COP 30: relevante para quem?
Quando o planeta ferve, as conferências esfriam. E a COP 30, realizada em Belém, parece um bom exemplo desse paradoxo. De um lado, líderes mundiais ensaiam discursos inflamados sobre “sustentabilidade” e “transição verde”. Do outro, o ar-condicionado das plenárias trabalha no talo enquanto a Amazônia, anfitriã do evento, tenta respirar entre queimadas, garimpos e promessas de reflorestamento que evaporam mais rápido que um rio voador. A Conferência das Partes — ou COP, para os íntimos — tornou-se um ritual global de autopromoção ambiental: cada país faz pose de bom moço enquanto negocia, nas entrelinhas, quantas toneladas de CO₂ ainda poderá despejar sem manchar o figurino de verde.
Mas o Brasil parece especialmente entusiasmado com o espetáculo. O governo fala em “liderança ambiental”, as prefeituras em “legado sustentável” e os influenciadores já reservam passagens para “a COP mais brasileira da história”. Tudo soa bonito, mas o abismo entre o discurso e a prática continua imenso. Um estudo recente mostra que sete em cada dez estudantes dizem já ter ouvido falar em mudanças climáticas — mas apenas um terço consegue explicar o que isso significa. A ironia é cruel: enquanto políticos debatem aquecimento global em salões climatizados, jovens suam em salas sem ventilador, sem entender direito o que está acontecendo com o próprio planeta.
“Há quem defenda que o simples fato de sediar uma COP já coloca o país no mapa das discussões globais. Pode ser. Mas há uma diferença entre estar no mapa e compreender o mapa. O Brasil, que vive entre o negacionismo de uns e a retórica performática de outros, ainda não entendeu que nenhuma meta climática sobrevive sem base social, sem consciência coletiva, sem escolas que preparem mentes para o desafio ambiental.”
O relatório expõe um dado ainda mais sintomático: 64% dos alunos acham que a escola os prepara pouco ou nada para lidar com as consequências das mudanças climáticas. Entre os professores, a percepção é ainda mais sombria — 69% acreditam que a educação brasileira simplesmente não ensina o suficiente sobre o tema. A deputada Socorro Neri, que tenta empurrar a pauta da educação climática no Congresso, diz o óbvio que ninguém quer ouvir: a crise ambiental não é uma questão periférica, mas central. E, no entanto, segue tratada como assunto “extra”, encaixado entre aulas de geografia e lições genéricas sobre reciclagem.

O show verde e a plateia desinformada
Se a ideia é sensibilizar a população, o roteiro falhou no básico. Apenas 27% dos estudantes do Norte e 4% do Nordeste sabem o que é a COP 30. Goiás, curiosamente, aparece como o estado mais informado, com 73,6% dos alunos conscientes do evento — mais até do que o Pará, sede da conferência. A desigualdade educacional também marca presença: nas escolas privadas, o conhecimento sobre o tema é quatro vezes maior do que nas públicas. O que se desenha, portanto, é um retrato fiel do país — em que a “transição ecológica” corre mais depressa nos powerpoints do que nas periferias.
A COP 30, ao que tudo indica, corre o risco de se tornar mais um evento de vitrine, em que o Brasil exibe sua biodiversidade para estrangeiros, mas continua tratando a Amazônia como quintal explorável e a educação ambiental como tarefa de ONG. As crianças do futuro, que deveriam ser protagonistas dessa agenda, ainda mal sabem o que significa o “aquecimento global”. É o tipo de ironia que faria rir, se não fosse trágica.
Há quem defenda que o simples fato de sediar uma COP já coloca o país no mapa das discussões globais. Pode ser. Mas há uma diferença entre estar no mapa e compreender o mapa. O Brasil, que vive entre o negacionismo de uns e a retórica performática de outros, ainda não entendeu que nenhuma meta climática sobrevive sem base social, sem consciência coletiva, sem escolas que preparem mentes para o desafio ambiental. Enquanto o debate continuar restrito a diplomatas e marqueteiros, o termômetro seguirá subindo, tanto literal quanto metaforicamente.

A COP 30 poderia ser uma oportunidade histórica para reconectar o Brasil à realidade climática que já bate à porta — e, em muitos lugares, já derruba as paredes. Mas, se continuar a ser tratada como desfile de egos verdes e cifras “carbono neutro”, servirá apenas para repetir o mantra confortável das últimas décadas: salvar o planeta é urgente, mas só depois da foto oficial. Até lá, o calor continuará ensinando o que a escola ainda não ensinou.
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