Fraude no INSS e a oposição isqueiro
Na trama política brasileira, poucas peças têm sido tão encenadas com cinismo calculado quanto os recentes movimentos em torno da criação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar o INSS. A narrativa, que ganhou corpo no sábado (3), revela mais do que o simples zelo pelo bem público: expõe um jogo político onde a indignação parece combustível, e a verdade, apenas coadjuvante.

A operação da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União, que identificou um esquema de descontos não autorizados em aposentadorias e pensões — aplicados por sindicatos com histórico de conveniências pouco transparentes — revisitou um problema real. Milhares de aposentados foram vítimas de cobranças indevidas, um escândalo que, por si só, justificaria investigação rigorosa e responsabilização exemplar. Mas a urgência com que a oposição se mobilizou para montar a CPMI deixa entrever uma estratégia mais ensaiada do que espontânea.
“O que deveria ser uma cruzada suprapartidária em defesa dos mais vulneráveis acaba se tornando munição para a guerra de narrativas.”
A deputada Coronel Fernanda (PL-MT) correu às redes sociais para anunciar, com empolgação, que havia reunido as 171 assinaturas necessárias na Câmara dos Deputados. No Senado, Damares Alves (Republicanos-DF) afirmou ter coletado 28 assinaturas, ultrapassando o mínimo exigido. A cena parecia o clímax de um ato bem coreografado: a oposição reunida, inflamando a plateia com promessas de justiça e apuração implacável.
Mas há um detalhe importante. Para que a CPMI comece de fato a funcionar, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), precisa ler o requerimento em plenário. Sem esse gesto formal, o espetáculo permanece nos bastidores. É aqui que a peça entra em compasso de espera — uma pausa que permite à oposição incendiar o debate público enquanto aguarda o acendimento oficial da chama.
A política do isqueiro
Chamar a oposição de “isqueiro” talvez seja mais adequado do que se pensa. Seu papel tem sido o de provocar combustões políticas rápidas, de alto impacto emocional, mas muitas vezes efêmeras e desconectadas de resultados práticos. A instalação de comissões tem se tornado, para setores oposicionistas, uma espécie de ritual performático: o importante é acender a controvérsia, não necessariamente investigar até o fim.
Em parte, isso reflete o desespero da oposição em encontrar uma narrativa que a reaproxime do eleitorado. O Governo Lula, apesar de cercado por ruídos e críticas legítimas, tem mantido relativa estabilidade política e social. Sem escândalos explosivos capazes de desestruturá-lo por completo, seus adversários investem em temas de fácil indignação popular — como a fraude no INSS — para obter algum capital político.
Vale notar que esse tipo de fraude não é novidade. Há décadas, aposentados e pensionistas sofrem com descontos misteriosos em seus benefícios. Sindicatos fantasmas, associações obscuras e convênios esdrúxulos pululam no sistema previdenciário brasileiro. O que muda, agora, é a instrumentalização dessa prática como arma política. O que deveria ser uma cruzada suprapartidária em defesa dos mais vulneráveis acaba se tornando munição para a guerra de narrativas.

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), já sinalizou resistência ao avanço da CPMI, alegando que há uma fila de pedidos antigos esperando para serem analisados. É verdade: sete dos doze requerimentos pendentes datam de 2023, quando o atual Governo mal havia desfeito as malas. A tentativa da oposição de furar essa fila soa, portanto, mais como manobra do que como indignação genuína.
Ao mesmo tempo, o Planalto tenta não se deixar arrastar pela tempestade. Sabe que interferir diretamente pode soar como tentativa de blindagem, ainda que o caso dos descontos indevidos não envolva, até agora, qualquer figura de alto escalão do Governo Federal. Lula, em tom contido, evitou politizar o caso, mas sabe que as chamas acesas pela oposição podem se espalhar rápido demais se o controle não for firme.
Última atualização da matéria foi há 5 meses
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