Trump detonou o inócuo multipolarismo
Em um anúncio surpreendente feito na noite da segunda-feira, 23 de junho, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, declarou o encerramento formal da guerra de 12 dias entre Israel e Irã. Segundo ele, o cessar-fogo total será iniciado gradualmente nas próximas horas (no caso anteontem), com cada país encerrando suas “missões finais” antes de firmar a trégua definitiva. A notícia pegou parte do mundo de surpresa — não pelo resultado em si, mas pelo modo como tudo se desenrolou. Afinal, a mediação que selou a paz veio dos Estados Unidos, não da China, tampouco da Rússia ou de alguma organização internacional.
Essa reviravolta enfraquece profundamente a retórica do chamado “multipolarismo”, que nos últimos anos se firmou como uma alternativa ao domínio histórico dos EUA na geopolítica internacional. O episódio demonstra, com clareza e certo desconforto, que no momento decisivo — quando mísseis cruzavam os céus do Oriente Médio e a ameaça de uma guerra regional se tornava real —, os países que se apresentavam como os pilares de uma nova ordem multipolar simplesmente cruzaram os braços.
Nem Moscou, nem Pequim atuaram de forma relevante. A Rússia, atolada na Guerra da Ucrânia e com o prestígio internacional reduzido, não ofereceu uma via diplomática eficaz. A China, por sua vez, embora se coloque como potência negociadora, agiu com uma frieza calculada, limitando-se a comunicados protocolares, sem influência real nas decisões de Teerã.
“Mesmo que esse episódio seja reescrito futuramente sob outras narrativas, a mensagem enviada ao planeta em junho de 2025 é cristalina: a ordem multipolar ainda não chegou. Se é que um dia chegará.”
O que se viu, na prática, foi um alinhamento involuntário do Irã ao pragmatismo norte-americano. Segundo fontes da agência Reuters, foi a mediação do Catar — tradicional aliado dos EUA — que selou a rendição do Irã ao cessar-fogo. Não se trata de um detalhe: o Irã, ao aceitar essa via, admitiu que as garantias de Washington pesam mais do que os acenos simbólicos de Moscou e Pequim.
O ataque da Força Aérea americana a três instalações nucleares iranianas, no dia 21, alterou radicalmente a balança do conflito. Era uma mensagem clara: os Estados Unidos, sob Trump, continuam a ser a única potência disposta a usar força com eficiência cirúrgica e efeitos políticos de grande escala. O bombardeio, embora controverso, forçou o Irã a buscar uma saída.
A resposta iraniana — limitada a um ataque contra uma base norte-americana no Qatar, rapidamente ironizado por Trump — mostrou o isolamento estratégico de Teerã. O regime iraniano ficou sem suporte real, sem aliados de peso e, finalmente, sem fôlego. Não houve escudo chinês. Não houve guarda-chuva russo. A ideia de um “Sul Global” unido, soberano e geopoliticamente eficaz revelou-se um delírio retórico.
Mais que um cessar-fogo, Trump entregou um veredicto político. A narrativa de que o mundo caminha para uma ordem internacional descentralizada e compartilhada — o chamado multipolarismo — foi desmentida pela realidade crua dos fatos. Quando a paz precisava ser costurada com urgência, só um país tinha as agulhas, as linhas e a mão firme para costurá-la.
Multipolarismo ou multirrelevância?
A crítica aqui não é à ideia de multipolarismo em si, mas ao modo como ela tem sido construída por seus defensores. Em muitos fóruns internacionais, principalmente os vinculados ao BRICS e ao G77, a noção de uma ordem multipolar tem sido repetida como um mantra, porém, raramente colocada à prova. Agora, quando testada em um cenário real e gravíssimo — com potencial de desestabilizar toda a região do Oriente Médio —, esse modelo se mostrou vazio, impotente e ornamental.
Curiosamente, o presidente Trump, com seu estilo errático e populista, prestou um serviço irônico à ordem internacional: reafirmou, na prática, que os Estados Unidos ainda são insubstituíveis nos momentos decisivos. É possível criticar seu modo de agir, sua falta de diplomacia tradicional, sua comunicação caótica — mas impossível negar que foi ele quem impôs o fim do conflito.
Mesmo que esse episódio seja reescrito futuramente sob outras narrativas, a mensagem enviada ao planeta em junho de 2025 é cristalina: a ordem multipolar ainda não chegou. Se é que um dia chegará.

O Oriente Médio continua a ser o epicentro onde discursos internacionais são postos à prova. E desta vez, quem saiu com o poder de ditar os termos da paz foi, mais uma vez, a potência que muitos apressadamente declaravam em declínio.
Trump, goste-se ou não, demoliu a ilusão de um mundo novo mais cooperativo, mais descentralizado e mais equitativo. O multipolarismo, no momento em que mais se fez necessário, revelou-se um luxo ocioso.
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