Papel Prensa: uma história mal contada
A Papel Prensa SA, empresa argentina dedicada à produção de papel para impressão de jornais, teve sua fundação em 1972, e a fábrica foi inaugurada em 1978 na cidade de San Pedro, na província de Buenos Aires, Argentina.
A empresa é administrada por uma diretoria eleita através de uma assembleia de acionistas, sendo que o Grupo Clarín detém 49% das ações, enquanto o diário La Nación e o Estado argentino possuem o restante. Esse cenário coloca o Grupo Clarín, dono do maior jornal do país, em uma posição de destaque no controle da Papel Prensa, que é a única fabricante de papel-jornal na Argentina e abastece 75% do mercado interno do país.
A origem da Papel Prensa remonta a 1969, quando a ditadura militar liderada pelo general Juan Carlos Onganía criou o Fundo para o Desenvolvimento da Produção de Papel e Celulose. Essa iniciativa visava criar a primeira empresa nacional de papel-jornal, o que levou a um aumento de 10% nos preços das importações desse papel durante uma década, com o objetivo de financiar a participação do Estado na empresa produtora de papel para jornais.
Posteriormente, em 1972, o general Alejandro Agustín Lanusse concedeu o projeto da Papel Prensa a César Augusto Civita, César Doretti, Luis Alberto Rey e a empresa Editorial Abril S.A., que passaram a controlar a companhia. Um contrato entre o governo e a Papel Prensa previa que o Estado teria uma participação minoritária e se retiraria após dez anos, o que, no entanto, não ocorreu.
Logo, o governo peronista intermediou a venda da empresa ao banqueiro David Graiver, e a Papel Prensa ficou quase totalmente sob controle de Luis Alberto Rey e Graiver, através de um preposto chamado Rafael Ianover. Graiver, com ligações militares devido a seu trabalho como assessor do general Lanusse, assumiu o controle total da companhia ao comprar a parte de Rey, que vendeu sua parte à Galerías da Vinci S.A., uma sociedade de uma empresa do Grupo Graiver. Mais tarde, Graiver também teria vínculos com o grupo de extrema-esquerda nacionalista Montoneros, mas sua morte em um acidente de avião permaneceu envolta em mistério.
Com a morte de Graiver em 1976, seus bancos na Bélgica e nos Estados Unidos faliram, e suas ações na Papel Prensa foram vendidas aos jornais Clarín, La Nación e La Razón. A família Graiver e membros do Grupo Graiver foram ilegalmente presos e tiveram seus bens confiscados pelo governo militar sob acusações de envolvimento financeiro com os Montoneros.
Após a restauração da democracia na Argentina, a polêmica sobre a venda das ações e a morte de David Graiver tomou conta dos meios de comunicação e da opinião pública do país. Diversas investigações independentes foram conduzidas nas décadas de 80 e 90 para esclarecer o episódio.
Em março de 2010, o debate sobre o assunto se intensificou, com o governo acusando os grupos jornalísticos de terem se aproveitado da situação da família Graiver para adquirirem as ações da empresa a baixo custo e com apoio do governo militar. Em meio a esse contexto, Lidia Papaleo, viúva de David Graiver, relatou em carta publicada no diário Tiempo Argentino os horrores e ameaças de morte constantes que sua família sofreu, além de terem sido coagidos a vender as ações da Papel Prensa com o auxílio da Junta Militar.
Em setembro de 2010, o governo da presidente Cristina Kirchner apresentou uma denúncia formal contra os periódicos Clarín e La Nación, bem como seus proprietários, acusando-os de homicídio e cumplicidade em sequestro, tortura e crimes contra a humanidade durante a ditadura militar. Além disso, uma investigação judicial foi aberta para determinar se as filhas da proprietária do Clarín, Ernestina Herrera de Noble, eram filhas de desaparecidos políticos durante o período militar.
Os jornais se defenderam da denúncia, declarando-a uma “aberração moral e jurídica, carente de sustentação dos fatos”. As controvérsias em torno da história da Papel Prensa continuam, e sua verdadeira narrativa ainda permanece mal contada e sujeita a intensos debates na sociedade argentina.
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