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Um veneno chamado positividade tóxica

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A psicóloga, psicanalista e psicoterapeuta Beatriz Breves tem uma proposta clara: resgatar “o sentir” e demonstrar a importância deste processo para as pessoas. Parte de um trabalho de pesquisa que se estende por mais de 35 anos – e com um viés prático – a autora apresenta o conceito denominado Ciência do Sentir no livro “O Eu Sensível”. Valendo-se de uma linguagem poética, quase didática, a autora carioca classifica o sentir como uma constante universal humana, na qual os sentimentos representam o suporte do Eu. O pensamento, segundo ela, é uma expressão do sentir – e não somente da razão, na medida em que decodifica a vibração correspondente a cada sensação. A consciência do ser humano, por ser passível de capacidade simbólica, estaria vibrando prisioneira do sistema perceptivo em três dimensões, enquanto tudo o mais no psiquismo permaneceria vibrando, de forma inconsciente, em todas as demais dimensões existentes. (“O Eu Sensível”, p. 14). A partir deste paradigma vibracional, a psicóloga explica que “O Eu Sensível” é um complexo vibratório uno-inteiro-indivisível. Nele, a distinção entre psíquico, corpo e espírito não existe na realidade, sendo expressões das possibilidades de recortes da percepção humana. No segundo recorte do livro, Beatriz Breves propõe uma experiência de reflexão e de reconexão com os sentimentos. De forma prática, sugere que o leitor expresse diferentes sentimentos de A a Z.

Beatriz, a positividade tóxica está sendo um “veneno” para a nossa sociedade?

A positividade tóxica é consequência da incapacidade do ser humano para lidar com seus sentimentos, principalmente os sentimentos que provocam sofrimento; e essa incapacidade é que poderia ser compreendida como um grande veneno para a sociedade.

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O que nos leva a silenciar os nossos sentimentos negativos?

Importante deixar claro que não há sentimentos negativos ou positivos, mas sentimentos prazerosos e não prazerosos de se sentir. E, também, saber que um sentimento nunca está sozinho, mesmo havendo a predominância de um ou dois, a pessoa sempre sentirá simultaneamente um grupo de sentimentos. Assim, ser positivo ou não dependerá de como a pessoa irá gerenciar o grupo de sentimentos, melhor dizendo, de como a pessoa irá administrar o que sente. Por exemplo, se alguém nos impede propositalmente de realizar algo muito desejado, os sentimentos comuns de emergir são os de raiva e ódio. Sentindo raiva e ódio, a pessoa pode se direcionar para duas vertentes: agregar o que sente ao sentimento de vingança e seguir em uma rota destrutiva, portanto, negativa; ou agregar o que sente ao sentimento de garra e seguir em uma rota construtiva, portanto, positiva. O mesmo pode acontecer com o sentimento de amor que, se agregado aos sentimentos de posse e dominação, pode até matar, como já muitas vezes aconteceu, seguindo em uma rota destrutiva, portanto, negativa.

Nas redes sociais, a maioria das pessoas é mais feliz do que realmente é. Esse também é um combustível para esse silêncio dos nossos sentimentos negativos?

Como disse acima, não há sentimentos negativos, mas prazerosos e não prazerosos de se sentir. Nesse caso pode ser dito que se trata de um combustível na tentativa de evitar o sofrimento.

Fale um pouco mais sobre a Ciência do Sentir.

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A Ciência do Sentir é uma pesquisa que venho realizando de forma independente há 35 anos sobre o sentir e que incluiu várias áreas do saber, entre elas: Psicologia, Psicanálise, Física, Biologia e Artes. Assim, seguindo no campo da transdisciplinaridade, atualmente está agregando a Ciência da Complexidade. Para a Ciência do Sentir, se tudo o que existe vibra, nós também somos seres que vibramos e, portanto, o Sentir passa a ser compreendido como a experiência experienciada da vibração que somos e da que nos rodeia. Então, há duas vertentes na pesquisa: a teórica e a prática. A vertente teórica constrói uma teoria para o Sentir. A vertente prática convida as pessoas a se conectarem com os sentimentos, a falar de sentimentos, a aprender a nomear o que sente e, assim, buscar uma qualidade de vida melhor.

Como distinguir o sentir e a razão em nosso pensamento?

A razão é um mecanismo humano usado para processar e administrar o pensamento, sendo que, para a Ciência do Sentir, não somente a sensação e o sentimento, mas também o pensamento é compreendido como uma expressão do Sentir. A sensação se manifesta na vibração do sentir ao nível corporal externo; o sentimento se manifesta na vibração do sentir ao nível corporal interno; e o pensamento se manifesta na vibração do sentir que é processada e administrada pelo mecanismo da razão. Afinal, se sabemos o que pensamos é porque sentimos o pensamento enquanto pensamos.

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A razão pode enganar o sentir e vice-versa?

Falar em razão e sentir só faz sentido se for didaticamente, porque essa é uma simplificação que se compreendida, na prática, afasta, e muito, o ser humano de si mesmo. Todo ser humano deve ser compreendido como uno, inteiro e indivisível, pois, cada pessoa é única. Então, eu responderia que quem se engana é a pessoa inteira.

Ser extremamente racional atrapalha o sentir?

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O chamado extremamente racional seria aquela pessoa que tenta através da lógica evitar o sentimento que possa estar sentindo. Entretanto, é importante entender que essa é apenas uma forma de administrar o que sente que, infelizmente, é muito admirada socialmente, mas que demonstra um elevado sentimento de medo de si mesmo. Digo infelizmente, pois, essa maneira de se autogerenciar afasta a pessoa do que talvez seja a sua maior riqueza, aquilo que colore a sua vida — os sentimentos. Geralmente, se a pessoa é infeliz, a vida é sentida deveras pesada, se é feliz a vida é sentida com leveza.

Como se reconectar com os nossos sentimentos?

É só começar a prestar atenção no que sente. Por exemplo, se todas as noites a pessoa se perguntar o que sentiu durante o dia, gradualmente, irá começar a perceber diversos sentimentos que antes eram desapercebidos. Provavelmente, de início, irá se confundir com sentimentos que para muitos são considerados sinônimos, por exemplo, os sentimentos de dúvida e insegurança, de indiferença e desprezo, mas com o tempo irá começar, intuitivamente, aprender a reconhecer cada um.

Por quais caminhos passa essa reconexão?

Para a pessoa que não conhece os mais de seiscentos sentimentos passíveis de reconhecimento, eu diria que passa pelo reencontro consigo mesma, pela descoberta de uma riqueza interna que irá auxiliar, e muito, administrar com melhor qualidade a própria vida.

Essa reconexão foi abalada em algum sentido durante esse momento complexo vivido por todos nós?

Não diria que foi abalada, apenas que tenha demonstrado o quanto as pessoas já estavam perdidas em seus sentimentos. Aqueles que até então aprenderam a se conectar com os seus sentimentos lidaram muito melhor com a angústia, o medo, a impotência, a solidão, a frustração, entre diversos outros sentimentos difíceis de se sentir e que emergiram nesse momento. Já aqueles que não sabiam gerenciar os próprios sentimentos encontraram mais dificuldade.

O autoconhecimento pode ser uma chave para essa reconexão?

Responderia que seria justo o contrário, a reconexão é que seria a chave para o autoconhecimento. Digo isto porque é pela conexão com os sentimentos que se torna possível caminhar na estrada do autoconhecimento.

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Última atualização da matéria foi há 2 anos


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