Marcas que se posicionam em risco?
Não é exagero dizer que as empresas caminham em uma corda bamba quando se trata de manifestar posicionamentos públicos. Em especial, os temas ligados a causas progressistas — como diversidade, inclusão racial e de gênero, equidade salarial, mudanças climáticas, direitos LGBTQIA+ e combate ao racismo estrutural — se tornaram parte do vocabulário de marketing nos últimos anos. No entanto, o entusiasmo que marcava essa movimentação no mundo corporativo parece ter arrefecido. E o que muitos viam como “avanço” hoje é, para outros, apenas “lacração” — um termo que, embora pejorativo, ajuda a explicar o atual desgaste do debate.
A discussão ganhou nova força em 2024 e se estende em 2025, com diversas empresas reavaliando (ou encerrando) seus setores dedicados à diversidade e inclusão. Algumas multinacionais de tecnologia e consumo encerraram ou reduziram suas equipes internas dedicadas ao tema, em parte por pressões econômicas e em parte por medo de represálias do público mais conservador — que vê essas iniciativas como tentativas forçadas de politização. A questão central é: vale a pena para uma marca se posicionar?
Durante a segunda metade da década de 2010 e os primeiros anos de 2020, as marcas pareciam convencidas de que o posicionamento era um valor inegociável. Propagandas que exaltavam a representatividade ganharam o horário nobre e embalagens coloridas em alusão ao mês do orgulho gay se multiplicavam nas prateleiras. Nas redes sociais, slogans como “a marca que acredita no futuro” ou “comprometida com a igualdade” eram alardeados como diferenciais de marca.
Essas ações não eram meramente idealistas. Estavam ancoradas em pesquisas de mercado que indicavam um novo perfil de consumidor — mais jovem, mais conectado, mais engajado politicamente e disposto a comprar de marcas que compartilhassem seus valores. As grandes agências de publicidade, por sua vez, passaram a premiar campanhas com viés ativista, e celebridades se tornaram porta-vozes de causas antes negligenciadas. Era o auge do chamado marketing identitário.
A era do marketing identitário: auge e declínio
Mas o vento virou. A partir de 2023, começaram a surgir sinais de que o “ativismo corporativo” não era unânime — e tampouco imune a críticas. Uma parcela significativa do público passou a enxergar esses movimentos como oportunistas, rasos e incoerentes com a prática real das empresas. Casos em que marcas pregavam inclusão, mas eram acusadas de práticas discriminatórias internamente, mancharam a imagem de várias delas.
Além disso, o clima político mais polarizado em diversos países (Brasil incluso) contribuiu para transformar gestos antes considerados simbólicos em declarações altamente divisivas. E, claro, os algoritmos das redes sociais trataram de amplificar essas divisões. Marcas passaram a ser “canceladas” por se omitirem — mas também por se posicionarem. Era uma armadilha sem saída.
O caso da Bud Light em 2023, ao realizar uma campanha com uma influenciadora trans e enfrentar boicotes massivos, virou estudo de caso. Mais recentemente, campanhas do setor de cosméticos com diversidade racial e de gênero foram ironizadas nas redes sociais e alvos de desinformação. O que era risco calculado, virou risco total. A consequência é visível: em 2024 e 2025, o recuo é perceptível. Menos campanhas com foco em diversidade, menos declarações sobre direitos civis e menos investimento em ações sociais ligadas a minorias. Não se trata, porém, apenas de conservadorismo: trata-se também de pragmatismo.

As empresas perceberam que o apelo simbólico tem prazo de validade. E que, se o discurso não estiver alinhado com a prática, o dano reputacional pode ser irreversível. Os consumidores estão mais cínicos e mais bem informados. Esperam posicionamentos, mas também auditam os gestos. O paradoxo é cruel: ficar em cima do muro é malvisto, mas descer para um dos lados exige coragem, consistência e, sim, preparo para lidar com críticas.
No fim das contas, posicionar-se pode ser uma vantagem — mas só quando for autêntico. A adesão a causas sociais deixou de ser diferencial competitivo para se tornar um campo minado. As marcas que desejam entrar nesse terreno precisam estar dispostas a encarar o risco, com convicção e coerência. Caso contrário, talvez seja melhor calar, mesmo que isso também custe caro.
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