EaD: rigor et initium novum
Com a assinatura do Decreto nº 12.456/2025, o Governo Federal dá um passo significativo para reestruturar a Educação a Distância (EaD) no Brasil. Em um país continental como o nosso, a modalidade sempre se apresentou como uma solução prática para ampliar o acesso ao ensino superior. Contudo, a expansão rápida e, em muitos casos, desordenada dos cursos EaD gerou questionamentos legítimos sobre sua qualidade. O novo decreto, portanto, representa uma tentativa de equilibrar o imperativo de inclusão com a exigência de rigor acadêmico.
Segundo o ministro da Educação, Camilo Santana, a nova política busca garantir que a experiência do estudante em cursos a distância seja tão rica quanto nos presenciais. No papel, a proposta é promissora: define novos parâmetros de oferta (presencial, semipresencial e EaD), exige avaliação presencial, cria o papel do mediador pedagógico e impõe novas exigências para os polos físicos de apoio. Mas, como ocorre frequentemente no campo das políticas públicas, a regulamentação é apenas o ponto de partida. O desafio real está na sua implementação.
Há um reconhecimento explícito por parte do Governo de que a EaD não pode mais ser tratada como um território de improvisação. A inclusão de atividades síncronas mediadas e a exigência de pelo menos uma prova presencial por unidade curricular já sinalizam um esforço para devolver densidade à formação oferecida em ambientes virtuais. A distinção entre atividades síncronas, assíncronas e mediadas revela um cuidado com a pedagogia e um desejo de conter o que tem sido uma das maiores críticas à modalidade: o abandono da mediação docente e o uso excessivo de materiais enlatados.
“Será preciso vigilância, cobrança social e, acima de tudo, compromisso político de longo prazo para que a promessa de qualidade se transforme em realidade.”
Além disso, a proibição da oferta de cursos EaD para áreas como medicina, enfermagem, odontologia, direito e psicologia é uma medida acertada, ainda que tardia. A centralidade das práticas presenciais nessas formações é indiscutível, e permitir que fossem realizadas exclusivamente a distância era uma forma de negligência pedagógica com potencial de gerar danos concretos à sociedade. A decisão de restringir os cursos de Saúde e licenciaturas a modelos presenciais ou semipresenciais também parece coerente visando manter a qualidade e a responsabilidade social das instituições.
No entanto, o maior mérito do novo marco regulatório talvez esteja em ter estabelecido uma diferenciação entre os formatos de ensino que até então vinham sendo diluídos na prática. A criação oficial do modelo “semipresencial” e a delimitação clara das porcentagens mínimas de carga horária presencial e mediada dão à regulação um grau de precisão inédito. Isso ajuda tanto os estudantes quanto os avaliadores a entenderem o que esperar de cada modalidade.
Do entusiasmo à responsabilidade: o novo marco como divisor de águas
Porém, é importante ir além da letra da lei. A definição de infraestrutura mínima nos polos, por exemplo, requer fiscalização ativa e capacidade técnica de verificação por parte do MEC. Como garantir que centenas de instituições espalhadas pelo território nacional estejam de fato cumprindo os requisitos estabelecidos? Será necessário investir fortemente na ampliação da capacidade de supervisão e avaliação do Estado. E essa é uma tarefa cara, demorada e, muitas vezes, politicamente sensível.

Outro ponto relevante é a valorização do corpo docente. A presença de um mediador pedagógico com formação compatível e função exclusiva é uma mudança bem-vinda, que pode corrigir o uso indiscriminado de tutores sem autonomia acadêmica ou preparo específico. Mas será preciso garantir que as instituições respeitem esse papel e não o reduzam, na prática, a uma função burocrática. Sem mecanismos de cobrança e responsabilização, a proposta corre o risco de ser esvaziada por dentro.
Ademais, o decreto não menciona com clareza a questão da remuneração dos docentes na EaD, que costuma ser inferior à dos colegas do ensino presencial. Se queremos que o ensino a distância seja de fato uma alternativa qualitativa, é preciso reconhecer o trabalho docente de maneira proporcional à sua importância. Isso significa salários justos, formação continuada e condições adequadas de trabalho, inclusive nas plataformas digitais.

Por fim, há que se reconhecer o esforço de diálogo por trás da política: visitas técnicas, consultas públicas, escuta de entidades representativas e até especialistas estrangeiros. Esse processo participativo não é garantia de acerto, mas aumenta certamente a legitimidade da proposta e pode ajudar a evitar erros graves. A decisão de conceder dois anos para transição também demonstra maturidade e respeito pelos estudantes já matriculados, que não podem ser penalizados por falhas do passado.
A Nova Política de EaD é, em essência, um recomeço. Um recomeço necessário. Mas será preciso vigilância, cobrança social e, acima de tudo, compromisso político de longo prazo para que a promessa de qualidade se transforme em realidade. Porque acesso à educação é essencial — mas acesso com qualidade é o que realmente transforma vidas.
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