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O que o tarifaço ensinará ao Brasil?

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A partir desta sexta-feira, 1º de agosto, o Brasil mergulhará em uma nova fase do velho jogo geopolítico: as tarifas de 50% impostas por Donald Trump sobre produtos brasileiros entram em vigor com o estrondo de uma bomba protecionista. O tarifaço mira bens estratégicos como café, carne e suco de laranja — produtos que há décadas abastecem lares norte-americanos, de Manhattan ao Texas. E, como em toda guerra comercial, os inocentes pagarão a conta: produtores, exportadores e, claro, o consumidor comum dos dois países.

Luiz Inácio Lula da Silva, em seu terceiro mandato, decidiu vestir a faixa da diplomacia altiva, mas não subserviente. Em entrevista ao The New York Times, deixou claro que o Brasil não aceitará ser tratado como republiqueta. A narrativa é bonita, patriótica e necessária. Mas, diante de um Estados Unidos liderado por um Trump ainda mais beligerante e cercado de aliados radicais como Marco Rubio e Eduardo Bolsonaro, a bravura retórica pode bater na muralha da realidade: a de que o Brasil não é prioridade, tampouco ameaça, para Washington. Somos apenas mais uma ficha na roleta do populismo econômico trumpista.

“Lula reclama que ninguém na Casa Branca quis conversar. E tem razão. Mas o Itamaraty também parece surdo às mudanças do mundo. Há quanto tempo o Brasil não firma um grande acordo comercial fora do Mercosul? Cadê o plano B diante da hostilidade trumpista?”

A queixa de Lula é legítima. Após dez reuniões técnicas e uma carta diplomática enviada em maio, a resposta americana chegou não por meio do Departamento de Estado, mas pela Truth Social — rede social usada por Trump para fazer campanha, humilhar adversários e agora ditar política externa. O anúncio do tarifaço pelas redes mostra que os canais institucionais morreram afogados na vaidade digital. Uma superpotência agora age como adolescente ressentido. E o Brasil? O Brasil virou bode expiatório.

Enquanto o Planalto tenta manter o tom civilizado, Trump joga com o cálculo eleitoral. A retaliação econômica parece mais voltada a agradar o eleitorado rural dos EUA e dar um agrado ao seu amigo Jair Bolsonaro — do que resolver qualquer desequilíbrio comercial. O jornal The New York Times foi direto: talvez não haja líder que desafie Trump com mais firmeza hoje do que Lula. Pode até ser. Mas a pergunta verdadeira é: e o que ganhamos com isso?

A diplomacia do grito e o preço da reação

Há quem diga que o tarifaço é uma aula prática sobre soberania. Outros o veem como uma punição disfarçada a decisões internas do Brasil, especialmente no campo judicial. O caso das sanções contra ministros do STF, com Alexandre de Moraes no centro da mira, levanta a temperatura da crise. A Casa Branca, empurrada por republicanos extremistas, decidiu mirar não apenas no comércio, mas no próprio sistema institucional brasileiro. É uma intromissão inédita, grave — e reveladora da fragilidade da nossa inserção global.

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Trump transformou o Brasil em palco de suas vendetas políticas. Mas será que só ele é culpado? O Brasil tem batido no peito a carta da altivez, mas deixou de investir, há muito, na construção de alternativas comerciais sólidas. A dependência do mercado americano — assim como do chinês — é resultado de décadas de miopia estratégica. Quando o mundo vira as costas, ficamos sem cadeiras.

Lula reclama que ninguém na Casa Branca quis conversar. E tem razão. Mas o Itamaraty também parece surdo às mudanças do mundo. Há quanto tempo o Brasil não firma um grande acordo comercial fora do Mercosul? Cadê o plano B diante da hostilidade trumpista? A retórica da dignidade não pode substituir planejamento. O tarifaço é mais que um embate entre egos: é um sintoma do atraso brasileiro em redesenhar sua política externa.

O mais preocupante, porém, não é a tarifa em si. É o precedente que se abre. Ao misturar política judicial com sanções econômicas, os EUA esticam perigosamente a corda da soberania alheia. E nós, que sempre nos orgulhamos da neutralidade diplomática, estamos agora no centro de um tiroteio entre ideologias, ex-presidentes ressentidos e líderes populistas. Um tarifaço que vale mais como símbolo do que como instrumento econômico.

O Brasil mergulhará em uma nova fase do velho jogo geopolítico global (Foto: Wiki)
O Brasil mergulhará em uma nova fase do velho jogo geopolítico global (Foto: Wiki)

No fim das contas, talvez o maior aprendizado venha mesmo na dor. Quando o café encalhar, o boi ficar sem pasto diplomático e o suco azedar nas alfândegas, o Brasil terá que decidir se quer continuar sendo exportador de comodities sem voz, ou se quer investir em tecnologia, valor agregado e diversificação de mercados. A lição é amarga, mas necessária. O tarifaço não nos ensinará a odiar Trump — isso é fácil. Mas pode finalmente nos ensinar a crescer. Se quisermos.


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