Despertar criticidade para Danton Medrado é vital
O baiano Danton Medrado é poeta, professor e escritor. Está radicado em São Paulo desde o final da década de 1980. Participou ativamente do movimento anarco-sindicalista em São Paulo – COB-AIT, tendo acompanhado a cisão da União Geral dos Trabalhadores (UGT-SP) com o Centro de Cultura Social CCS. Entre seus livros estão Uma canção para Nóia (1995), Albergue Ilusória (2004), Ergástulo Eterno (2007), Amargo (2011) ISBN 978-8-5640550-1-8 e A Minha Loja Sou Eu. O autor é formado em Letras, pós-graduado em ciência da religião e psicopedagogia. Foi um dos fundadores do Centro de Estudos e Cultura Libertária de São Paulo (CECLI-SP), e do Centro Anarquista Ação Direta (CAAD) ao lado de outros remanescentes da Confederação Operária Brasileira – COB/AIT em São Paulo. Desde 2004 Danton Medrado tem se dedicado à educação. Seu principal tema de estudo em especial é a Pedagogia Libertária, denunciando a educação formal como sendo opressora e cruel, e convidando outros professores a buscarem novos modelos de atuação. Também foi membro da Casa do Poeta de São Paulo e da ARLS Unidos 3239, filiada ao GOSP-GOB. “A educação oficial só serve ao sistema, ela não beneficia o aluno. É preciso que subvertamos este papel. A escola precisa ser atrativa, e ela só alcançará isso quando quebrar as barreiras das imposições, do atavismo, do comodismo e do medo de confrontá-la”, afirma.
Danton, como a escrita e a poesia entraram em sua vida?
Comecei como leitor assíduo de literatura de cordel. Não tive acesso a outros livros, (que não os didáticos) antes dos 12 anos. A poesia era leitura corriqueira na época de escola, e um bom entretenimento. Eu julgo que o ato de escrever foi só um processo de imitação, de vontade de querer compartilhar histórias e registrar sentimentos.
Em sua visão, o que seria uma Educação Libertária?
Em síntese, é aquela que desperta a consciência crítica do indivíduo, que amplia sua vontade de aprender, a sua autonomia, e o reconhece como sujeito social. A Educação Libertária vê o aluno como seu elemento principal, e tem como função básica propiciar a construção racional do conhecimento, livre de modelos que compara, pune ou recompensa.
Num país que não trata a Educação como prioridade número um, o que fazer para que esse espírito libertário seja impregnado nos jovens e nas nossas crianças?
Precisamos repensar a educação, urgentemente. Ela tem sido tratada num plano estático, sob modelo jesuíta, arcaico, atrasado e com parâmetros extremamente autoritários. Paramos no tempo. Repare, o que mudou na escola da época do império até hoje, por aqui?
Atuamos sob modelos impostos, com base num puto qualquer que acredita que é impossível aprender sem que seja amordaçado. Veja só, o indivíduo passa a ser obrigado a ir à escola, daí já se subentende que não deve ser um lugar bom, caso contrário, ele iria de bom grado.
A educação oficial só serve ao sistema, ela não beneficia o aluno. É preciso que subvertamos este papel. A escola precisa ser atrativa, e ela só alcançará isso quando quebrar as barreiras das imposições, do atavismo, do comodismo e do medo de confrontá-la. Nunca conheci uma criança que não gostasse de aprender, de descobrir, mas posso dizer que de todas que conheci, a maioria não suporta fazer o que não quer.
Precisamos despertar a criticidade dos alunos, promover sua autonomia, reconstruir a escola como um espaço de aprendizagem e troca entre diferentes, incentivar a busca por conhecimentos se quisermos reconstruir uma sociedade.
Por que o poeta Manuel Bandeira foi fundamental na sua formação?
Bandeira foi um sujeito que cresceu esperando a morte, né? E toda aquela situação de incerteza que a vida lhe trazia, ele conseguia converter magistralmente em poesia. Sua tônica, seu arrastar de pés, o preparo do café, a solidão, parecia que ele havia nascido pra ser poeta, e eu adorava como ele transcrevia isso para a poesia. Eu pensava: – porra, que bacana isso!
Manuel Bandeira é o único poeta que leio e releio constantemente, até hoje, com um prazer indescritível.
Acredita que o Anarquismo, é a única saída para o estado em que se encontra o nosso país?
Não, longe disso! O Anarquismo não é uma fórmula pronta comprada na esquina da ideologia, que você simplesmente receita a um estado doente terminal, esperando curá-lo. O Anarquismo se constitui de propostas que demandam de problemas sociais que são característicos de determinados agrupamentos sociais, quer seja bairro, escola, hospital, cidade, etc. Não há soluções prontas, mesmo que existam problemas semelhantes.
O Brasil continuará estagnado enquanto esperar um milagre vindo das urnas, estas que apenas perpetuam as desigualdades, a corrupção, a ilusão de participação política. É preciso acordar para a realidade de que política vai muito além do voto, este que é um grande engodo.
