sua quitação, mas, no Brasil, as pessoas adquirem sua casa própria muito precocemente, pouco depois do casamento. É um erro grave, pois, nesta fase, todos buscam transformações em suas vidas. Assumir um financiamento nos impõe uma fixação geográfica que limita as possibilidades de carreira, pois, ninguém quer trabalhar muito longe de casa. Além disso, há um engessamento perigoso no orçamento: as pesadas prestações do financiamento nos tiram flexibilidade e trazem um temor quanto ao não pagamento da dívida. O ideal é comprar a casa própria em um segundo momento, quando filhos já estão adaptados na escola, quando a estabilidade na rotina é mais importante do que o crescimento na carreira e, principalmente, quando já se acumulou um bom saldo no FGTS e um bom nível de renda para quitar o financiamento em um prazo mais curto e com menor dificuldade.
Cada vez mais, os jovens no Brasil querem entrar para o serviço público. Isso em um longo prazo não é um mau negócio para o país, já que pelo fato do medo, muitos não arriscam, por exemplo, no empreendedorismo?
A procura crescente pelo serviço público é a maior prova da falência do Estado. O Brasil está sendo incapaz de preparar seus jovens para serem competitivos em suas vocações, para disputar espaço no mercado de trabalho. Os jovens simplesmente não empreendem porque não sabem por onde começar. Muitos travam ao preencher formulários, diante de seu analfabetismo funcional ou conhecimento pouco acima disso. São raros os que buscam o serviço com a missão de servir o público. Hoje, quem presta concurso atesta que é incapaz de planejar sua carreira e sua renda futura, por isso vem buscar amparo no colo do Estado. Resultado: o serviço público é cada vez mais povoado por gente despreparada, sem vocação, que faz o mínimo necessário para bater o cartão, afinal não existe meritocracia no Estado. Em vez de um Estado mínimo e eficiente, temos um gigante letárgico e incapaz de pensar, que custa uma fortuna dos contribuintes para nada oferecer em troca. É triste.
Como de vez em quando fazer uma certa extravagância, mas usando sempre a educação financeira como sua aliada para não comprometer a sua renda?
As extravagâncias convivem muito bem com o planejamento financeiro. Entenda: educação financeira não é voltar aos primórdios da civilização e viver do básico. A boa educação financeira nos leva ao equilíbrio. Se eu quero viajar para Dubai ou presentear quem amo com um day spa ou um jantar em um restaurante sofisticado, simplesmente preciso saber quais gastos eliminar de meus planos para que meu sonho se concretize. É simples. Já fiz viagens que custaram mais do que o carro que eu tenho, e acho isso perfeitamente normal. Costumo dizer em minhas palestras que não há nada de errado com morar na casa dos pais aos 40 anos de idade e viajar duas vezes ao ano para a Europa, desde que seus pais estejam felizes e que você esteja poupando o suficiente para não perder, no futuro, esse estilo de vida exótico.
Existe algum investimento seguro para se obter a independência financeira, ou todo investimento tem o seu grau de risco?
Se não tem risco, não é investimento, mas sim poupança. Uma boa estratégia para a independência financeira combina investimentos em renda fixa com investimentos em renda variável. Todos deveriam investir uma parcela de suas reservas em renda variável, pois, é essa parcela que, comparada com a renda fixa, mostrará quando sua renda variável está em alta e quando está em baixa. A baixa é a oportunidade de compra, isto é, o momento de tirar um pouco mais da renda fixa e comprar aquilo que será vendido meses depois com algum lucro. É com movimentos desse tipo que se alcança a independência financeira mais rapidamente.
Status e independência financeira não combinam definitivamente?
Combinam sim. O raciocínio é similar ao que usei para explicar sobre as extravagâncias. O ideal é construir seu status ao longo da vida, de maneira crescente e sólida, na medida em que se aproxima de sua independência financeira. O erro cometido por muitos é querer demonstrar certo status antes de alcançar a independência financeira. Usam roupas de grife, possuem carros caros, ostentam demais ao mesmo tempo, em que destroem suas finanças e seu futuro. Isso não é status, mas sim esnobação ignorante. Por outro lado, quem assume um status um degrau abaixo do que acredita que seu dinheiro pode pagar, deixa uma margem para construir patrimônio e consolidar suas escolhas ao longo da vida.
Qual o principal conselho que daria para alguém que quer enriquecer ou se tornar financeiramente independente?
O primeiro conselho é que leia meus livros. Com o livro que lanço agora no meio do ano, “O Fim da Aposentadoria”, concluo um material completo para a organização financeira da família. Como eu não vendo outros serviços, procuro oferecer nos livros as orientações mais objetivas e práticas possíveis. Além disso, recomendo que todos conversem mais sobre dinheiro, planos e sonhos. Quanto mais se discute o assunto com pessoas próximas, mais desenvolvemos nosso autoconhecimento e também uma inteligência coletiva interessante, em que pessoas de confiança passam a ser aqueles a quem recorro para tirar dúvidas sobre contratos, oportunidades e investimentos. E, obviamente, recomendo também que tirem seus planos das ideias e os coloquem no papel ou na planilha. Quem sonha não concretiza nada, enquanto que quem planeja e executa inevitavelmente realiza muitos de seus sonhos.
Última atualização da matéria foi há 2 anos
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