O Anarquismo através de seus pensadores e ativistas tem contribuído sempre para a emancipação do ser humano, e melhor, não está preso a barreiras que separam países, povos e culturas.
Você enxerga a educação formal como sendo opressora e cruel. Fale mais a respeito.
Peguemos como exemplo uma criança, que é obrigada por lei, a ir para a escola ainda em tenra idade; num horário que ela não escolhe; aprender coisas que servirão mais ao sistema do que a ela; ter que desconsiderar tudo o que possa ter aprendido antes; e aceitar um molde que a iguale a às demais. Não importa o que ela seja, será: julgada, tratada, educada, punida, ouvida, moldada, avaliada, submetida, exatamente igual a seu coleguinha… Note que quanto menor a criança, mais tempo ela passa na escola, mais até do que no ensino superior, o intuito é o de simplesmente incutir valores permanentes.
A criança é sequestrada de sua vida, à força (da lei), e submetida às condições de conformidade, padronização e obediência ao sistema, acreditando os pais que isto é o melhor, porque assim aprenderam, ainda que lhes pareça ruim.
Salvo exceções, e os que se recusaram a ceder, a escola engana a todos.
Como vê o tratamento dado pela mídia, quando o assunto é a Educação?
Infelizmente sempre que a mídia emite uma opinião, esta é quase sempre favorável ao Estado e ao seu sistema de ensino. A mídia está aí para validar a estrutura que conhecemos. Basta analisarmos, por exemplo, a greve de professores do estado de São Paulo, em 2015; mesmo aqueles que por ventura defenderam os professores, criticaram o fato de estarem eles usufruindo do direito de parar, cruzar os braços. Ora, que outra ferramenta restou aos trabalhadores, senão a greve? Não se para uma máquina abastecendo-a e lubrificando-a diariamente, é preciso pará-la totalmente, ou ela, mesmo se arrastando, nos atropela.
Como professor da rede pública de ensino em São Paulo, já teve algum problema referente ao seu modo de ver o tratamento dado à educação nesse estado?
Não, quanto isso não. Geralmente, os profissionais da educação sabem que vivemos uma farsa, concordam e participam da crítica ao sistema de ensino, eles só não acreditam que podem mudar isso… E alguns nem querem.
Progressão continuada, é um avanço ou um atraso para você?
Veja, entre punir o aluno que não aprendeu determinados conteúdos, mas que pode e está apto a aprender, ou permitir que ele prossiga nos estudos, mesmo não sendo um experto em tudo, fico com a sua progressão. A questão está no modo como esta progressão é entendida e divulgada. As pessoas tendem a acreditar que os alunos saem da escola sem saber ler e escrever por causa da progressão, o que é um enorme engano. Na verdade, o aluno deixa de aprender porque o sistema não permite que ele aprenda, não lhe dá condições, nem a eles e, nem para os profissionais da educação.
Quando formadores de opinião e políticos falam sobre laicismo em suas tribunas, eles sabem realmente o que estão falando, ou na maioria das vezes estão “jogando pra torcida?”.
O laicismo neste país é mais uma farsa. Não está totalmente morto, mas corre sérios riscos. Não se assuste se acordar amanhã sob uma ditadura religiosa, (escancarada, e não camuflada, como vemos agora).
Basta dar uma olhada rápida na própria mídia para perceber a quantidade de projetos de lei, elaborados sob a ótica e moral religiosa que tramitam nas assembleias (em todas as instâncias), em detrimento as grandes necessidades da população. É ridículo isso, para não dizer, criminoso.
Alguns indivíduos têm a audácia de preconizarem uma suposta superioridade religiosa como regra de vida imposta a todos, e mergulhados na ignorância, incitam a violência e a intolerância através de discursos e pregações infames que desrespeitam outras crenças e outras culturas. Uma abominação! Enojam-me!
O seu livro “A Minha Loja Sou Eu”, é uma análise crítica apaixonada sobre o funcionamento de lojas Maçônicas. Existe alguma coisa nessa obra (e se puder dizer é claro), que desmistifica a visão que muitos têm da Maçonaria, dizendo até com certo preconceito e desconhecimento, ser algo demoníaco?
Olha, o mais interessante é que esse “livreto” foi escrito de forma desproposital, até com uma linguagem simplória, porque eram apenas anotações pessoais. Felizmente repercutiu bem. Ele não pretende desmistificar, até porque, só fanáticos religiosos e pessoas sem acesso à informação suficiente, enxergam a maçonaria como ela não é.
No livro não trato de nada relativo às formas de identificação ou ritualística maçônica, falo especificamente do modo como a ordem se estruturou de algumas décadas para cá, a perda de sua essência, principalmente no que tange o cotidiano de cada loja, e o comportamento do indivíduo, que cada vez mais perde sua identidade se deixando corromper pelo pedantismo e bajulação. Uma pena.
Última atualização da matéria foi há 3 anos
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